A Polícia Federal apreendeu no dia (8) os passaportes do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros nomes ligados a ele. A medida cautelar é referente à operação que investiga o grupo que tentou dar um golpe de Estado após as eleições.
O que aconteceu
A PF cumpriu uma medida cautelar determinando que Bolsonaro e outras 19 pessoas ligadas a ele entregassem seus passaportes. O objetivo, segundo o Ministro Alexandre de Moraes, é conter uma possível fuga.
“Frustrada a consumação do golpe de Estado […], identificou-se que diversos investigados passaram a sair do país, sob as mais variadas justificativas (férias ou descanso), como no caso do ex-presidente.” – Ministro Alexandre de Moraes.
O passaporte de Bolsonaro foi apreendido em Brasília. A informação foi confirmada por Paulo Bueno, advogado do ex-presidente. O documento estava na sede do PL.
Advogados de Bolsonaro classificaram a apreensão como “absolutamente desnecessária”, em nota divulgada ontem.
Bolsonaro teve seu passaporte apreendido por ter “conexões internacionais”. De acordo com Pierpaollo Cruz Bottini, advogado e professor de Direito Penal da USP, a apreensão é por precaução.
“Estamos diante de uma pessoa investigada que tem conexões internacionais, tanto que ele costuma ir para o exterior. Não é necessariamente por um risco de fuga, mas para garantir que ele esteja no país no decorrer das investigações.” – Pierpaollo Cruz Bottini, professor de Direito Penal da USP.
Em que situação o passaporte costuma ser apreendido?
Pessoas com alta renda e laços no exterior costumam ter seu passaporte apreendido em operações. Ao UOL, Kakay Almeida Castro, advogado criminalista com mais de 30 anos de atuação, disse que outros fatores podem ter sido considerados para a apreensão do documento de Bolsonaro.
“É absolutamente comum que seja feita a apreensão de passaportes em investigações de pessoas com alto poder aquisitivo, dependendo do estágio da apuração. No caso concreto, além disso, o ex-presidente durante muito tempo alimentou na imprensa uma história de que ele poderia pedir cidadania italiana, asilo político. Nunca ouvi isso dele, mas é uma matéria que saía na imprensa. Isso também justificaria a proibição de sair no país.” – Kakay Almeida Castro, advogado criminalista.
Apreensão é comum em ações da PF? Os especialistas ouvidos pela reportagem consideram que sim. Isso pode acontecer quando há a possibilidade de o alvo fugir do país ou contar com grande influência no exterior.
“Quando se trata de um crime de grande envergadura, é normal que se peça uma medida cautelar como essa. Pelo fato de ele ter ficado muito tempo nos EUA, aparentemente, havia um indício de evasão do Brasil. E aí, como uma medida menos gravosa do que o pedido de prisão, eles pedem as cautelares. Ele está sendo acusado de crime contra o Estado Democrático do Direito, então, para um crime dessa natureza e desse tamanho, é normal apreender o passaporte.” – Paulo Victor Lima Carlos, especialista em Direito Penal e Corregedor Geral da Seccional da OAB/RJ.
“No estágio da investigação, é possível que se faça essa apreensão. É uma medida correta, não chama atenção por exagero de maneira alguma.” – Kakay Almeida Castro, advogado criminalista.
Quem virou alvo da medida cautelar
Além do ex-presidente, outras 19 pessoas ligadas a ele devem ter seus documentos apreendidos. Nomes como Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil, e Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, aparecem na lista. Até o momento, ninguém se manifestou sobre a medida.
O ex-ministro da Justiça Anderson Torres viajou ao exterior na véspera do ataque de 8 de janeiro. À época como secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Torres foi com a família no dia 6 de janeiro para Orlando, nos EUA, sem aviso prévio e sem estar de férias. Após a repercussão, o então interventor federal, Rodrigo Capelli, comentou: “Não me parece coincidência”
Um dos presos na operação de hoje já burlou sistema migratório. Em 2022, Felipe Martins, ex-assessor internacional de Bolsonaro, embarcou em um avião presidencial para os Estados Unidos “sem realizar o procedimento de saída com o passaporte em território nacional”, segundo a PF.
“A burla ao sistema migratório caracteriza elemento essencial para auferir o dolo do investigado em se furtar a aplicação da lei penal.” – Polícia Federal.
Operação atinge núcleo duro de Bolsonaro
A operação Tempus Veritatis mira suposta organização criminosa que tentou dar um golpe de Estado para manter Bolsonaro na Presidência.
O próprio Bolsonaro, de acordo com a PF, pediu e aprovou alterações na minuta do golpe.
Segundo a PF, o grupo se dividiu em núcleos para disseminar informações falsas sobre fraude nas eleições de 2022. A ação aconteceu antes mesmo do pleito para “viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital”.
O primeiro eixo trabalhou para construir e propagar a versão de fraude nas eleições. O grupo espalhou mentiras sobre vulnerabilidades do sistema eletrônico de votação. Segundo a PF, o discurso é repetido pelos investigados desde 2019 e continuou após a vitória do presidente Lula (PT).
O segundo eixo consistiu na prática de atos para subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito por meio de um golpe de Estado. Segundo a PF, o grupo tinha apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível.
UOL revelou que Bolsonaro recebeu minuta, segundo Cid
Em setembro de 2023, UOL revelou que Mauro Cid contou, em sua delação premiada, que Bolsonaro recebeu uma minuta de golpe preparada pelo então assessor internacional Filipe Martins, logo após perder as eleições para Lula.
Segundo a reportagem do colunista Aguirre Talento, na ocasião Cid também revelou aos investigadores que Bolsonaro consultou os comandantes das Forças Armadas sobre plano de golpe de Estado. A trama teve apoio do comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, e encontrou resistência dos comandantes da Aeronáutica e do Exército. As informações são do site UOL.