Uma lei proposta por um deputado democrata dos Estados Unidos pressiona as Forças Armadas do Brasil a não interferirem nas eleições presidenciais de outubro, vinculando a assistência ao país na área de defesa à neutralidade eleitoral de seus militares, como determina a Constituição.
Proposta pelo deputado federal Tom Malinowski, de Nova Jersey, na última terça-feira, a emenda 893 à lei que autoriza oOrçamento de Defesa americano para o ano de 2023 estipula que, após as eleições presidenciais brasileiras, o Departamento de Estado terá 30 dias para apresentar um relatório ao Congresso sobre as ações tomadas pelas Forças Armadas durante o pleito.
O projeto de lei — que foi noticiado primeiro pelo jornalista Brian Mier no site Brasilwire — prevê a descontinuação da ajuda de segurança caso se determine que as Forças Armadas tiveram “papel decisivo” nas eleições ou promoveram um “golpe de Estado”. O Congresso deverá avaliar se os militares brasileiros atuaram de forma antidemocrática, diz o projeto, a partir de cinco critérios:
– Se as Forças Armadas “interferiram, impediram ou obstruíram a votação, operações de contagem ou operações eleitorais por autoridades eleitorais independentes”;
– Se as Forças Armadas “manipularam, procuraram manipular ou cancelaram os resultados das eleições”;
– Se as Forças Armadas “envolveram-se em esforços coordenados de informação ou comunicação para minar a fé popular e a confiança em autoridades eleitorais independentes ou questionaram a validade dos resultados eleitorais”;
– Se as Forças Armadas “usaram mídias sociais ou outros sistemas de comunicação de massa, incluindo aplicativos de mensagens móveis, para tentar influenciar opiniões generalizadas sobre a validade dos resultados eleitorais ou com relação à conveniência de qualquer resultado específico”;
– Se as Forças Armadas “encorajaram, incitaram ou facilitaram atividades ou rebeliões em relação aos processos eleitorais, a apurações eleitorais ou a resultados eleitorais, antes e depois das eleições presidenciais”.
A proposta recebeu o apoio dos deputados democratas Albio Sires (Nova Jersey), Joaquín Castro (Texas), Susan Wild (Pensilvânia), Ilhan Omar (Minnessota) e Hank Johnson (Geórgia), que aparecem como coproponentes. Assim como o Orçamento de Defesa, a proposta precisa ser aprovada pelo Congresso até outubro, quando começa o ano fiscal.
O projeto deixa clara a preocupação de políticos progressistas americanos com ameaças à democracia brasileira, e a percepção internacional de que os militares do país podem agir contra as suas instituições democráticas.
O projeto de lei é mais enfático do que o comportamento do próprio governo de Joe Biden, que no entanto também já demonstrou inquietação com o respeito às normas democráticas no Brasil pelo presidente Jair Bolsonaro e seus aliados.
Segundo uma porta-voz da Casa Branca, no mês passado, durante a primeira reunião bilateral entre os dois presidentes, Biden disse que confia no sistema eleitoral brasileiro — o que, em linguagem diplomática, significa que ele não endossa as suspeitas do presidente brasileiro.
Já Bolsonaro respondeu que as eleições de outubro deste ano serão “limpas, confiáveis e auditáveis”, mas que “chegou pela democracia”, e “quando deixar o governo, também será de forma democrática”. O presidente brasileiro afirma que contratará uma empresa para auditar a votação, buscando desacreditar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o sistema de urnas eletrônicas.
Em agosto de 2021, o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, advertiu o presidente brasileiro Jair Bolsonaro contra interferir nas próximas eleições, manifestando preocupação com as denúncias desprovidas de fundamento de Bolsonaro contra o voto eletrônico.
Mais de seis mil militares ocupam cargos comissionados no governo federal, incluindo diversos ministros. Na última semana de junho, o general aposentado Braga Netto, que foi ministro da Defesa de Bolsonaro e é pré-candidato a vice-presidente na mesma chapa, afirmou a empresários que “não tem eleição” caso não haja “auditoria” dos votos.
Brasil e EUA desenvolvem cooperação militar em áreas como treinamentos e exercícios conjuntos. Em 2012, os países assinaram um Acordo de Cooperação em Defesa (DCA), um amplo tratado que define as regras de cooperação, e um Acordo de Informações de Segurança Geral das Forças Armadas. Desde 1978 os países não tinham acordo na área, após cancelamento de um tratado de 1952 pelo então presidente Ernesto Geisel.
Em 2019, quando o presidente americano era Donald Trump, os EUA designaram o Brasil como um Aliado Importante Extra-Otan, condição que permite a aquisição de material bélico de segunda mão por valores melhores. O Brasil ainda não obteve benefícios concretos aproveitando-se desta condição. As informações são do jornal O Globo.