Relator do Estatuto da Família (PL 6.583/13) na Câmara, o deputado Diego Garcia (PHS-PR) apresenta nesta quarta (2) parecer que mantém casais homoafetivos fora dos direitos especiais dedicados a famílias tradicionais, de acordo com o projeto orginal. Ele amplia, no entanto, os benefícios para situações já contempladas pela Constituição Federal, que não foram acatadas no texto inicial. O deputado incluiu parágrafos do Artigo 226 que contemplam, por exemplo, mães e pais solteiros. Apesar de se limitar ao que está previsto na Carta Magna, contrariando os anseios da proposta original, o parlamentar sugere ampliar a discussão.
“Faço a proposta para que seja discutido e apresentado um texto sobre o direito vital, que contemplaria não só os casos homoafetivos, mas também os casos de dois primos que vivem juntos, dividem diversas obrigações no lar e querem estabelecer vínculos de solidariedade. Trago essa inovação para ser discutida com o Legislativo”, disse Garcia.
O caminho indicado não está previsto no parecer substitutivo, mas sim no voto sobre o PL, que deve ocorrer ao meio-dia, quando o deputado promete defender a proposta perante a comissão especial que analisa o tema. Garcia quer se antecipar a iniciativas de outros parlamentares e garante que sua equipe já trabalha em um texto que alteraria o Código Civil, já que o artigo da Constituição deixa limitada a definição de família constituída por homens e mulheres – “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento”.
“A gente quer ampliar discussão porque existem outras realidades no país que estão sendo deixadas de lado. No meu parecer, deixo claro e faço destaque em relação à base da sociedade prevista no Artigo 226, segundo o qual essa base deve dar a proteção. Por isso a inovação, que pode debater direito previdenciário, pensão e uma amplitude de coisas a outras comunidades”, acrescentou Garcia. Ele garantiu o respeito às formações familiares de todos os tipos e disse que tomou “cuidado muito grande” no parecer. “Eu tentei, da melhor maneira possível, tirar toda a polêmica. Cito questões religiosas – houve ataques e alguns conflitos na comissão – eu deixei de lado e procurei pautar o voto de acordo com o que está assegurado na Constituição”.
LGBT
Guilherme tem hoje 18 anos. Foi adotado pelo contador Itamar de Oliveira Lopes ainda recém-nascido. Hoje, estuda publicidade e propaganda e trabalha na área. “Acho ridículo tentar estipular o que deve ser uma família. Pode ver, há inúmeros casais tradicionais que são muito mais destrutivos do que um casal homoafetivo ou solteiro para um filho”. Guilherme contou que estranhou a situação quando era pequeno. O pai, Itamar, solteiro e homossexual, só tinha o apoio, na época, da mãe e da irmã. “Depois, percebi que não é isso. Nunca senti falta de nada. Não sinto medo porque mesmo que esse projeto seja aprovado, vai continuar existindo essa realidade. Não devia ser aprovado. Os jovens estão percebendo cada vez mais as diversas realidades. Essa lei, daqui a uns dez anos, pode afetar muito a sociedade pela cabeça da geração que está vindo”.
Um dos pontos previstos na proposta original inclui, nos currículos escolares, uma disciplina chamada educação da família, o que, para Guilherme, tem reação categórica. “Provavelmente, não iria a nenhuma aula. Tentar impor é ridículo, querer colocar o que é certo ou errado”. Jornalista e personagem principal de um filme que está sendo produzido em Brasília, em resposta aos movimentos homofóbicos do Legislativo, Marília Serra, que mora há 13 anos com a arquiteta Vanessa Bhering, não pensa diferente. “Ignoro esse estatuto porque acho que é fora da realidade. Isso não vai passar. É uma aberração eles tentarem ignorar a existência de pessoas. Eles ignoram completamente outras realidades”.
Servidoras do Senado, Marília e Vanessa, que têm três filhos biológicos, torcem para a evolução do Estatuto da Família, um projeto do Senado que apesar de ter nome semelhante ao da Câmara, preserva a diversidade de uniões. “Não adianta querer pintar o céu da cor que eles querem. Não queremos que pintem de arco-íris, mas a sociedade contemporânea está muito diferente. Eles querem que as pessoas voltem em conceitos? O Judiciário já aprovou e está à frente do Legislativo”, afirmou.
Uma resolução do Supremo Tribunal Federal proibiu cartórios de se recusarem a habilitar ou celebrar casamento civil ou, até mesmo, de converter união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo. Ainda assim, não contemplou casos como o de Eva Raquel Desidero Alves. Advogada e empresária, integrante do movimento LGTB de Brasília e casada há dois anos e meio com a técnica em radiologia Tatiane Alves de Alcântara, Eva tem hoje uma filha de 5 meses que ela não consegue registrar no Distrito Federal.
“Estamos correndo com a papelada no civil para registrar a neném, mas não existe unificação [de lei]. Tem gente que diz que está tudo ok, mas como advogada tenho muita dificuldade. Cogitamos pegar um avião e ir para Mato Grosso registrar lá, o que é possível só com a certidão de união estável. Aqui, a gente tem que correr com a papelada de casamento civil”, disse Eva. Diante dos obstáculos enfrentados, a advogada considera o estatuto “vários pulos para trás”. Segundo ela, o texto “fecha os olhos para uma realidade” e a sensação diante do projeto é de tristeza.
O relatório será apresentado hoje às 12h10. Como é um substitutivo, o presidente da comissão abrirá prazo de cinco sessões da Câmara para apresentação de emendas. Se houver pedidos de alteração, o relator terá que apresentar novo parecer e, só depois de aprovado, como é conclusivo, o texto seguirá para o Senado. Da Agência Brasil.