Solto na noite desta sexta-feira (12) depois de três anos, o porteiro Paulo Alberto da Silva Costa, de 37 anos, afirmou ter sido vítima de racismo nas ações penais em que foi reconhecido por foto. Ele deixou o Complexo Penitenciário de Gericinó, na Zona Oeste do Rio, sob chuva — e muita emoção.
“Com certeza [houve racismo], sem dúvida”, disse Paulo, abraçado à mãe e à irmã. “Tô muito feliz de estar perto da minha família, saber que vou ver meus filhos. Acabou aquele inferno lá dentro, [que vivi] injustamente]”, emendou.
O alvará de soltura foi emitido no início da noite pelo TJ. Paulo Alberto deixou o presídio às 22h. Paulo não quis comentar sobre os erros de investigação que levaram à sua prisão — reconhecidos em decisão judicial. “Deixa Deus no controle. Deus sabe de tudo”.
Sem passagens pela polícia
Paulo é negro e nunca teve passagens pela polícia, mas em 62 ações penais ele foi reconhecido pelas diferentes vítimas por uma foto retirada de suas redes sociais e incluídas no álbum e no mural de suspeitos da Delegacia de Belford Roxo, na Baixada Fluminense.
A Defensoria Pública do Rio de Janeiro alegou que a identidade visual do suspeito foi sendo construída ao longo da investigação e que ele foi reconhecido apenas por fotografia apresentada às vítimas ao lado de outras que mostravam indivíduos com características físicas diferentes.
Em uma dessas ações penais, o porteiro chegou a ser condenado pela Justiça do Rio a seis anos e oito meses de prisão. O Tribunal de Justiça do Rio ainda negou recurso da defesa e, ao atender um pedido do Ministério Público, aumentou a pena para oito anos. O caso chegou ao STJ.
O Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) apontou que todos os 62 casos seguiram o mesmo procedimento policial: o reconhecimento fotográfico e o pronto encerramento das investigações, sem investigação e produção de outras provas.
Decisão do STJ
Na última quarta-feira (10), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que Paulo fosse solto. Os ministros decidiram pela absolvição em uma das acusações e que as demais devem ser reavaliadas pelos juízes competentes. Os ministros entenderam que todos os processos foram baseados apenas no reconhecimento fotográfico falho.
A relatora, ministra Laurita Vaz, afirmou que houve um erro sistêmico e que identificação apresentava contradições. Em determinado momento, segundo ela, ele usava cavanhaque, mas posteriormente a vítima não comentou novamente sobre essa característica física. A altura do suspeito também só surgiu em um segundo relato da vítima, que em momento algum chegou a afirmar que reconhecia o acusado.
A relatora ressaltou que o STJ tem entendimento de que apenas o reconhecimento fotográfico não serve como prova cabal de crime. “O reconhecimento positivo pode comprovar a autoria. Não significa que a afirmação do ofendido que identifica agente do crime é prova cabal. Do contrário, a função dos órgãos de estado seria relegado a segundo plano, a mero homologador da acusação”, disse.
Laurita Vaz ressaltou que o reconhecimento de pessoas não prepondera sobre quaisquer outros meios de prova, cabendo aos investigadores buscar mais medidas como confissão, testemunha, perícia, entre outros. As informações são g1 Rio Janeiro.