A Polícia Federal afirmou em relatório encaminhado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) que o governador afastado de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), teve uma “evolução patrimonial exorbitante” entre 2019 e 2022. O período coincide com o suposto esquema de desvio de dinheiro público por meio de “rachadinhas” de servidores da Assembleia Legislativa alagoana. Dantas foi apontado pela PF como principal beneficiário e “autor intelectual” do suposto esquema.
A suspeita é que parte dos valores sacados pelos funcionários tenha sido usada para pagar despesas pessoais do governador, como a aquisição de imóveis de luxo. Segundo a PF, nos últimos quatro anos, Paulo Dantas desembolsou quase R$ 10 milhões na compra de imóveis. Candidato à reeleição, o governador foi afastado do cargo por 180 dias pela ministra Laurita Vaz, em decisão desta terça-feira (11), que será discutida pela Corte Especial do STJ na quinta (13).
Como mostrou o UOL, a PF chegou a pedir a prisão do governador. A ministra, porém, disse que a medida seria extrema, mas que havia elementos suficientes que justificassem o afastamento de Dantas do cargo. Em nota enviada à reportagem na terça-feira, Paulo Dantas disse considerar que uma ala da PF permitiu-se ser aparelhada para atender a interesses políticos e eleitorais.
“Sob pretexto de investigar acusações de 2017, essa parte da PF pediu à Justiça o meu afastamento do cargo, a três semanas do segundo turno, e estando com 20 pontos de vantagem. A tentativa de criar alarde perto da confirmação da vitória é fácil de ser desconstruída: foi anunciada por adversários, evidenciando a manipulação da operação policial”, afirmou.
Mesmo afastado, Dantas poderá continuar a disputar a reeleição. O governador obteve 46,64% dos votos no primeiro turno. Ele aparece com 59% dos votos válidos para a segunda rodada da eleição, contra 41% do senador Rodrigo Cunha (União Brasil), segundo pesquisa Pesquisa do Instituto Real Time Big Data, contratada pela Record TV.
Patrimônio ‘exorbitante’
No relatório enviado ao STJ, a PF aponta a suspeita de que parte dos valores desviados no suposto esquema de “rachadinha” dos servidores da Assembleia Legislativa de Alagoas teria sido usada para aumentar o patrimônio de Paulo Dantas.
De acordo com a PF, ao declarar bens para a Justiça Eleitoral em 2018, Dantas disse que tinha um patrimônio de R$ 796 mil. Sua esposa, Marina Thereza Dantas, declarou R$ 361 mil em 2020, quando disputou a prefeitura de Batalha (AL). Entre os imóveis declarados pelo casal estavam um imóvel rural e um apartamento de 130 metros quadrados em Maceió.
Desde então, o casal passou a adquirir diversos imóveis, como uma “luxuosa cobertura” e uma mansão, ambas em Maceió, além de firmar promessas de compra e venda que chegam a R$ 5 milhões, segundo a PF.
Exatamente no período em que os desvios de verbas da Assembleia ocorreram, os investigados Paulo e Marina Dantas apresentaram evolução patrimonial exorbitante. Somente para aquisição dos imóveis mencionados foram desembolsados quase 10 milhões de reais entre 2019 e 2022″Trecho de relatório da Polícia Federal enviado ao STJ
Compra de imóveis
No relatório, a PF indica a compra de uma “luxuosa cobertura de 300 metros quadrados” por R$ 1,6 milhão. A compra foi quitada em 16 parcelas de R$ 100 mil com pagamentos em espécie. Detalhes da transação constam em “diversos arquivos” obtidos no celular de um dos operadores do suposto esquema, de acordo com a PF.
Para a PF, “há indícios” de que o apartamento foi pago “integralmente com o dinheiro do desvio mediante quitação mensal constante das planilhas de controle do principal operador do esquema”.
A cobertura foi, em seguida, repassada como parte do pagamento de uma mansão localizada em um condomínio fechado de Maceió. O negócio custou R$ 8 milhões. A casa teria sete suítes e um elevador.
“Apenas no que se relaciona aos imóveis utilizados como residência pelo casal nos últimos anos, foi possível apurar que no curto espaço de tempo de aproximadamente 5 anos, entre 2018 e 2022, eles [Paulo e Marina Dantas] experimentaram um aumento exuberante no padrão de vida, pois passaram de um apartamento de classe média com 130 metros quadrados, avaliado em R$ 500 mil, para a mansão recém-adquirida por R$ 8 milhões”, disse a PF.
A investigação também apontou novas aquisições feitas pelo governador ao longo dos anos. Uma delas é uma promessa de compra e venda de 25 unidades de 30 metros quadrados no valor total de R$ 5 milhões. Uma empresa de empreendimentos ligada aos imóveis chegou a dizer à PF que o governador afirmara que a origem do dinheiro seria a venda de uma fazenda.
Outra aquisição de imóvel que chamou a atenção dos investigadores foi a compra de uma propriedade rural chamada “Santa Luzia”, localizada na cidade de Batalha. Segundo a PF, o imóvel foi adquirido por “ao menos” R$ 733 mil.
“Entretanto, considerando que trata-se de fazenda com 295 hectares, acredita-se que o valor total do negócio foi em torno de R$ 1,77 milhão, pois consulta a corretores especializados indicou que o valor mínimo do hectare na região é de R$ 6 mil”, disse a Polícia Federal.
Movimentações suspeitas
Além das compras de imóveis, os investigadores receberam relatórios elaborados pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) sobre transações consideradas suspeitas. Elas são citadas pela PF para embasar a suspeita de que parte dos valores desviados retornava para o governador.
Uma das transações foi um depósito em espécie, no valor de R$ 240 mil, feito para uma empresa de tratores em fevereiro. O autor do depósito seria um dos suspeitos de atuar como operador do esquema. Segundo a PF, Dantas seria o beneficiário final.
O Coaf também identificou outra transação de R$ 50,8 mil em espécie referente a uma GRU (Guia de Recolhimento da União) emitida em nome do governador. O valor foi depositado por um homem apontado como suposto operador do esquema, e demonstraria, para a PF, que “parcela do valor desviado era usada para pagamento de despesas pessoais do atual governador”.
A PF indicou ainda que a esposa de Dantas teria recebido cerca de R$ 169 mil “decorrentes de depósitos em espécie de forma fracionada”. “O detalhamento da comunicação do Coaf aponta que os depósitos variavam entre os valores de R$ 2 mil e R$ 3 mil”, disseram os investigadores.
Outro lado
Procurado pelo UOL, o governador Paulo Dantas afirmou que sofre uma “grave farsa processual”. “O governador Paulo Dantas vem sofrendo uma grave farsa processual, com distorção de dados e fatos para corroborar com ação criminosa de uma polícia a serviço de um grupo político. A resposta de Paulo Dantas será dada na Justiça”, disse, em nota.
Na terça-feira, a coligação composta por MDB, PT, PCdoB, PV, PDT, PSC, Podemos e Solidaridade, formada em torno do governador de Alagoas, categorizou como “golpe” o afastamento do candidato à reeleição por 180 dias, autorizado pela ministra Laurita Vaz, do STJ a pedido da PF.
“O dia 11 de outubro de 2022 ficará marcado na história brasileira como o maior ataque feito contra um governador legitimamente eleito, vencedor do primeiro turno com ampla vantagem e líder absoluto nas pesquisas. O que os últimos fatos indicam é uma tentativa de vencer a disputa na base do golpe”, disse a chapa. Com informações do Folhapress.