O Ministério Público Federal (MPF) moveu três ações contra a União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em função da demora na conclusão de processos de demarcação e titulação dos territórios das comunidades quilombolas de Fazenda Grande, Cipó e Boa Vista do Pixaim, localizadas no município de Muquém do São Francisco, no oeste da Bahia.
Segundo o MPF, as terras reivindicadas são das comunidades por direito, e a demora na conclusão dos processos pelo Incra acirra as disputas protagonizadas por fazendeiros da região, em prejuízo dos quilombolas. Para o procurador da República, Rafael Guimarães Nogueira, que atua nos casos, “a União e o Incra têm adotado o comportamento ilícito de protelar as demarcações e, além disso, têm se omitido em adotar providências efetivas para proteger a posse já existente, posse que é direito de qualquer cidadão brasileiro, independentemente do procedimento demarcatório”.
“A comunidade é composta de pessoas humildes, com pouco estudo e recursos financeiros, situação que lhes confere vulnerabilidade especial. Acaso se tratassem de fazendeiros, certamente já teriam cercado toda área por eles ocupada e manejado ação de usucapião para titulação. Não é o caso. São pessoas que utilizam a área comunitariamente, sem cercas integrais, o que traz grande vulnerabilidade para os seus limites territoriais e possibilita reiteradas investidas ilícitas dos vizinhos.”, afirma o procurador em uma das ações.
A Comunidade Quilombola Fazenda Grande é composta de cerca de 180 famílias, com 785 membros que vivem em 140 casas, a comunidade reivindica o reconhecimento e a titulação de uma área de 20 mil hectares, da qual exerce a posse tradicional há mais de 300 anos.
Certificada como remanescente de quilombola pela Fundação Cultural Palmares em 2007, a Comunidade de Fazenda Grande teve seu processo de demarcação instaurado no Incra em 2008. O Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade foi finalizado desde 2017, não tendo sido analisado pelo órgão para sua publicação oficial e conclusão da demarcação das terras até o momento.
Já a Comunidade Quilombola Cipó conta com 32 famílias e 200 membros, que vivem em 26 casas, juntos exerciam a posse de uma área de aproximadamente 836 hectares há mais de um século. O MPF apurou que, desde 2004 a comunidade vem sofrendo ameaças, com parte de seu território tendo sido invadido e vendido a terceiros com o apoio de familiares de político da região.
Constituída por 320 famílias, com 1.100 membros, a comunidade Boa Vista do Pixaim ocupa 17 mil hectares há mais de 400 anos, tendo sido certificada como quilombola em 2007. Desde 2009 tramita no Incra o processo de regularização das terras, tendo órgão concluído o RTID, e voltado atrás. Em março de 2017, o Incra publicou edital com extrato do RTID já aprovado por comitê interno.
Em 2013, a comunidade passou a ser ameaçada e constrangida por Jayme Oliveira do Amor, empresário de agropecuária da região apontado como mandante da destruição de cercas, plantações. Jayme, que também responde à ação do MPF junto com a Patrimonial Nossa Senhora do Socorro LTDA, já foi preso em 2014 pela Polícia Civil, junto com dois de seus funcionários.
Nas três ações, o MPF requer a condenação da União e do Incra na obrigação de adotar todas as providências administrativas necessárias à conclusão dos processos administrativos de titulação e demarcação das comunidades remanescentes de quilombos, seguindo as etapas formais para conclusão do processo até a efetiva publicação de portarias reconhecendo e declarando os limites de cada uma das terras quilombolas.