Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura organizaram nove encontros do MEC (Ministério da Educação) com prefeitos e secretários de Educação. Um dos eventos, realizados na pasta em fevereiro de 2021, contou com a participação do presidente Jair Bolsonaro (PL).
O protagonismo dos religiosos nessas iniciativas foi confirmado à CGU (Controladoria-Geral da União) pela então chefe da Assessoria Cerimonial do MEC, Vanessa Reis Souza.
O relatório do órgão foi incluído nas investigações da Polícia Federal sobre o balcão de negócios do MEC que resultou na prisão de Ribeiro, dos pastores e do ex-assessor Luciano Freitas Musses e Helder Bartolomeu, genro de Arilton.
O pagamento de propina vinculada à realização de um desses eventos, no interior de São Paulo, é uma das principais evidências materiais dos investigadores até agora.
As apurações da CGU mostram que os religiosos tinham controle sobre a agenda do MEC com participação de lideranças dos FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), origem dos recursos negociados.
A PF indica que o ministro “conferia prestígio da administração pública à atuação dos pastores”. A presença de Bolsonaro fortaleceu essa imagem, segundo relatos de dois prefeitos presentes no encontro, sob anonimato.
“Propagava-se, assim, a imagem de que os pastores eram pessoas influentes, prestigiadas junto aos dois principais órgãos de formulação, promoção e execução das políticas federais na área de educação (MEC/FNDE)”, diz relatório da CGU.
A investigação foi remetida para o STF (Supremo Tribunal Federal) após o Ministério Público Federal apontar indício de vazamento da operação e possível interferência ilícita por parte do presidente da República. Interceptação telefônica sugere que Bolsonaro falou da operação com Ribeiro.
Dos 9 eventos organizados pelos pastores, quatro foram dentro no MEC. O primeiro foi esse de 10 de fevereiro de 2021, quando Bolsonaro esteve na sede da pasta e posou ao lado dos pastores, do ex-ministro e do atual, Victor Godoy Veiga (então secretário-executivo), e do ex-assessor Odimar Barreto —braço direito de Ribeiro, que ignorou investigação e faltou a quatro depoimentos.
A interlocutores Arilton dissse que Bolsonaro esteve no MEC a partir de convite dos pastores, e não do MEC. O presidente teria aceitado depois que os religiosos prometerem reunir um número signficativo de prefeitos —cerca de 40 estiveram no local.
Questionado, o Palácio do Planalto não respondeu. Registros oficiais mostram que os pastores tiveram 45 entradas no Planalto e 127 no MEC e FNDE.
Os outros eventos no MEC organizado pelos pastores foram em 11 e 18 de março e em 15 de abril. Com relação aos dois últimos, não há menção aos pastores na agenda oficial do MEC, descrita como “evento público com prefeitos”.
A reportagem colheu relatos de que, no dia do encontro de 15 de abril, houve negociações com prefeitos e assessores, tanto no hotel Grand Bittar, usado como QG dos pastores em Brasília, quanto no restaurante Tia Zélia.
É nesta data que teria havido o pedido de propina em ouro relatado pelo prefeito Gilberto Braga, de Luis Domingues (MA). Ele confirmou o episódio em audiência no Senado.
Os outros cinco eventos protagonizados pela dupla ocorreram em cidades de onde saíram relatos da atuação dos pastores. Todos foram em 2021:
15/5: Centro Novo (MA)
2/7: Salinópolis (PA)
7/8: Coração de Maria (BA)
21/8: Nova Odessa (SP)
11/9: Jandira (SP)
As datas foram confirmadas pela chefe da Assessoria Cerimonial do MEC. Em Centro Novo, município de 22 mil habitantes, os religiosos investigados integraram oficialmente a mesa da solenidade e tiveram falas, como se fossem integrantes do governo.
Há relatos de distribuição de bíblias em Salinópolis, por exemplo. Foi de Nova Odessa que saiu a denúncia contra os pastores, em agosto de 2021, levada ao ministro —Ribeiro disse ter se afastado do grupo mas as agendas se mantiveram, inclusive com venda de um carro entre a família de Arilton e Ribeiro.
A partir das tratativas dessa reunião é que foram pagos R$ 67 mil para Luciano de Freitas Musse, Helder Bartolomeu e Wesley Costa de Jesus, genro de Gilmar.
Musse era gerente de projetos do MEC quando recebeu R$ 20 mil, depositados por um empresário local. Ele havia sido nomeado por Ribeiro depois que não deu certo a iniciativa de colocar Arilton Moura no MEC, como a Folha revelou em maio.
O mesmo relatório da CGU mostra que servidores do MEC teriam alertado Ribeiro sobre a atuação dos religiosos.
A chefe da assessoria de agenda do gabinete do ministro da Educação, Mychelle Braga, disse que “nenhuma pessoa ou outra autoridade esteve naquelas dependências com a frequência do pastor Arilton”.
O agora ministro, Victor Godoy Veiga, disse em depoimento que alertou Miton Ribeiro sobre o que chamou de atuação desnecessária dos religiosos no MEC. Não há informações de que qualquer prática tenha sido denunciada oficialmente pelos servidores próximos ao ministro.
Também há relatos de como operava Odimar Barreto, ex-assessor que tem grande proximidade com Ribeiro, inclusive com relações familiares.
Servidores confirmaram à CGU que o próprio Milton Ribeiro designou Odimar para atender os pastores e que ele se reunia com Arilton frequentemente na pasta. Ele ainda fora designado pelo ministro a trabalhar em dupla com Luciano de Freitas Musse.
Ele foi exonerado em edição extra do Diário Oficial da União em 18 de março, no mesmo dia em que as primeiras informações sobre a atuação de pastores vieram à tona em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo.
Ribeiro se afastou do cargo em 28 de março. A exoneração ocorreu uma semana após a Folha divulgar áudio em que ele afirma priorizar pedido de um dos pastores por indicação do presidente Bolsonaro. Com informações do Folhapress.