Por Maíra Nery*
Nos primórdios cada homem improvisava uma cabana para se proteger da hostilidade da natureza. Situação bem diferente da atualidade – prédios imensos construídos por equipes de engenharia civil e que além da proteção podem oferecer conforto. Outra diferença é que o espaço ocupado pelo homem era comum a todos e qualquer um poderia construir sua cabana, sem distinção, atualmente uma pequena parte da população que possui recursos podem adquirir moradias dignas, nas zonas mais valorizadas e seguras das cidades ao contrário de maior parte da população que é obrigada a se acomodar em barracos, construídos nas encostas, favelas e conjuntos habitacionais e alguns, por falta de total recursos financeiros, não possuem sequer acesso a moradia.
Mesmo com o avanço tecnológico dos últimos anos que acelera a construção de grandes empreendimentos, a população carente ainda sofre com a falta de moradias minimamente dignas. O sistema capitalista e sua crueldade mantém todo avanço tecnológico, os recursos naturais a serviço do capital, sem qualquer possibilidade de uso racional dos recursos de forma que possamos ter uma distribuição justa entre todos os habitantes. Essa contradição torna-se ainda mais cruel já que por conta da especulação imobiliária existe inúmeros imóveis desocupados que poderiam ser abrigos para essa população que não tem uma moradia fixa. Em São Paulo, por exemplo, existe cerca de 290 mil imóveis que não são habitados, segundo dados preliminares do Censo 2010 e aproximadamente 130 mil famílias não têm onde morar, de acordo com a Secretaria Municipal de Habitação, ou seja, há mais casas do que família sem lar.
A crise da moradia não ocorre somente em seu aspecto quantitativo, há problemas também do ponto de vista qualitativo. Para aumentar os lucros a construção civil emprega materiais menos resistente, utilizando somente o necessário, e com os mesmos padrões estéticos. As moradias se empobreceram esteticamente, perderam conforto, sendo cada vez mais reduzidas a meros cubículos, aglomerados materiais, servindo apenas para aumentar os lucros dos capitalistas. O atual sistema imobiliário não permite que os moradores tornem os seus lares um lugar de identidade individual e transformou-se numa máquina fria de morar, sem afetividade, tornando-se apenas o local que o proprietário vai se fixar.
Essa utilização prática, voltada apenas para a funcionalidade das moradias, se estende em toda a cidade, onde se percebe os novos prédios frios, desprovidos de calor humano e sensibilidade estética, com o objetivo exclusivo para a realização das atividades que se fizerem necessárias. O mundo moderno, industrial e tecnológico, que se vale da lógica de capital para reger suas relações submeteu ao homem um processo de alienação. O homem acaba apenas atendendo as necessidades do mercado em função da produtividade e da eficácia, tornando-se alheio ao mundo que o cerca, aos problemas que a população enfrenta. Ele passa a acreditar que é apenas uma peça nesse jogo de capital, que não possui valor e nem força para se sobrepor ao mercado.
Todos têm o direito de ter uma moradia digna, segura que possibilite a qualquer ser humano enfrentar as durezas do cotidiano de forma justa. É um dever de todos lutar por esse direito. É urgente que se deva buscar formas de equacionar e combater as contradições do mundo contemporâneo. Uma sociedade sustentável deve ter como premissa as relações humanas. Uma cidade que tem mais prédios abandonados do que famílias sem lares é inadmissível. É o homem que tem que ser a peça fundamental na engrenagem do desenvolvimento social e não o mercado. A revolução tecnológica pode e deve ser usada para ajudar a sociedade e sobretudo para o bem do mundo.
*Maíra Nery é colunista do site Pátria Latina