Ao participar de debate temático no plenário do Senado, nesta quinta (1°), sobre modificações na Lei de Abuso de Autoridade (Lei 4.898/1965), o juiz federal Sérgio Moro disse que este não é o momento adequado para fazer alterações na lei, pois pode passar para a população a ideia de uma tentativa de tolher investigações em curso. Responsável pelas investigações da Operação Lava Jato na primeira instância, Sérgio Moro sugeriu a inclusão de salvaguardas no texto para garantir que agentes da lei não sejam punidos por uma interpretação equivocada no exercício da função.
Moro explicou que faz a observação sem intenção de censurar ou dizer o que deve ser feito pelo Senado. Para o juiz, modificar a lei pode passar uma mensagem equivocada do Senado para a sociedade brasileira. É preciso considerar “o contexto de que existe uma investigação importante, não só a chamada Operação Lava Jato, mas várias outras investigações importantes. Independentemente das intenções dos senadores, uma nova Lei de Abuso de Autoridade poderia ser interpretada no presente momento como tendo o efeito prático de tolher investigações e persecuções penais”, disse o juiz.
Ele acrescentou que o que sociedade quer agora é o enfrentamento mais efetivo desse tipo de criminalidade. “A aprovação do projeto no presente momento poderia dar uma mensagem equivocada à sociedade.” Sérgio Moro, que já fez críticas à proposta de mudanças na lei, entregou ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), autor do Projeto de Lei nº 280, de 2016, que modifica o texto da Lei de Abuso de Autoridade, um ofício sugerindo a inclusão do trecho “não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal, ou na avaliação de fatos e provas”.
“Com essa salvaguarda, eu diria que grande parte dos receios de uma aplicação equivocada desse projeto de lei provavelmente possam ser evitados, inclusive para afastar eventuais receios de que isso, de alguma forma, venha a ser utilizado para criminalizar a jurisdição ou a atuação independente do Ministério Público ou o dever da polícia de apuração das infrações penais, independentemente dos interesses que sejam afetados”, disse o juiz. Sérgio Moro ressaltou que nenhum juiz ou autoridade judicial é conivente com o abuso de autoridade e que qualquer legislação para aprimorar e reduzir desvios é bem-vinda.
Ele observou que, no entanto, é preciso ter cuidado para que, a pretexto de evitar o abuso de autoridade, a legislação não tenha o efeito contrário de prejudicar o cumprimento do dever. “Ainda que a legislação seja movida pelas melhores intenções, o que vai acontecer com ela no futuro, como ela vai ser aplicada, como vai ser interpretada é uma questão em aberto que o legislador tem poucas possibilidades de antever”, disse. O senador Renan Calheiros apresentou o projeto por considerar que a legislação sobre abuso de autoridade vigente está defasada e, por isso, precisa de aprimoramentos. A expectativa é votar a matéria no plenário do Senado no dia 6 de dezembro.
O texto prevê punição para servidores públicos e membros do Judiciário e do Ministério Público, no caso de determinadas prisões “fora das hipóteses legais”, como, por exemplo, quando presos são submetidos ao uso de algemas quando não há resistência à prisão e quando são feitas escutas sem autorização judicial, atingindo “terceiros não incluídos no processo judicial ou inquérito. A proposta de Renan provocou reações contrárias de magistrados, como Sérgio Moro e da Associação dos Juízes Federais do Brasil que classificou a iniciativa de tentativa de intimidação de juízes. Da Agência Brasil. Texto atualizado às 14h05.