O policial militar e youtuber Gabriel Monteiro teve o porte de arma suspenso e está submetido a um processo administrativo disciplinar que pode culminar em sua expulsão da corporação do Rio. O soldado, que tem quase quatro milhões de seguidores nas redes sociais e é conhecido por defender o governo Bolsonaro, cometeu uma “transgressão disciplinar de natureza grave”, de acordo com a corregedoria da PM, ao tratar “de forma desrespeitosa” o ex-comandante geral da PM coronel Ibis Silva Pereira. A decisão foi tomada após sindicância interna e publicada no Boletim Interno da corporação na última quarta-feira.
Segundo relatório da comissão de revisão disciplinar, o soldado desrespeitou o coronel em pelo menos duas ocasiões. Em uma delas, o PM gravou um vídeo na presença do oficial e publicou na internet, sem autorização, afirmando que Ibis foi visto entrando em uma área dominada por uma facção criminosa e pergunta: “O senhor é do PSOL, não é? (…) Existe alguma ligação entre o PSOL e a criminalidade da Maré?”. O documento narra que no dia 23 de outubro do ano passado o soldado se passou por estudante universitário para marcar uma conversa com o coronel Ibis no gabinete da deputada Renata Souza (PSOL/RJ), na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), onde o oficial trabalha como assessor parlamentar.
Na hora marcada, o soldado ligou para o gabinete e disse que não conseguia entrar no edifício da Alerj pois estava de bermuda, então pediu que o coronel descesse para conversar com ele do lado de fora. Ao encontrá-lo, o oficial reconheceu Gabriel Monteiro. Sem aviso prévio, o soldado começou a filmar uma entrevista com o coronel e posteriormente publicou o vídeo na internet sem permissão. Ao longo do vídeo, Gabriel Monteiro acusa o ex-comandante de ter relações com uma facção criminosa do Rio e pergunta se há ligação entre o PSOL e criminosos.
“Ninguém entende como o senhor entra no coração do Comando Vermelho e não é morto, sendo policial militar (…) A rua onde o senhor ia é uma boca de fumo, coronel (…) O senhor é do PSOL, não é? (…) Existe alguma ligação entre o PSOL e a criminalidade da Maré?”, interpela o soldado, sem deixar espaço para respostas. Após a gravação do vídeo, o ex-comandante impetrou uma ação na Justiça contra o soldado, que voltou a procurá-lo no dia 3 de dezembro, desta vez dentro da Alerj. O relatório conta que o coronel foi abordado na porta do gabinete por Gabriel Monteiro e outro homem, munido de uma filmadora portátil, e foi submetido a um novo vídeo. Na ocasião, o soldado questionou o oficial sobre o motivo de ter ajuizado a ação em seu desfavor. O novo vídeo também foi divulgado na internet, mesmo sem permissão do oficial.
Procurado, o ex-comandante classificou a atitude do soldado como uma transgressão “para fins de projeção pessoal” e o criticou por fazer uma acusação grave sem ter provas. “Questões internas das corporações militares não devem ser comentadas publicamente por seus agentes. De qualquer maneira, um policial que acusa o outro sem fundamento e materialidade joga contra a memória e honra da corporação. Trata-se de uma ação leviana, descomprometida com o bem da instituição, em busca de holofotes em um ano eleitoral”, afirmou Ibis.
O coronel afirmou ainda que lamenta a forma como a situação evoluiu. “Nesses 33 anos de Polícia Militar, eu honrei a farda e aprendi que a corporação é um importante elemento de coesão social. Um policial precisa ser, acima de tudo, alguém que cuida da lei e da sociedade, não que a transgride para fins de projeção pessoal. O que torna essa profissão incompatível com qualquer tipo de desrespeito com relação ao outro”, disse. Em seu perfil no Instagram, Monteiro lamentou a punição e afirmou que o principal motivo para a possível expulsão seria o vídeo em que denuncia o envolvimento do coronel Íbis com traficantes do Comando Vermelho, no Complexo da Maré, Zona Norte do Rio.
“Eu tinha fotos do coronel Íbis dentro do coração do Comando Vermelho, na Maré, onde nenhum policial militar consegue entrar. Ele não soube responder as minhas perguntas sobre como consegue entrar em uma área tão hostil para o policial militar. Por causa desse questionamento, no dia de hoje, eu perco o meu porte de armas, perco minhas funções externas da PM, estou largado”, disse no vídeo. O soldado ainda afirma que está sendo ameaçado de morte e que não poderia se defender sem armas. “Se eu morrer, já sabem quem são os responsáveis”, disse. O caso levou o nome de Gabriel Monteiro aos assuntos mais comentados no dia no Twitter. A hashtag “somostodosgabrielmonteiro” possui mais de 110 mil publicações e também mobilizou personalidades ligadas ao presidente Jair Bolsonaro.
O filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) escreveu que não conhece Gabriel, mas que “retirar seu porte é quase uma sentença morte”. O policial militar agradeceu o apoio e afirmou que “se o Comando Vermelho conseguir me matar saibam que sou grato pelo apoio dos senhores”. Gabriel Monteiro também utilizou as redes sociais para incentivar os seguidores a cobrar uma resposta do governador do Rio, Wilson Witzel, sobre a ação disciplinar. Um apoiador do soldado marcou o Witzel em uma publicação afirmando que o procedimento era uma “covardia”. O governador respondeu que a PMERJ “tem como pilares os princípios da hierarquia e da disciplina”.
Em nota, a PM afirma que “o referido Soldado responde a Comissão de Revisão Disciplinar, procedimento interno previsto para avaliar conduta dos integrantes da Corporação”. A corporação ressalta que, “como as demais instituições militares do país, tem como pilares os princípios da hierarquia e disciplina. Vale ressaltar que o rito do procedimento prevê a ampla defesa e o contraditório quanto às imputações de transgressões disciplinares nele contidas. Todas as garantias constitucionais são asseguradas aos integrantes da Corporação, oficiais ou praças”. Matéria extraída do site do jornal Extra.