O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro reforçou as acusações contra o presidente Jair Bolsonaro de que ele já quis interferir politicamente na Polícia Federal e disse que a atitude do mandatário de intervir na corporação por interesses próprios foi reflexo da falta de prioridade, por parte do governo federal, em implementar projetos de combate à corrupção.
Em entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo, na noite deste domingo (24), Moro elencou uma série de fatores para reclamar do pouco empenho de Bolsonaro nas propostas anticorrupção, como a retirada do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça e Segurança Pública e as recentes alianças do presidente da República com políticos do Centrão com histórico de corrupção em busca de mais apoio no Congresso, às quais ele definiu como “realmente questionáveis”.
“Recentemente, nós vimos essas alianças que são realizadas com políticos que não têm um histórico totalmente positivo dentro da história da administração pública. É certo que é preciso ter alianças no parlamento para conseguir aprovar projetos. (Mas) eu acabei entendendo que não faz sentido permanecer no governo. Até porque, qual era a minha percepção, o governo se vale da minha imagem — porque eu tenho um passado firme de combate à corrupção —, e, de fato o governo, não está fazendo isso. Não está fortalecendo as instituições para o combate à corrupção”, comentou o ex-ministro.
Moro disse que tentou permanecer no governo, apesar das intrigas entre Bolsonaro e ele a respeito da Polícia Federal, que tiveram início ainda em 2019, porque ele “tinha esperança de conseguir avançar com a agenda anticorrupção”. “Mas eu fui vendo ela sendo esvaziada, e para mim a gota d’água foi essa interferência na Polícia Federal, em particular porque a PF também investiga malfeitos dos próprios governantes”, destacou.
Para o ex-ministro, a divulgação da gravação da reunião ministerial de 22 de abril deixou muito claras as intenções de Bolsonaro em promover mudanças na PF por interesses próprios. Segundo ele, ao falar sobre “interferir” durante o encontro com o alto escalão do governo, o presidente não estava se referindo ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), visto que ela havia feito promoções no órgão semanas antes.
“Eu acho que o vídeo fala por si. Quando o presidente olha na minha direção, isso evidencia que ele estava falando desse assunto da Polícia Federal. E nós temos que analisar os fatos que ocorreram anteriormente. Ele não teve nenhuma dificuldade em alterar o serviço do GSI, inclusive do Rio de Janeiro”, analisou Moro.
Moro também revelou que se sentia incomodado pela forma com a que Bolsonaro enfrentava a pandemia do novo coronavírus à época da sua demissão, no fim de abril, e que não concordou com a saída de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde. Ele ainda opinou que Bolsonaro “tem uma posição negacionista em relação à pandemia”.
“A própria questão das substituições no Ministério da Saúde, eu acho que são absolutamente controversas. Claro que o presidente escolhe seus ministros, mas são substituições bastante questionáveis do ponto de vista técnico. Eu também me sentia desconfortável com essa gestão, com a posição do governo federal em relação à pandemia. Muito pouco construtiva”, ponderou Moro.
Ele acrescentou que não poderia permanecer em um governo no qual ele não se visse representado, tanto que as reuniões ministeriais lhe “geravam absoluto desconforto” e “não eram ambientes favoráveis ao contraditório”. “Eu acho que a minha lealdade ao próprio presidente necessita, demanda que eu me posicione com a verdade, com o que eu penso e não apenas concordando com a posição do presidente. Se for assim, não precisa de um ministro. Precisa de um papagaio”. As informações são do Correio Braziliense.