Um estudo conduzido por pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande (Furg), concluiu que os líquidos utilizados em cigarros eletrônicos apresentam toxicidade antes mesmo de serem aquecidos, etapa necessária para a formação do aerossol inalado pelos usuários. A pesquisa analisou amostras disponíveis no mercado ilegal brasileiro e foi publicada na revista científica Toxicology.
De acordo com os autores, trata-se da primeira análise abrangente no Brasil sobre a toxicidade dos chamados “e-líquidos”. As amostras foram obtidas por meio de doações diretas de usuários e classificadas conforme informações de rótulo e origem declarada, incluindo Brasil, China, Europa, Paraguai e Estados Unidos. Os produtos analisados representam materiais comercializados no país por contrabando, produção ilegal ou entrada como consumo individual.
Apesar de a comercialização, importação e propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) serem proibidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde 2009, o consumo desses produtos atingiu o maior nível desde o início do monitoramento, em 2019, segundo dados do Ministério da Saúde.
Para avaliar a toxicidade, os pesquisadores expuseram leveduras (Saccharomyces cerevisiae) e células de ratos a diferentes concentrações dos líquidos, analisando crescimento, metabolismo, integridade celular e estresse oxidativo. Os resultados indicaram que a toxicidade aumenta conforme a concentração e a composição química específica do produto, em todos os grupos avaliados.
Os líquidos de vapes são compostos principalmente por glicerina vegetal e propilenoglicol, além de nicotina, aromatizantes, agentes de resfriamento e outros aditivos. O estudo identificou que a toxicidade é inerente aos solventes e se intensifica com a presença desses aditivos. A exposição resultou em redução da viabilidade celular e da atividade mitocondrial, independentemente do país de origem do produto ou de haver regulamentação no local de fabricação.
Entre as limitações do trabalho, os autores destacam o número reduzido de amostras — 15 no total — e o fato de não se tratar de um estudo clínico em humanos. Ainda assim, novos investimentos já estão sendo feitos para ampliar as pesquisas, incluindo análises sobre a presença de metais nos líquidos e o desenvolvimento de estudos com biomarcadores associados ao uso de cigarros eletrônicos.
Para a cardiologista Jaqueline Scholz, especialista em tratamento do tabagismo que não participou do estudo, os resultados reforçam que os dispositivos eletrônicos para fumar não são inofensivos, sejam legais ou ilegais. Segundo ela, a pesquisa contribui para desmistificar a ideia de redução de danos em relação ao cigarro tradicional.
Jornal da Chapada

