Três mulheres com personalidades diferentes, mas que possuem algo em comum: a paixão pela natureza. As guias da Chapada Diamantina, Juliana Oliveira, 29 anos, Joana Alvarez, 26 anos, e Isabele Serafim, 34 anos, ressaltam, em comum, que a atuação com o turismo de aventura é uma relação de amor, cuidado e sensação de realização. As mulheres, em seus trabalhos, buscam ressaltar a capacidade e disposição das mulheres, inclusive, em trilhas extremas, que a região chapadeira oferece.
Conexão com a natureza
Juliana Oliveira, conhecida como ‘Juju Natureza’, trabalha há sete anos nas montanhas da Chapada. A motivação para ser condutora de turismo de aventura foi devido à falta de oportunidade no mercado de trabalho, no entanto, mesmo sendo um caminho, inicialmente, para driblar o desemprego, atualmente ela constata que “atuar no turismo de aventura é uma benção”. Em seu trabalho, ela consegue contribuir para que as pessoas se reconectem com a natureza.
“Me sinto tão feliz quando estou trabalhando nas montanhas, vejo no rosto das pessoas a felicidade de estarem em um lugar especial como esse, realizo sonhos, isso para mim é tão divino”, ressalta, orgulhosa do seu trabalho. “Ser mulher e atuar no turismo de aventura é machista para alguns e inspiração para outros, mas o importante que eu faço o meu trabalho bem feito, faço com alegria e amor e então dá tudo certo”, explica.
As guias, devido à rotina, acabam enfrentando dificuldades para conseguir conciliar o trabalho com o ambiente familiar. A guia Juliana precisou deixar o filho, de nove anos, com os avós, para conseguir trabalhar. “Trabalhando para dá um futuro decente para o filho”, diz. Juliana conta que a sua relação com a natureza “tem a ver com Deus”. “Na natureza eu conecto com Deus, ele fala comigo através das árvores, das montanhas, dos rios e cachoeiras. É uma forma de amor tão forte, que o meu coração e a mente se enchem de alegria”, comenta.
Missão como mulher
Para Isabele Serafim, conhecida como ‘Bel das Montanhas’, 32 anos, como mulher é “sempre uma missão mostrar igualdade na hora de atividades que exige força”. E é isso que ela perpassa há 10 anos trabalhando como brigadista e guia em toda a Chapada. Quando iniciou como brigadista, entendeu “a beleza e força da natureza”, o que motivou a ser guia. “Ser brigadista é um compromisso de vida. Eu nasci para defender a natureza”, afirma.
“Eu não consigo ficar uma semana sem fazer uma trilha ou um contato com a natureza. Vivo para ela. Sou naturalista em vários requisitos do dia a dia e acredito que tenho que ser justa e devolver todo amor que ela tem dado”. ‘Bel das Montanhas’ também explica que a conciliação de qualquer tipo de vínculo sentimental é difícil, pois as guias acabam não ficando em suas residências. “Companheiros sentem ciúmes, filhos sentem falta, a gente perde algumas datas especiais de amigos e família”, comenta, ressaltando que acaba trabalhando até mesmo “quando todos estão de férias”, explica.
Companhia em trilha
As trilhas feitas por Joana Alvarez, de 26 anos, são contempladas, na maioria das vezes, com uma companhia especial: a pequena Olívia, de 2 anos, que acompanha a mãe em quase todas as trilhas, ficando em uma mochila de trilha. Joana, que é ‘mãe solo’ e trabalha há três anos na área do turismo na Chapada Diamantina, às vezes precisa deixar a filha com algumas amigas, por ela estar crescendo e ficando pesada.
“Mas tem que ter todo um planejamento. Faço a travessia do Vale do Pati com ela e é bem divertido! Às vezes ela mesma pede pra sair da mochila e andar”, diz, acrescentando que por conta da criança, a condição atual não permite que ela faça qualquer trilha e a qualquer hora.
A guia veio do Rio de Janeiro. Ela trabalhou com ecologia florestal, durante a faculdade de Ciências Ambientais na cidade carioca. “Desde a primeira vez que vim na Chapada disse que viria morar aqui. E vim, assim que me formei. Logo que cheguei já comecei a trabalhar com turismo [hostel e posteriormente guia]”, pontua.
Sobre o machismo, ela diz que percebe “que assim como qualquer outra área de atuação, o machismo também está presente no turismo de aventura, principalmente por ser uma profissão que exige condicionamento físico e resistência”. “Quando a gente faz o que ama tudo dá certo, as coisas fluem levemente. Sempre amei fazer trilha e principalmente passar um perrengue no mato”, diz ela, aos risos.
“Então, naturalmente, me sinto muito realizada quando estou guiando. Se chover, se precisar atravessar rio, entrar em caverna, fica mais divertido ainda! E vejo que as pessoas sempre saem de outro jeito quando vivem uma experiência de ecoturismo, começam a pensar de outro jeito mesmo, mais ambientalista, e isso também é um papel importante do(a) guia: conscientizar”, destaca Joana.
Pandemia de covid-19
As guias sobrevivem da natureza e das guiadas, mas por conta de pandemia, os locais precisaram ser fechados por um bom tempo, para evitar a propagação do novo coronavírus. A guia ‘Juju Natureza’ comenta que o trabalho no momento de pandemia foi “horrível”, diz ela, que acrescenta que ficou durante um ano sem trabalhar e, consequentemente, sem acesso às montanhas e sem renda.
“Foi uns dos momentos mais difíceis, mas graça a Deus eu tenho a minha família, que mesmo que seja simples, nunca deixou faltar nem um prato de comida na mesa”, diz. E a situação, mesmo com a reabertura parcial, ainda não está das melhores.
“Mesmo aberto, o fluxo hoje não está tão forte. E vai levar um tempinho, claro, para tudo se ajeitar. As pessoas que já tiveram aqui voltaram muito após aberto e acredito que aos poucos vai chegando um turismo mais organizado”, diz ‘Bel das Montanhas’, ao comentar que quando iniciou a pandemia, precisou buscar outras formas para contribuir com a renda financeira. Ela criou uma marca de produtos biodegradáveis e medicinais.
A guia Joana comenta que a pandemia mostrou algo que para muitos podem ser “loucura”. “Parece loucura, mas é bem mais cansativo ficar um mês em casa com uma criança do que um mês fazendo trilha com ela”, diz a guia, aos risos. “Acho que o movimento do turismo ainda está fraco se comparado antes da pandemia, mas tá ficando interessante porque estão sendo mais procurados os roteiros mais isolados”, comenta Joana.
Jornal da Chapada