Um estudo divulgado nesta segunda-feira (17) pelo Instituto Data Favela, da Central Única das Favelas (Cufa), mostra que apenas dois em cada dez entrevistados envolvidos com o tráfico de drogas concluíram o ensino médio. Para mais da metade, a frequência escolar terminou antes dessa etapa. A baixa escolaridade está entre os dados mais marcantes da pesquisa Raio-X da Vida Real, que analisou respostas de 3.954 pessoas em favelas de 23 estados brasileiros.
As entrevistas foram realizadas pessoalmente, entre 15 de agosto e 20 de setembro de 2025, nos próprios locais onde os entrevistados atuam. O levantamento detalha o nível de escolaridade declarado: 22% têm ensino médio completo; 16%, ensino médio incompleto; 13%, ensino fundamental completo; 35%, ensino fundamental incompleto; e 7% não têm instrução.
Ao serem questionados sobre o que teriam feito de diferente na vida, 41% responderam que teriam estudado ou concluído seus estudos. Para Marcus Vinícius Athaye, copresidente do Data Favela e presidente da Cufa Global, o dado reforça o papel transformador da educação: “Elas reconhecem que o estudo teria sido o fator de mudança na sua vida”.
Athaye destacou ainda que políticas de empregabilidade devem ser acompanhadas de acesso à educação, sobretudo para os mais jovens, que já demonstram arrependimento por não terem estudado.
O curso superior mais desejado pelos entrevistados é Direito (18%), seguido por Administração (13%), Medicina/Enfermagem (11%), Engenharia/Arquitetura (11%) e Jornalismo/Publicidade (7%).
Segundo o levantamento, a falta de acesso à educação e a oportunidades qualificadas no mercado de trabalho contribui para que entre seis e sete de cada dez entrevistados não recebam mais que dois salários mínimos mensais.
Famílias e referências
O estudo também analisou os arranjos familiares: 35% foram criados em famílias tradicionais e 38% em famílias monoparentais — sendo 79% delas chefiadas por mães, conforme tendência já mostrada pelo Censo Demográfico 2022. Mães, filhos e avós aparecem como figuras mais importantes na vida dos entrevistados.
Sonhos e expectativas
O maior sonho de consumo citado foi ter uma casa (28%), seguido por comprar uma casa para a família (25%), desejo mais forte entre pessoas de 22 a 26 anos. A CEO do Data Favela, Cléo Santana, afirma que esse desejo reflete o mesmo sonho do brasileiro médio: “O sonho da casa própria também é o principal sonho das pessoas que estão em situação de crime”.
Saúde mental
A pesquisa revelou ainda elevados índices de problemas de saúde mental: insônia (39%), ansiedade (33%), depressão (19%), alcoolismo (13%) e crises de pânico (9%). Entre os que sofrem de ansiedade, 70% ganham até um salário mínimo. A incidência aumenta conforme o nível de escolaridade — 72% dos que iniciaram, mas não concluíram, o ensino superior sofrem com ansiedade.
A violência doméstica, o uso de álcool e drogas e a baixa remuneração foram apontados por 13% como fatores que os levaram ao crime. Para Bruna Hasclepildes, coordenadora do estudo, a vida no crime reflete desigualdades históricas que atingem pessoas negras e favelas do país: “São estruturas que ainda se mantêm”.
Quando perguntados se sentem orgulho do que fazem, 68% disseram que não. “Eles não sentem orgulho algum. Essas pessoas não entram para este contexto porque querem, mas por necessidade”, afirmou Bruna.
Percepção sobre o Brasil
Sobre os principais problemas do país, 42% apontaram a pobreza e as desigualdades como questão central. Em seguida vêm a corrupção (33%), a violência (11%), a falta de acesso à educação (7%) e à saúde (4%).
Jornal da Chapada

