O Ministério Público Federal (MPF) anunciou na quinta-feira (20) que denunciou 21 pessoas por homicídio doloso no rompimento da barragem de contenção da mineradora Samarco no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), que ocorreu em novembro do ano passado. Ao todo, são 22 acusados por variados crimes. Quatro empresas também foram denunciadas: a mineradora Samarco, responsável pela barragem; suas acionistas Vale e BHP Billiton; e a VogBR, empresa que assinou laudo atestando a estabilidade da estrutura. Os procuradores disseram que a Samarco tinha consciência dos riscos de um rompimento, mas a ganância na busca por lucro levou à tragédia.
A ação penal do MPF foi protocolada na última quarta-feira (19). O documento de 272 páginas faz um histórico dos problemas ocorridos na barragem, que foram apresentados à imprensa pelos procuradores José Adércio Sampaio, Eduardo Henrique Aguiar, Eduardo de Oliveira e Jorge Munhós. Entre os denunciados estão funcionários da Samarco: Ricardo Vescovi, presidente afastado; Kleber Luiz Terra, diretor afastado de Operações e Infraestrutura; e três gerentes. Onze integrantes do Conselho de Administração, que incluem representantes da Vale e da BHP Billiton, também são acusados.
Se a denúncia for aceita, todos responderão por inundação, desmoronamento, lesões corporais graves e homicídio doloso, que ocorre quando se tem a intenção ou assume o risco de matar. A condenação por todas as acusações podem gerar penas de até 54 anos de prisão. Entre os representantes da Vale e da BHP Billiton denunciados estão cinco estrangeiros. Dois norte-americanos, um australiano, um sul-africano e um francês eram representantes da australiana BHP Billiton no Conselho de Administração da Samarco. Além deles, um britânico representava a Vale. Não há, por enquanto, nenhum pedido de extradição. Também não há até o momento nenhum pedido de prisão preventiva.
Samarco, Vale e BHP Billiton foram denunciadas por 12 crimes ambientais previstos, entre eles poluição, inundação, desmoronamento, crimes contra a fauna e a flora, crimes contra ordenamento urbano e contra o patrimônio cultural. As penas para as empresas incluem multas, interdição temporárias, proibição de contratar o poder público e prestação de serviços comunitários, tais como custear programas de órgãos e entidades ambientais e executar de obras de áreas degradadas. Já o engenheiro Samuel Loures e a empresa VogBR foram denunciados por emitirem laudo enganoso sobre a estabilidade da barragem.
Ganância
Segundo os procuradores, a Samarco tinha consciência dos riscos de um rompimento mas a ganância na busca por lucro levou à tragédia. Com o rompimento, um grande volume de lama de rejeitos se espalhou deixando 19 mortos, causando poluição à bacia do Rio Doce e devastando vegetação nativa. O episódio é considerado a maior tragédia ambiental do Brasil.
“Além de 19 pessoas assassinadas, outras quatro sofreram comprovadamente lesões corporais graves. Outras diversas vítimas que não tiveram suas lesões comprovadas. Os homicídios foram cometidos por motivo torpe e por isso foram considerados qualificados, o que pode resultar numa pena maior, já que ficou comprovado que a causa foi a ganância da Samarco e suas acionistas”, disse o procurador Eduardo de Oliveira. O MPF pede ainda reparação dos danos causados às vítimas. Segundo os promotores, a definição dos valores deve ser arbitrada pela Justiça durante a instrução processual.
Provas
Segundo o MPF, a investigação encontrou documentos que atestam que a Samarco tinha conhecimento dos riscos na barragem de Fundão. Apresentações de slides do Conselho de Administração da empresa, que tinha representantes também de suas acionistas Vale e BHP Billiton, comprova que houve negligência e omissão diante de recomendações para preenchimento de um recuo na ombreira esquerda da barragem. O conselho também teria tomado deliberações que colaboraram para a tragédia.
Documentos internos da mineradora de 2015 obtidos pelo MPF traziam um prognóstico em caso de rompimento da barragem, apontando para a possibilidade de aproximadamente 20 mortes e paralisação das atividades da empresa por até dois anos. Mesmo consciente dos riscos, a Samarco teria priorizado os resultados econômicos em detrimento das práticas de segurança. “A Samarco tinha uma gerência que atuava na gestão de riscos. Em vez de paralisar as operações da barragem, a empresa continuou mantendo sua operação de forma irresponsável”, disse Munhós.
Outro lado
Em nota, a Samarco refutou as denúncias e disse que o MPF desconsiderou as defesas e depoimentos apresentados ao longo das investigações, que comprovariam que a empresa não tinha qualquer conhecimento prévio de riscos à sua estrutura. A mineradora alega que sempre deu prioridade em segurança e que nunca reduziu investimentos nesta área.
“A barragem de Fundão era regularmente fiscalizada, não só pelas autoridades como também por consultores internacionais independentes. Toda e qualquer medida sugerida e implantada, no que diz respeito à gestão da estrutura, seguia as melhores práticas de engenharia e segurança. A estabilidade da barragem de Fundão foi atestada pela consultoria VogBR”, diz o texto. Com informações do MPF.