Após entregar as alegações finais da defesa da presidenta afastada Dilma Rousseff na Comissão Processante do Impeachment no Senado, o ex-ministro José Eduardo Cardozo disse acreditar que, embora o processo seja político, Dilma será absolvida se houver um julgamento “justo”. Segundo Cardozo, as provas apresentadas derrubam os argumentos de que a petista cometeu crime de responsabilidade nas chamadas pedaladas fiscais.
“Se for um julgamento político, mas justo, não tenho dúvida que a absolvição é clara. Aliás, as provas que foram colocadas arrebentam com a acusação. Não há como se dizer que no caso dos decretos [de suplementação orçamentária] tenha ilegalidade e, se tiver ilegalidade, não tem dolo. O mesmo ocorre no Plano Safra: não tem ato da presidenta. Se pegarem todas as testemunhas [de defesa], elas mostram que não tem como manter em pé essa acusação. Portanto, se for um julgamento justo, mesmo político, teremos a absolvição”, avaliou o advogado.
Cardozo disse que juntou nas alegações finais a decisão do procurador do Ministério Público Federal Ivan Cláudio Marx, que pediu o arquivamento de investigação aberta para apurar se houve crime de Dilma em operações de créditos envolvendo bancos públicos, as chamadas pedaladas fiscais. O procurador concluiu não ter havido operações de crédito sem autorização legislativa.
A posição contraria parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) que recomendou a rejeição das contas de Dilma de 2015, usado como base do pedido de impeachment apresentado pelos advogados Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr e Janaína Paschoal. “Aquilo que o procurador [Ivan Marx] afirma é exatamente a tese que temos defendido desde o início. A decisão mostra que a posição do TCU é isolada. Juristas, Ministério Público e técnicos da administração estão conosco”, disse o ex-ministro.
Segundo Cardozo, mesmo que haja divergências jurídicas, Dilma não pode ser condenada diante da posição predominante de que não houve crime nas pedaladas. “Na melhor das hipóteses, há uma divergência jurídica onde, na questão das pedaladas, a maioria está conosco do ponto de vista interpretativo. Respeitamos a outra orientação, mas o que não pode se entender é que alguém seja condenada por uma posição que, efetivamente, expressa a maioria dos técnicos, juristas e que sempre foi assim”, acrescentou.
Desvio de poder
O ex-ministro disse que usou na defesa da presidenta afastada a tese de que houve desvio de poder na deflagração do processo de impedimento. Para tanto, utilizou falas do senador Romero Jucá (PMDB-RR), da senadora Rose de Freitas (PMDB-ES) e do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Jucá aparece em gravações da delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, afirmando que uma “mudança” no governo federal resultaria em um pacto para “estancar a sangria” representada pela Operação Lava Jato. Já a senadora Rose de Freitas disse em entrevista a uma rádio que “não teve esse negócio de pedalada, nada disso”, em referência às acusações contra Dilma.
Em relação a Cunha, Cardozo usou trecho de uma entrevista dele no dia em que renunciou à presidência da Câmara. Na ocasião, Cunha disse que a aceitação do pedido de impeachment foi o marco de sua gestão no comando da Casa. “[Essas falas são] para mostrar que não tem base para o impeachment e que o motivo é estritamente político, que não há fundamento”, argumentou Cardozo.
A defesa também pediu a suspeição do relator do processo na comissão, senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), por ser do mesmo partido de Miguel Reale Jr., e também da advogada Janaína Paschoal por ter recebido honorários de R$ 45 mil do PSDB para elaborar um parecer sobre o impeachment para o partido. Apesar de afirmar que confia nas alegações apresentadas pela defesa, Cardozo reconheceu que o clima na comissão de impeachment é adverso para Dilma.
Golpe
O advogado da presidenta afastada também usou nas alegações finais uma decisão do Tribunal Internacional pela Democracia que declarou que o impeachment de Dilma Rousseff viola a Constituição do Brasil, a Convenção Interamericana dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.
De caráter simbólico, a decisão foi tomada por juristas de diversos países, como Estados Unidos, Argentina, Colômbia, França, entre outros. Eles se reuniram por dois dias no Rio de Janeiro, numa iniciativa da Via Campesina Internacional, da Frente Brasil Popular e da Frente Brasil Juristas pela Democracia. “A abertura da peça é com a afirmação dessa sentença que afirma claramente que as duas acusações contra Dilma são improcedentes, que a Constituição brasileira está sendo desrespeitada, e que, portanto, a consumar-se uma situação desse tipo, nós teremos uma ruptura democrática no Brasil”, disse.
Segundo Cardozo, as alegações finais foram elaboradas com base numa avaliação jurídico-política. O ex-ministro reiterou que, caso o impeachment de Dilma prospere, haverá um golpe institucional no Brasil. “A se consumar um processo com estas características, há um rompimento Constitucional, há um golpe. Nós dizemos textualmente e para aqueles que ficam espantados com essa posição, nós juntamos a posição do atual advogado-geral da União, Fábio Osório Medina que, há um ano, deu uma entrevista dizendo, embora por outros motivos, que se não houvesse base constitucional o impeachment de Dilma seria um golpe, um golpe institucional a expressão que ele utiliza e é a mesma expressão que utilizamos”, destacou.
Cardozo disse ainda que não descarta a possibilidade de recorrer ao Supremo Tribunal Federal para tentar a anulação do processo, caso ele seja aprovado no Senado, mas que esta seria uma última alternativa. “Não afasto esta hipótese, é uma questão que está colocada. É um direito de quem se sente lesado. Evidentemente que nós entendemos que os nossos direitos, os direitos da presidenta, os direitos daqueles que a elegeram e que a democracia brasileira está sendo desrespeitada”, disse.
As alegações finais da defesa de Dilma Rousseff serão agora analisadas pelo relator do processo, senador Antonio Anastasia, que deverá apresentar seu parecer sobre o processo até o dia 2 de agosto, quando o relatório será lido na Comissão Processante do Impeachment. Da Agência Brasil.