Em novas imagens de câmeras de segurança, divulgadas nesta terça-feira (13), Bruno Barros da Silva e Yan Barros, suspeitos de furtar carne em mercado de Salvador, aparecem sendo retirados do estabelecimento. As informações foram divulgadas durante coletiva do Ministério Público da Bahia (MP-BA) nesta manhã.
No vídeo, Bruno e Yan Barros são retirados da área interna do mercado, passam pela lateral e são levados a uma sala de segurança. Logo depois, pelo menos quatro jovens, que são suspeitos de ter ligação com o tráfico de drogas, aparecem no mercado.
De acordo com a promotora de Justiça, Ana Rita Cerqueira Nascimento, o MP-BA não pode afirmar se há uma ligação dos agentes responsáveis pela segurança do mercado com o tráfico de drogas.
“As imagens deixam de forma clara e, até os outros depoimentos trazidos, que houve uma autorização, a ponto de deixar a porta de uma área restrita para funcionários aberta, para que essas pessoas entrassem”, explica.
“Em todo o momento, nas imagens trazidas, você não vê resistência, eles entram tranquilamente, transitam na área. Isso me autoriza falar que houve, sim, uma entrega, uma autorização. Não houve resistência”, comenta a promotora.
Ainda na coletiva desta segunda-feira, o MP-BA divulgou o documento da denúncia de 13 pessoas por crimes que resultaram nas mortes de Bruno Barros da Silva e Yan Barros da Silva.
No documento, o órgão detalha que Bruno havia ajustado uma “corrida” com um amigo para que ele o levasse, juntamente com Yan e outro acompanhante, a um shopping na região do Caminho das Árvores. No entanto, durante o trajeto, mandou que o motorista fosse ao mercado Atacadão Atakarejo, no bairro do Nordeste de Amaralina. Ao chegar local, o amigo estacionou o veículo em frente a uma borracharia, situada próxima ao estabelecimento.
Ainda segundo o MP-BA, Bruno, Yan e o acompanhante entraram no estabelecimento por volta das 13h20, onde se dirigiram a sessão de carnes e passaram a acomodar os produtos dentro de duas mochilas. O acompanhante, no entanto, ficou mais distante, para dar cobertura e observar a aproximação de seguranças do estabelecimento.
Neste momento, um dos fiscais de prevenção de perdas fazia o monitoramento do estabelecimento através do circuito de câmeras, quando foi informado por um dos colegas sobre um possível furto praticado por três indivíduos, segundo informações do MP-BA.
A denúncia do MP-BA ainda detalha que o fiscal foi para a entrada da loja, na companhia do colega que informou sobre o suposto furto e outro prestador de serviços, já que existe uma instrução da empresa em só realizar abordagens na saída do indivíduo, constatando o não pagamento da mercadoria furtada.
Nas imagens colhidas no sistema de monitoramento da empresa, é possível ver o momento em que Yan se desloca para a saída da loja, e ao cruzar a porta, é abordado pelos funcionários. De acordo com o MP-BA, o jovem dispensa a mochila que carregava e tenta correr para a área do estacionamento interno do mercado e é perseguido pelos funcionários que o abordaram.
Durante a perseguição, Yan chega a cair no chão, de mãos para cima, em forma de rendição. Um prestador de serviços, que vestia uniforme da empresa MAP, aponta uma arma a fim de render o jovem, segundo denúncia do MP-BA. Outro prestador de serviços se aproxima de Yan e o chuta pelo menos duas vezes, sendo o primeiro na lateral esquerda do abdômen e o segundo na altura do ombro esquerdo. Em seguida, o jovem foi conduzido para uma área denominada como ambiente interno de funcionários.
No texto, o MP-BA também detalha que Bruno, ao ver a situação de Yan, chega dispensar a mochila em uma lata de lixo dentro da loja e, ao passar pelos prestadores de serviço diz: “Está de boa”. Porém, é contido e conduzido em direção à sala restrita aos funcionários, tendo o seu aparelho celular tomado.
