A operação de agentes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que destruiu o Terreiro de Jarê Peji da Pedra Branca, em Lençóis, foi um episódio de racismo estrutural, define Leonel Monteiro. Ele, que é presidente da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro-Ameríndia (AFA), cobra mudanças na gestão do Parque Nacional da Chapada Diamantina, onde o episódio ocorreu. O ICMBio apura a conduta dos servidores internamente.
No último domingo (21), moradores da região de Curupati, no Parque Nacional, foram surpreendidos pela ação de agentes do ICMBio. Com o pretexto de que apuravam denúncias de extração de madeira ilegal e ocupação irregular, os servidores destruíram, ao menos, seis imóveis. Entre eles, o Terreiro de Jarê Peji da Pedra Branca. O ICMBio diz que o templo só foi parcialmente demolido porque não reconheceu indícios de que se tratava de um terreiro.
O telhado do imóvel veio abaixo pelo maquinário usado pelos agentes, assim como parte da estrutura de madeira. Uma foto mostra o que restou: parte da casa onde há figuras religiosas, uma cruz e terços. Diversos objetos foram destruídos. Caso de uma imagem de Iemanjá, que teve a cabeça arrancada durante a ação. Leonel Monteiro, presidente da AFA, critica o desconhecimento do ICMBio.
“Foi um ato de racismo estrutural e racismo religioso, em que uma comunidade tradicional de matriz afro-indígena não foi respeitada. Se fosse outros templos, do cristianismo, por exemplo, a ação não teria sido tão brutal como foi”, diz Leonel Monteiro. O presidente da associação cobra mudanças na gestão do Parque Nacional da Chapada Diamantina. “Queremos que ocorra troca da gestão do parque e que os responsáveis respondam por esse ato de racismo religioso. O terreiro também deve ser reconstruído”, completa.
A tradição do terreiro é o jarê, prática religiosa que nasceu na Chapada Diamantina e mistura elementos indígenas, católicos e do candomblé. Mestre Damaré, líder religioso e guardião do terreiro, não estava no local no momento da ação e está abalado com o ocorrido. “Passei três dias sem comer e ainda estou me tremendo de raiva. Dormir também não tenho conseguido. A destruição impediu a nossa religião”, desabafa.
A reportagem entrou em contato com Cézar Gonçalves, chefe do Parque Nacional da Chapada Diamantina, mas ele não concedeu entrevista. Em nota, o ICMBio, responsável pela gestão do equipamento, admitiu o erro dos servidores e disse que instaurou procedimento para apurar o caso.
“Assim que os objetos de caráter religioso foram identificados no imóvel, a operação foi imediatamente interrompida. Para análise dos fatos, foi iniciada uma apuração interna. O Instituto Chico Mendes reconhece o erro e lamenta os danos causados pela violação do lugar religioso”, pontua o ICMBio.
O órgão diz também que, durante a operação do final de semana, apreendeu três caminhões, armas de caça e determinou o fechamento de duas serrarias envolvidas com a extração ilegal de madeira. A Delegacia Territorial de Lençóis investiga o caso. As informações são do site Jornal Correio.