Em janeiro de 2019, o site BNews esteve em Brasília e conversou com diversos servidores da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que relataram uma rotina recheada de incertezas diante das ameaças feitas pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) de desmontar o conglomerado de mídia. Cerca de três meses após o início do governo, as incertezas se transformaram em certezas e muita coisa mudou por lá. Um jornalista concursado, que prefere não se identificar para evitar retaliações, revela à reportagem que a censura editorial está sendo imposta dentro da empresa.
“A situação é calamitosa pra comunicação pública no Brasil, mas boa pro governo e pros militares, que agora se apoderaram de uma televisão pública para fazer propaganda proselitista do Executivo, contrariando a legislação brasileira e a Constituição Federal. O governo federal unificou oficialmente a televisão estatal [NBR] com a televisão pública [TV Brasil]. A NBR não existe mais. O governo preferiu usar a estrutura da televisão pública por ter mais audiência – é a sétima emissora mais vista do país, à frente, por exemplo, da Globo News e do SporTV. A NBR tinha baixa audiência. Assim, hoje há um telejornal inteiro do Executivo, pela manhã, além de transmissões ao vivo da agenda de Bolsonaro; programa de entrevistas com membros do Executivo e 4 programas para as Forças Armadas. Haverá um programa também sobre a reforma da previdência, apresentado pela jornalista conhecida do general Santos Cruz, hoje responsável pela EBC. Ou seja, o governo Bolsonaro se apropriou de uma estrutura de comunicação que pertencia a sociedade para fazer propaganda”, afirma o servidor.
Diferentemente do que havia sido prometido pelo governo, não foram registrados novos cortes na estatal. “Houve a alocação de mais militares em cargos de chefia, incluindo a direção geral. Também houve a colocação de uma diretora de jornalismo que assume claramente que a nova função é de unificar os conteúdos para produzir comunicação para o poder Executivo. Fala também comum do presidente da empresa”.
O jornalista também revela que “há claro direcionamento” editorial nas redações. “Recentemente, os jornalistas concursados da EBC, que passaram no concurso para fazerem jornalismo em uma empresa pública, foram censurados. Não puderam citar as palavras ‘golpe’, ‘ditadura militar’ para se referirem ao golpe de 1964. Diariamente, qualquer posicionamento minimamente contrário aos interesses do Executivo são censurados nas redações da televisão, do rádio, da agência Brasil e das redes sociais”.
Para os servidores, o risco de extinção da EBC ainda existe, mas tornou-se diminuto. “Ficou claro que os militares e o governo federal decidiram não extinguir, mas usar a estrutura da EBC para fazer propaganda. No entanto, não sabemos se, daqui uns meses, caso a popularidade do presidente não cresça, por exemplo, se não poderão simplesmente terceirizar o serviço feito pela EBC e extinguir a empresa”.
Máquina de propaganda
A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) começou a ser idealizada em maio de 2007, ainda no governo Lula, durante o I Fórum Nacional de TVs Públicas, em Brasília. A MP de criação do conglomerado foi convertida na Lei nº 11.652, em dia 7 de abril de 2018. A empresa herdou os canais de rádio e TV geridos pela estatal Radiobrás e pela Associação de Comunicação Educativa Roquette-Pinto (Acerp). E ficou encarregada de unificar e gerir as emissoras federais já existentes, instituindo o Sistema Público de Comunicação. Além disso, adquiriu como missão articular e implantar a Rede Nacional de Comunicação Pública.
No site institucional da EBC, é informado que a estatal atualmente é administrada por um Conselho de Administração e por uma Diretoria Executiva. A empresa conta, em sua composição, com um Conselho Fiscal e um Comitê Editorial e de Programação, órgão técnico de participação institucionalizada da sociedade, de natureza consultiva e deliberativa. O Decreto nº 9.660, de 1º de janeiro de 2019, já no governo Bolsonaro, vinculou a EBC à Secretaria de Governo, por meio da Secretaria Especial de Comunicação Social.
Procurado pelo site BNews, Géssio Passos, coordenador-geral do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, afirma que “a ação do governo Bolsonaro na EBC ataca diretamente a Constituição Federal e a legislação que criou a EBC, ainda em voga”. “Após os ataques de Temer, ele restringe ainda mais a autonomia da empresa publica de forma ilegal. Quer que a EBC se transforme em uma máquina de propaganda do governo”, critica.
“O Sindicato está buscando articular com movimentos sociais e com o parlamento em defesa da missão da EBC. Estamos denunciando publicamente a situação, articulando uma reação no Congresso e estudando meios jurídicos para contestar essa ação autoritária do governo”, completa. As informações foram extraídas na íntegra do site BNews.