Entrega das vítimas, execução e ocultação de cadáver
Conforme denúncia do MP-BA, no ambiente restrito a funcionários, conhecido como “P2”, as imagens de câmeras de segurança apontam a participação de indivíduos que, de forma tranquila e sem enfrentar oposição ou obstáculos dos responsáveis pela segurança do Atakadão Atakarejo, circulam calmamente pelas dependências, até mesmo nas áreas reservadas aos prestadores.
O órgão ainda salientou que, nas imagens, nenhum dos denunciados pelo MP-BA estava portando arma de fogo ou arma branca ostensivamente, de forma ameaçadora, que pudesse gerar medo ou pânico inconteste aos funcionários do mercado Atakadão Atakarejo.
Segundo o Ministério Público, os denunciados afirmam, em depoimento, que as vítimas foram entregues espontaneamente. Conforme depoimento de um dos denunciados, tio e sobrinho foram mortos a tiros com espingardas calibre 12. Os corpos das vítimas foram colocados no porta-malas de um carro roubado e abandonado na rua Guiomar Florense, no bairro do Parque Bela Vista, na capital baiana.
A rede de supermercados Atakarejo foi procurada para comentar as denúncias apresentadas pelo MP, mas preferiu não se posicionar. Em nota, disse que deseja que “todos os fatos sejam esclarecidos o mais rapidamente possível e que todos os responsáveis pelo fato lamentável ocorrido no Nordeste de Amaralina, sejam devidamente punidos”.
Além disso, a empresa reforça que segue um rigoroso Código de Ética e Conduta e não tolera qualquer tipo de violência e que adota diversas medidas visando o enfrentamento ao racismo estrutural.
Denúncia oferecida pelo MP-BA
De acordo com o MP-BA, as 13 pessoas foram denunciadas pelos crimes de homicídio qualificado, constrangimento ilegal, extorsão, cárcere privado e ocultação de cadáver. A denúncia foi oferecida nesta segunda, pela promotora de Justiça Ana Rita Cerqueira Nascimento, coordenadora do Núcleo do Júri (NUJ).
O Ministério Público pediu a decretação da prisão preventiva de todos os denunciados, “para viabilizar a continuidade da instrução criminal, da aplicação penal e a garantia da ordem pública”. No dia 7 de julho, a Polícia Civil informou que o inquérito do caso tinha sido concluído e encaminhado para o Ministério Público Estadual.
Segundo as delegadas Andréa Ribeiro, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), e Zaira Pimentel, que preside o inquérito, as investigações apontaram que a ordem para matar as vítimas foi dada por agentes do tráfico de drogas. As delegadas, no entanto, não detalharam o que motivou essa ordem.
Elas disseram ainda que a polícia não sabe quem acionou os envolvidos com tráfico para buscar tio e sobrinho no supermercado.
Presos e indiciados
Ao todo, 23 pessoas foram indiciadas pelos seguintes crimes: homicídio qualificado, ocultação de cadáver e omissão de socorro qualificada. Cada um dos indiciados teve sua responsabilização pessoal de acordo com o envolvimento nos assassinatos de Bruno e Yan Barros. Esse envolvimento foi concluído pelas investigações da polícia.
°Dos 23 indiciados, 10 estão presos e os outros 13 são considerados foragidos;
°Dos 23 indiciados, seis são funcionários do Atakarejo e o restante são pessoas que possuem envolvimento com o tráfico de drogas;
°Dentre os 13 foragidos, um deles é funcionário do Atakarejo e o restante são pessoas que possuem envolvimento com o tráfico de drogas;
°Das 10 pessoas presas, cinco são funcionárias do Atakarejo – quatro presas inicialmente e o funcionário detido nesta quarta-feira.
