O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu abrir investigação para apurar quem foram os financiadores dos atos golpistas liderados pelo presidente Jair Bolsonaro no 7 de setembro. A decisão partiu do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, Luís Felipe Salomão, que se baseou em denúncias veiculadas pela imprensa sobre supostas irregularidades nas manifestações.
Salomão quer saber se os atos receberam dinheiro público ou de empresas e aponta possíveis crimes de abuso de poder econômico, político, conduta vedada a agentes públicos e campanha eleitoral antecipada.
À Fórum, o advogado Renato Ribeiro de Almeida, professor de direito eleitoral e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), afirmou que, caso o TSE comprove essas irregularidades e Bolsonaro seja condenado, uma das sanções possíveis seria o presidente se tornar inelegível.
“Uma vez condenado ele poderia receber uma pena de multa ou pena de ter inscrita sua inelegibilidade. Ou seja, inelegível por 8 anos”, atesta o especialista.
Abuso de poder político e campanha antecipada
As manifestações com bandeiras antidemocráticas, que contaram com discursos do presidente pregando uma ruptura institucional, foram marcadas pela mobilização de caravanas e uso de materiais que se assemelham aos de campanha política.
Num vídeo que circulou nas redes sociais ainda no Dia da Independência, um grupo de trabalhadores aparece recebendo dinheiro de um homem vestido com uma camiseta das manifestações golpistas, dentro de um ônibus.
Na gravação, eles dizem que quem pagou pela ida à capital paulista foi a empresa de equipamentos agrícolas Jacto, com sede no município de Pompeia (SP). A empresa, em nota oficial, negou ser responsável pela caravana e pelas notas de R$ 100 distribuídas aos participantes.
Além disso, inúmeros caminhoneiros realizaram bloqueios em estradas e vias, e há a desconfiança de que empresas do agronegócio estejam por trás deste movimento.
Como se não bastasse, Jair Bolsonaro utilizou avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para se deslocar entre os atos de Brasília e São Paulo, isso sem contar os gastos com seguranças. Ou seja, se valeu de dinheiro público para participar das manifestações.
Para o advogado Renato Ribeiro de Almeida, não há dúvida de que os atos bolsonaristas tiveram caráter político. “O mais grave seria, a princípio, a utilização de recursos públicos, e me parece que temos algumas coisas comprovadas. O próprio deslocamento do presidente é complicado. Ele participou de um ato em São Paulo e Brasília no mesmo dia, e você tem um deslocamento com recursos públicos utilizados para um ato de campanha”, afirma.
“É um ato alheio ao cargo de presidente da República, é um ato evidentemente político. E a lei pune com rigor, por improbidade administrativa, por exemplo, prefeitos. Não faltam exemplos na jurisprudência de prefeitos que pegam o carro oficial para fins particulares, ou para encontrar um dirigente partidário. Há inúmeros processos que consideram isso improbidade administrativa”, exemplifica ainda o especialista.
Além da improbidade administrativa, esse tipo de conduta que Bolsonaro teria se valido é o que configura o abuso de poder político citado por Salomão em sua decisão de investigar o financiamento das manifestações.
“O abuso de poder político é se valer do cargo público pra conseguir benefício eleitoral e político para si ou algum beneficiário, um sucessor. É o caso de Bolsonaro. Ele fala toda hora em reeleição, que só sai do poder morto…”, pontua o advogado.
“Ele tá antecipando nas eleições, falando do cargo que quer ocupar e tudo mais. Aí temos campanha antecipada e, dos ilícitos, é o mais singelo. Abuso de poder e conduta vedada são os mais sérios”, completa.
Abuso de poder econômico
O abuso de poder econômico que o TSE pretende comprovar pode ter ocorrido caso empresas, de fato, tenham empenhado recursos financeiros para custear as manifestações bolsonaristas.
Desde 2015 que a legislação eleitoral proíbe pessoas jurídicas de financiarem campanhas políticas. Se os atos tivessem acontecido em período de campanha, segundo explica o advogado Renato Ribeiro de Almeida, o registro de candidatura de Bolsonaro poderia ser cassado. O fato dos atos terem acontecido fora do período de campanha não impede, entretanto, de Bolsonaro ter se valido de abuso de poder econômico com recursos de empresários.
“O beneficiado [pelo financiamento privado] é responsabilizada pelo abuso. Está indo atrás de recursos que não são de pessoas físicas, são jurídicas, que por não terem título de eleitor, por não poderem fazer financiamento, não podem tomar partido desse ou daquele político. Temos aí um ato político, abuso de poder econômico. Quando se fala em abuso, é o ‘algo a mais’, o excesso, algo que desequilibra. E, no caso, está acontecendo um desequilíbrio com relação ao poder econômico empresarial”, aponta. As informações são da Revista Fórum.