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#Polêmica: Deputado do PT entra com ação no MPF para apurar deslocamento de PMs a templos da Universal

A ação encaminhada ao MPF destaca o fato de que tal situação atenta contra a liberdade religiosa e o Estado laico | FOTO: Reprodução |

O deputado estadual Paulo Reis (PT-SP) entrou com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) para que o órgão apure a denúncia feita pela reportagem do site Intercept, que revelou que policiais militares de várias localidades do Brasil se deslocam para templos da Igreja Universal durante o horário de serviço para serem doutrinados.

Em sua ação, o deputado Paulo Reis destaca o fato de que, quando instadas, as Secretarias Estaduais de Segurança Pública e as Polícias Militares apresentaram versões contrapostas. Enquanto algumas aludiram à presença dos policiais nos eventos promovidos pela Igreja Universal como “visitas normais” e outras como “esporádicas”, “momentos de reflexão”, entre outras.

Também é levantado o fato de que o próprio Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, Guilherme Derrite, em solenidade ocorrida no 12º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano, agradeceu “a assistência prestada pela Universal através do programa UFP”, assim como as doações de “literatura (livros) e bíblias com o comentário do Bispo Macedo às autoridades”.

Na peça jurídica, o deputado Paulo Reis afirma que “não é possível que a Polícia Militar, ostensiva que é, seja deslocada em massa para a realização de eventos religiosos, utilizando fardamento e viaturas oficiais, enquanto tantos outros lugares precisam de maior patrulhamento, como, por exemplo, as vias públicas”.

“Diante dos fatos públicos e notórios noticiados pela imprensa, é preciso que o Ministério Público Federal tome providências a fim de investigar o deslocamento e comparecimento de tantos agentes de segurança pública em eventos religiosos promovidos pela Igreja Universal do Reino de Deus em diversos Estados da Federação, sob pena de permitir-se uma verdadeira cooptação da segurança pública, bem como de violações à legislação federal estadual”, solicita a ação assinada pelo deputado Paulo Reis.

Além disso, a ação encaminhada ao MPF destaca o fato de que tal situação atenta contra a liberdade religiosa e o Estado laico. “A tentativa de introduzir a cultura de determinada igreja não se coaduna com o Estado Democrático de Direito, uma vez que a ‘liberdade religiosa só pode existir verdadeiramente num ambiente pluralista’ com várias visões do mundo e da vida”.

Igreja Universal e Forças Policiais
Desde 2018 a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) mantém o programa Universal nas Forças Policiais (UFP), que com o viés de promover “assistência espiritual” tem promovido uma gritante aproximação institucional e política, com traços de doutrinação e proselitismo religioso, entre a instituição religiosa e diversas forças de segurança presentes em 24 estados da União.

Sem uma adesão oficializada, a Iurd se propõe a fornecer o espaço dos seus templos para eventos oficiais das polícias, além de atividades ditas de “reflexão” e apoio emocional e ‘espiritual’ aos policiais. Figurões da igreja também mantêm conversas com comandantes das corporações e marcam presença em solenidades.

Um desses encontros da UFP ocorreu nos dias 14 e 15 de março deste ano em templo da Igreja Universal localizado na rua Guaicurus, famosa via do bairro da Lapa, na zona oeste de São Paulo. Na ocasião, o estacionamento do templo estava repleto de viaturas da PM paulista e, dentro do prédio, havia mais de mil policiais militares fardados. Por conta do programa, a Iurd cedeu naqueles dias o espaço do templo para a realização de uma regista geral de efetivo.

O evento incluiu não apenas eventuais instruções corporativas aos policiais, como de praxe, mas café da manhã e um, assim chamado, “momento de reflexão” promovido pela igreja. A Universal garante que não faz doutrinação e proselitismo religioso e que a ideia do UFP é focar no “bem-estar emocional” dos PMs.

De acordo com o The Intercept Brasil, que fez um levantamento baseado nas redes sociais do UFP, foram mais de 70 encontros relacionados ao programa só neste ano, que promoveram cafés da manhã, orações e bençãos a bombeiros, PMs, agentes da Polícia Federal e militares do Exército e da Aeronáutica. Além da pregação disfarçada de “assistência emocional e espiritual”, também foi registrada a presença da Iurd – que hoje tem um importante partido político, o Republicanos – em eventos importantes como uma troca de comando da PM de São Paulo.