Participação de Michel Lins
°No dia 30 de junho, quando a polícia deflagrou a 2ª fase da Operação Retomada, o motoboy Michel da Silva Lins foi detido por mandado de prisão. Ele segue preso nesta segunda-feira (12) e é um dos denunciados pelo Ministério Público.
Segundo a polícia, ele foi o responsável por “descartar” os corpos de Yan e Bruno Barros. Entretanto, familiares de Michel afirmam que o rapaz, de 21 anos, não tem envolvimento com o crime.
A polícia alega ter identificado Michel por câmeras de segurança, que registraram a motocicleta que pertence a ele no local do crime. A família confirma que a moto que aparece nas imagens é dele, porém, diz que o veículo estava emprestado a um amigo do rapaz.
A família afirma ainda que o homem que fez o descarte dos corpos se deslocou na moto como cliente do amigo de Michel, que é mototaxista, a quem a moto estava emprestada. Esse homem teria solicitado a corrida no bairro de Brotas.
Por causa da prisão, a família fez protestos em Salvador. Os familiares também disseram que o amigo de Michel, que estava com a moto, prestou depoimento à polícia.
A irmã de Michel, Michele da Silva Lins, disse que existem álibis que podem comprovar a não participação dele no crime. Segundo ela, no momento em que as mortes ocorreram, Michel separava uma briga de vizinhos no bairro, e não poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo.
A delegada Zaira Pimentel informou, no entanto, que nenhum álibi chegou até ela e que a polícia tem indícios da participação dele, que a moto dele estava no local e que há também depoimentos que relacionam Michel ao caso.
Investigações e operação
A polícia deflagrou no dia 10 de maio a primeira fase da Operação Retomada, realizada pelo DHPP. Na primeira fase, oito pessoas, entre seguranças e traficantes, foram presas. Três são funcionárias do Atakarejo e outras cinco são suspeitas de tráfico de drogas e de envolvimento no crime.
Em uma entrevista coletiva, no mesmo dia, a polícia confirmou a versão da família de que tio e sobrinho foram entregues aos suspeitos de tráfico por funcionários do supermercado. No mesmo dia, três funcionários do Atakarejo foram presos em uma operação policial. Ainda na coletiva, a polícia disse que os seguranças pediram R$ 700 para liberar as vítimas.
Além disso, um jovem de 25 anos morreu após ser baleado em um suposto confronto com policiais militares no bairro da Chapada do Rio Vermelho, em Salvador, no dia 1° de julho. Matheus Santana de Assis é suspeito de envolvimento nas mortes de Bruno e Yan Barros. A PM informou que houve troca de tiros, no entanto a família diz que os PMs invadiram o imóvel, pediram para a criança e a sogra dele se retirar, e o mataram.
Mortes de Yan e Bruno Barros
Na noite de 26 de abril, dois homens foram achados mortos na localidade da Polêmica, em Salvador. De acordo com a Polícia Civil, eles foram torturados e atingidos por disparos de arma de fogo. À época, a polícia informou que a motivação do crime estava relacionada ao tráfico de drogas.
Um dia depois, eles foram identificados como Bruno Barros e Yan Barros. Já no dia 29 de abril, a mãe de Yan, Elaine Costa Silva, revelou que ele foi morto após ter sido flagrado pelos seguranças do supermercado Atakarejo furtando carne no estabelecimento.
Segundo ela, o tio de Yan, Bruno, que também foi morto, enviou áudios a uma amiga informando o que tinha acontecido e pedindo ajuda para não ser entregue aos traficantes do Nordeste de Amaralina. No áudio, Bruno chegou a pedir para que a amiga chamasse a Polícia Militar, o que a jovem alega ter feito.
Apesar de o crime ter acontecido no dia 26 de abril, o supermercado Atacadão Atakarejo só afastou os seguranças envolvidos no caso 11 dias depois, no dia 6 de maio. Imagens gravadas por um celular flagraram um dos seguranças do local agredindo Yan. A redação é do site G1 BA.