A expressão popular que diz que “quem canta os males espanta” ganhou ainda mais importância para o universo acadêmico. Uma pesquisa recente publicada no Personality and Social Psychology Bulletin investigou o impacto da música para a saúde mental dos indivíduos, especificamente no que tange à experiência imersiva dos shows ao vivo.
Com os dados de estudos anteriores sobre o papel da música para redução do estresse e ansiedade, os pesquisadores se aprofundaram ainda mais no tema e verificaram os efeitos positivos de estar rodeado de pessoas na mesma frequência e energia contagiante dos concertos musicais ao vivo.
Entenda
• Para desvendar o papel da coletividade para o bem-estar, os pesquisadores conduziram quatro estudos envolvendo 789 participantes, incluindo estudantes universitários e membros do público em geral.
• Os resultados demonstraram que a experiência musical vivida em grupo é o aspecto que torna o momento ainda mais transformador para a saúde mental, superando até mesmo outros estados emocionais — inclusive a imersão profunda nos ritmos e letras das músicas.
• Para além da influência positiva durante o concerto, os pesquisadores realizaram um acompanhamento semanas após os eventos de música ao vivo e descobriram que os participantes que experimentaram níveis mais altos de efervescência coletiva relataram maior felicidade e um maior senso de significado da vida.
• Embora a pesquisa tenha se concentrado em concertos, os autores também refletem que a influência do coletivo pode ser positiva em outras experiências, como festivais, reuniões religiosas ou mesmo protestos.
Psicólogos comentam o impacto do show ao vivo para a saúde mental
Para entender como esses dados podem ser percebidos na prática, a coluna conversou com a psicóloga e psicanalista Sílvia Oliveira e o psicólogo clínico comportamental Jayme Pinheiro Rabelo, que analisaram o impacto da música ao vivo sob a perspectiva psicológica e emocional.
Para os profissionais, a pesquisa vai ao encontro de análises percebidas, inclusive, no consultório. Segundo Sílvia Oliveira, o que torna os shows ao vivo uma potente ferramenta para a manutenção da saúde mental tem a ver com a liberação de hormônios ligados ao prazer e a conexão – a dopamina e a ocitocina.
“Quando as pessoas se sentem parte de um grupo, isso ativa áreas do cérebro relacionadas à conexão social, essenciais para o equilíbrio emocional. A sensação de pertencimento e de compartilhar algo significativo pode promover um alívio no estresse e fortalecer as relações interpessoais, resultando em um efeito positivo no bem-estar”, comenta Sílvia Oliveira.
A profissional também pontua que, mesmo após o evento, os efeitos podem perdurar.
“Participar de eventos musicais oferece uma distração saudável e um escape emocional, o que pode diminuir os níveis de cortisol, o hormônio do estresse. Embora os efeitos positivos sejam inicialmente percebidos durante ou logo após a experiência, estudos sugerem que, quando o momento é vivido de maneira autêntica, os benefícios podem perdurar, mesmo que de maneira sutil, ao longo do tempo”, detalha.
Música como uma aliada para a felicidade e o bem-estar
Por mais que a pesquisa reflita sobre a vivência em comunhão com um grupo, Sílvia reflete que não é necessário estar em uma multidão para sentir os efeitos da música. “Ouvir música em casa, em um ambiente controlado, pode proporcionar calma, aliviar tensões e melhorar o sono. Ela é uma excelente aliada do autocuidado emocional”, completa.
Mesmo que as vantagens sejam percebidas quando estamos curtindo o prazer da própria companhia, o psicólogo clínico comportamental Jayme Pinheiro Rabelo ressalta que a coletividade é, sim, um potencializador do prazer e do bem-estar.
“Estar em um show de uma música que você gosta, com pessoas que você gosta, não só gera uma boa memória, como também move o corpo física e psiquicamente na direção do prazer”, reflete.
Quando se trata da busca pela felicidade plena, o psicólogo clínico comportamental ressalta que não é preciso procurar sensações positivas que “durem para sempre”, pelo contrário. “Vivemos tentando medir a eficácia emocional das coisas, até do lazer. O que importa é a vivência em si. O show promove algo simples, mas poderoso — a chance de experimentar a vida em outra configuração, em outra velocidade”, encerra Jayme Pinheiro. As informações são do site Metrópoles.