Em um novo capítulo da longa novela sobre a importação de remédios à base de canabidiol (CBD), substância encontrada na maconha, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) decidiu negar todos os pedidos de autorização para a compra desses medicamentos, vindos de pacientes que não sofrem de epilepsia, mas de outras doenças crônicas. O órgão, ligado ao Ministério da Saúde, adotou essa medida, se baseando em uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Trata-se de uma mudança brusca. Até agosto de 2015, a Anvisa autorizou 894 dos 1.036 pedidos de autorização para importar canabidiol. Muitas das autorizações foram para pacientes que, com problemas como dores crônicas e mal de Parkinson, obtiveram receitas médicas para usar o medicamento, que não é fabricado no Brasil. Mas, no mês passado, as coisas mudaram. De 14 a 31 de agosto, dos 49 pedidos, 34 foram negados (quase 70%), sendo que 23 das solicitações indeferidas eram para dores crônicas e sete para Parkinson.
“Voltamos à estaca zero”, critica Raimundo Trindade, de 60 anos, há 15 anos diagnosticado com mal de Parkinson, e que teve seu pedido de importação negado. Durante muito tempo, famílias com crianças que sofrem de epilepsia lutaram na Justiça para importar os medicamentos, proibidos no país, alegando que o canabidiol reduz a frequência das convulsões. Até que, em janeiro de 2015, a Anvisa decidiu tirar o CBD do rol de substâncias proibidas. Já em abril, o órgão divulgou regras para importar o remédio de forma simples.
De início, a Anvisa condicionou a autorização para importação dos medicamentos à prescrição médica, sem restringir as doenças que poderiam ser tratadas com canabidiol. Mas, em agosto, passou a negar pedidos que não seja para o tratamento das epilepsias, problema apresentado por pacientes com diferentes doenças. A mudança se deu com base na resolução de número 2.113, do CFM, publicada em 16 de dezembro de 2014.
‘É preciso ter evidência da eficácia’
O presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, explica que a agência decidiu se basear na determinação da entidade que fiscaliza e normatiza a prática médica no Brasil. “O canabidiol não é um medicamento, não tem registro. É preciso ter evidências da efetividade para outros tratamentos, porque não podemos sair aprovando água de lata para o câncer. Para epilepsia, há evidências de eficácia, o que não ocorre para Parkinson e dores neuropáticas ou crônicas”, afirma Jarbas. “Não podemos autorizar experimento em humanos. Se em algum momento autorizamos, foi um equívoco”.
No texto da resolução, o conselho médico aprova o uso compassivo (tratamento ainda não totalmente avaliado, destinado a doentes que não têm outras opções) do canabidiol apenas para epilepsias da criança e do adolescente, refratárias aos tratamentos convencionais. Além disso, restringe a prescrição às especialidades de neurologia e suas áreas de atuação, à neurocirurgia e à psiquiatria.
De acordo com o presidente da Anvisa, se o CFM atualizar sua resolução, incluindo o tratamento para outras doenças, a agência acompanhará o órgão. Mas o psiquiatra Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti, terceiro vice-presidente do CFM e um dos relatores da resolução, demonstra que isso não está perto de acontecer. Com informações do O Globo.