Diversas secretarias de segurança pública, de estados onde o UFP registrou atividades, foram questionados pelo site. No Mato Grosso, por exemplo, a atuação da Iurd junto às forças de segurança está no patamar de “visitas informais” para a realização de orações, “bem-vindas” pela tropa. Foi neste estado que no Dia Internacional da Mulher, a UFP entregou bíblias às tropas que, em seguida, assistiram a um “momento de reflexão” do pastor Adriano Damelio.

Na mesma data, no Mato Grosso do Sul, o recém nomeado comandante-geral da PM, coronel Renato dos Anjos, recebeu a visita do bispo Carlos Cucato com o objetivo de “fortalecer a assistência espiritual”. Já no Rio Grande do Norte, a PM negou quaisquer eventos com o programada da Igreja Universal, ainda que haja registros dos mesmos.

Em Roraima alguns batalhões chegaram a receber mais de 25 visitas da Iurd. Só o Batalhão de Operações Especiais, o Bope local, recebeu por algumas vezes o programa em ocasiões em que todo o seu efetivo, de 160 homens, participou das atividades. Por sua vez, a PM de Goiás defendeu a realização do programa quando questionada.

“A UFP contempla milhares de bispos, pastores, obreiros e voluntários para assistência social, espiritual e valorativa dos policiais. Em toda atividade dizemos para as pessoas que elas não são obrigadas a participar”, explica o pastor Roni Negreiros, coordenador da UFP, em vídeo enviado pela PM-GO ao The Intercept. Aparentemente não há um acordo formal para adesão ao programa, e as forças de segurança então se associariam ao UFP de forma voluntária.

São Paulo explica
No evento de março em São Paulo, as fotos publicadas pelo próprio UFP mostram o templo cheio de PMs fardados do Comando de Policiamento de Área Metropolitana 5. Eles foram ao templo para acompanhar um “momento de reflexão” protagonizado pelo bispo Júlio de Freitas, que é genro de Edir Macedo, o dono da corporação religiosa. O encontro ocorreu durante o horário de trabalho dos policiais, que utilizaram viaturas – que deveriam estar fazendo rondas – para chegarem ao local.

Nas redes sociais, a Iurd ainda afirmou que o coronel Forner, um dos comandantes dos homens presentes ao templo, agradeceu aos religiosos “pela assistência prestada à sua tropa através do programa UFP”. Nos mesmos posts é possível ver o batalhão inteiro sentado no templo e assistindo à pregação do trecho bíblico Lucas 8:18, que versa sobre como quem acredita em Jesus Cristo pode receber suas bençãos. Também foram publicadas fotos do comandante Forner com líderes da Iurd.

O Intercept questionou a corporação sobre a quantidade de homens que foram escalados ao evento, bem como as horas em que se dedicaram ao encontro e o número das viaturas utilizadas. Como resposta, a PM-SP afirmou que o evento não teve relação com o UFP ou “qualquer outro programa de cunho religioso”. De acordo com a resposta, a Igreja Universal teria, simplesmente, cedido o templo para a revista geral. Mas o que, então, a Iurd ganharia em troca?

A resposta talvez não seja financeira ou institucional, mas política. Como dito, o Partido Republicano, do atual governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, é oficialmente um braço político da Iurd. Não é incomum ver bispos e pastores da igreja lançando-se como candidatos sob sua legenda, e a aproximação da bancada da bíblia com a chamada bancada da bala, protagonizada por políticos oriundos das forças de segurança, é notória nos últimos anos nos parlamentos brasileiros. Não por acaso, neste ano a maioria dos eventos divulgados pela UFP nas suas páginas oficiais ocorreu em São Paulo.

Apenas 20 dias após a posse de Tarcísio, o UFP recebeu o certificado de “Amigo da Polícia Militar de São Paulo”. Depois disso a Iurd participou de reuniões e eventos da alta cúpula da PM-SP, entre elas a troca de comando da corporação. Em fevereiro o UFP estava presente no encontro de comandantes da região metropolitana de São Paulo. Em março, no Dia Internacional da Mulher, o programa foi ao Complexo do Comando Geral da PM-SP onde ofereceu palestra com o título “Esposa exemplar – o valor da mulher com base no contexto bíblico de Provérbios 31:10”.

Foram registrados eventos também no litoral e ABC Paulista. Em abril, o programa recebeu uma nova medalha da PM paulista, do Choque. A articulação política entre dois dos setores mais afeitos à extrema direita – certas denominações evangélicas e policiais militares – segue à todo vapor enquanto as autoridades fingem que não veem. As informações são da Revista Fórum.

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