Uma ossada de 6,3 mil anos foi descoberta na Isla del Tesoro, na região boliviana de Llanos de Moxos, que faz parte da Floresta Amazônica. O achado sugere que a origem dos assentamentos no local pode ter cerca de 10 mil anos. “Até onde eu sei, esses são os restos mortais mais antigos documentados no sudoeste da Amazônia”, diz José Capriles, principal autor do estudo e professor assistente de antropologia na Pennsylvania State University, ao Smithsonian. A descoberta surpreendeu, já que é extremamente raro encontrar restos mortais do período anterior ao desenvolvimento da cerâmica na região.
Isso porque o solo ácido e o clima tropical dificultam a preservação de corpos humanos ou artefatos. Particularmente nesse caso, a abundância de carbonato de cálcio das diversas conchas e cascas presentes na região ajudou na preservação da ossada. A descoberta sugere que caçadores ocuparam a área muito antes do que os especialistas acreditavam: “Esses locais podem representar algumas das primeiras formas de trabalho na terra na região”, afirma Bronwen Whitney, geógrafo da Northumbria University, que não participou do novo estudo.
Llanos de Moxos
A Llanos de Moxos, uma savana tropical no norte da Bolívia, atrai arqueólogos porque as sociedades agrícolas da região eram bem desenvolvidas há 2,5 mil anos: os habitantes desenvolveram campos elevados, estradas e até canais hídricos. O geógrafo e co-autor do estudo, Umberto Lombardo, diz que ficou particularmente intrigado com as ilhas encontradas no meio da floresta: “Quando pesquisei pela primeira vez a Isla del Tesoro em 2007, fiquei completamente perdido. (…) Só depois da análise laboratorial comecei a perceber que essas ilhas não eram apenas antropogênicos, mas, na verdade, muito mais antigas do que qualquer outro vestígio arqueológico conhecido em toda a região”.
O local começou a ser pesquisado há cerca de uma década, mas as primeiras descobertas foram públicadas apenas em meados de 2013. Os especialistas já haviam encontrado outros túmulos, mas nenhum tão antigo quanto o da descoberta mais recente. A presença de sociedades na região também foi um achado inusitado, considerando suas condições climáticas. Por isso os cientistas acreditam que no período de chuvas, quando parte da floresta inundava, as pessoas acampavam nas ilhas da floresta, e sobreviviam com o consumo de caracóis, enguias, bagres e outras criaturas aquáticas.
Lombardo teoriza que, com o depósito de lixo orgânico e a ocupação da região, o nível do solo subiu e ele passou por um processo de terraplanagem: “Esses dois processos tornaram esse local coberto por florestas, fornecendo sombra e materiais de construção. Além disso, tornou-se elevado e permaneceu acima do nível da água durante a cheia sazonal. Basicamente, quanto mais o local estava ocupado, melhor se tornaria para ocupação adicional”, relata o geógrafo.
Agricultura
Umberto Lombardo também defende que o estudo prova o desenvolvimento da agricultura em diversas partes do mundo ao mesmo tempo, não só no Crescente Fértil, no Oriente Médio. Ainda de acordo com o especialista, por conta de evidências genéticas, muitos estudiosos consideram que o sudoeste da Amazônia foi um dos primeiros centros de domesticação de plantas na América do Sul. A região seria um núcleo para culturas como mandioca, batata-doce, arroz selvagem, pimenta e amendoim.
Para a equipe, alguns dos comportamentos observados nas ilhas florestais de Llanos de Moxos poderiam até ter criado as bases para a agricultura. Por exemplo, o aumento do consumo de alimentos de baixo retorno, como os caracóis, sugere que alguns recursos alimentares tenham começado a acabar. Os enterros também podem ser um sinal de aumento da territorialidade e diminuição da mobilidade, levando ao início das experimentações com a agricultura. Extraído da Revista Galileu com informações de Smithsonian.