A ‘Operação Licença Médica’, deflagrada pela Secretaria da Administração (Saeb) para apurar indícios de irregularidade no afastamento de servidores do trabalho, identificou 145 funcionários públicos que estavam de licença médica no Estado, mas atuavam em outras atividades remuneradas. A conduta é expressamente proibida pela legislação vigente. Outros 381 servidores ainda estão sob investigação.
De acordo com a Saeb, na lista dos 526 servidores, a apuração detectou casos como o de um médico intensivista (especialista em Unidade de Tratamento Intensivo – UTI), que obteve 462 dias de licença no Estado, mas permaneceu trabalhando numa prefeitura do interior da Bahia. “A Secretaria da Administração tem a obrigação de zelar pelo erário. Nós não pudemos permitir pagamentos de gastos sem o devido amparo legal”, disse o titular da Saeb, Edelvino Góes.
Os servidores apresentavam atestados e relatórios médicos alegando doenças de diagnósticos subjetivos, a exemplo das patologias de ordem psicológica. Assim conseguiam obter concessões de licenças médicas no Estado. Os 145 funcionários foram flagrados trabalhando em empresas privadas ou atuando em outras esferas públicas, no mesmo período em que deveriam estar afastados para tratamento médico.
A operação é mais uma ação da Corregedoria Geral do Estado (CGR/Saeb) para zelar pelo erário, combatendo o desperdício e o desvio do dinheiro público. Entre os 145 servidores existem médicos, professores, dentistas, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, policiais civis, dentre outros. Há funcionários que chegaram a ficar 200, 300 e até mais de 400 dias de licença médica, apresentando atestados reiteradamente.
A ação foi deflagrada pela CGR, em parceria com a Junta Médica do Estado, depois que a unidade correcional recebeu denúncias de profissionais que apresentavam atestados médicos seguidamente, passando períodos prolongados sem trabalhar, alegando estar doentes. Utilizando o Sistema de Perícia da Junta Médica, a Corregedoria identificou 5.764 servidores que obtiveram licenças, por prazos acima de 15 dias, entre janeiro de 2014 e agosto de 2015.
Cadastro Nacional de Informações do INSS
A relação dos 5.764 servidores foi cruzada com os dados do Cadastro Nacional de Informações do INSS para verificar a eventual existência de servidores com outros vínculos empregatícios A apuração detectou 662 servidores trabalhando em empresas privadas ou em outros entes públicos. Destes, o INSS informou que 526 não tiraram licenças médicas no período em que estavam afastados do Estado.
Na sequência, a Corregedoria Geral enviou ofício aos empregadores dos 526 servidores, com indícios de irregularidades, para fazer uma segunda checagem. Deste total, 145 permaneciam trabalhando no período em que estavam de licença médica do Estado – a CGR ainda aguarda posicionamento em relação aos outros 381.
A conduta é expressamente proibida pela legislação vigente, como pode ser observado no Artigo 153 do Estatuto do Servidor Público do Estado da Bahia (Lei Estadual 6.677/1994): “A licença para tratamento de saúde será concedida sem prejuízo da remuneração, sendo vedado ao servidor o exercício de qualquer atividade remunerada, sob pena de cassação da licença, sem prejuízo da apuração da sua responsabilidade funcional”.
Os servidores flagrados na operação vão responder a Processo Administrativo Disciplinar (PAD) e a Processo de Ressarcimento ao erário, no âmbito das corregedorias do Estado. Após a conclusão dos processos, observando o princípio do contraditório e da ampla defesa, os servidores considerados culpados podem ser demitidos do serviço público e terão que reembolsar o Estado pelos valores recebidos irregularmente no período em que estavam de licença médica. No caso de servidores que já se aposentaram, ficando comprovado que obtiveram licença médica de forma irregular, poderão ter o benefício cassado.
Dez atestados consecutivos, sendo três falsos
O médico intensivista apresentou dez atestados médicos consecutivos, no período de pouco mais de um ano e meio, para obter os 462 dias de licença de saúde no Estado. Entretanto, na mesma época, ele trabalhou normalmente como diretor médico em um município do interior da Bahia. A situação do intensivista foi agravada porque a investigação detectou, por intermédio de uma perícia grafotécnica do Departamento de Polícia Técnica (DPT), que três atestados apresentados são falsos. O laudo do DPT apontou que as assinaturas constantes nos atestados não conferem com a assinatura do médico que subscreve o documento.
O médico possui dois cargos no Estado, sendo um no Hospital Menandro de Faria, em Lauro de Freitas, e outro na Fundação da Criança e do Adolescente (Fundac), na unidade da Avenida Bonocô. Apesar da alegada incapacidade para trabalhar, o intensivista atuava normalmente no interior baiano, segundo confirmou o INSS e a prefeitura do município. Além de responder aos processos administrativos, o médico vai ter o caso remetido para a Delegacia de Crimes Econômicos e contra a Administração Pública (Dececap) e para o Conselho Regional de Medicina (Cremeb), pelos indícios de crime de falsificação.
Mais casos identificados
A operação identificou outros casos emblemáticos como o episódio de uma professora da Secretaria da Educação, que obteve 195 dias de licença médica junto ao Estado, mas trabalhava em outro emprego, na Prefeitura de Niterói, no Rio de Janeiro. A educadora apresentou atestados médicos reiteradamente. A professora estaria incapacitada para ministrar aula no Estado, mas ocupa o cargo de Chefe de Serviço de Secretaria, na Secretaria Municipal de Urbanismo e Mobilidade, em Niterói. Em resposta à Saeb, a secretaria informou, em ofício, “que a comissionada executa serviços de assessoramento via internet, que tem plena eficácia na atuação e que não gozou de benefício previdenciário”.
A CGR detectou também o caso de um médico especialista em Medicina do Trabalho que apresentou seis atestados, cada um solicitando 60 dias de afastamento. Ao todo, o profissional passou 360 dias sem trabalhar no Estado. Porém atuava como médico no Serviço Social da Construção (Seconcisp), em São Paulo, no mesmo período que deveria estar de licença para tratamento. A Corregedoria identificou dezenas de casos semelhantes, inclusive muitos trabalhando no interior da Bahia, em prefeituras ou na iniciativa privada.