O governo federal trava uma batalha para aprovar até outubro a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso. O projeto é de autoria da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), integrante da base aliada do governo, e prevê a impressão de cédulas em papel para que se possa verificar, de forma independente, o resultado de eleições, plebiscitos e referendos. Ao site SBT News, Kicis disse acreditar que o projeto seja votado até o fim de junho. Assim, seria possível que as mudanças valessem já nas eleições de 2022.
“As chances são muito boas, por isso estamos correndo”, pontuou a parlamentar, que ainda afirmou não temer eventuais judicializações por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), que já considerou o voto impresso inconstitucional: “Acho bem mais difícil por conta da mobilização popular. Isso agora é um clamor do povo, dos eleitores brasileiros”.
O tempo, contudo, vai contra os governistas. Para que o voto impresso esteja em vigor nas eleições de 2022, a proposta precisa ser promulgada até o final de setembro deste ano.
No Congresso, parlamentares do Centrão, grupo político do qual o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) faz parte, afirmam que ele não comprará briga para que a PEC ganhe celeridade na Casa. Por se tratar de um tema controverso, segundo eles, Lira não quer se indispor com o STF, por ter ações contra ele em tramitação na Corte.
Para esses parlamentares, a determinação de Lira em instalar a Comissão Especial que analisará a PEC do impresso foi apenas uma forma de o deputado agradecer o apoio de Bolsonaro na eleição da presidência da Câmara. Cabe ao presidente da Casa decidir quais propostas serão colocadas em votação no plenário.
O especialista em representação parlamentar André Santos também aposta que o projeto não deve ser aprovado a tempo de valer no pleito do próximo ano. Isso por considerar o tema controverso, e por entender que pautas econômicas devem estar na pauta do Legislativo nos próximos meses.
“Com essa PEC, cria-se uma nova tensão e se tira o foco [das prioridades no país]”, afirma Santos, que também é sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.
A proposta
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) é um forte defensor do voto impresso e já disse reiteradas vezes que há fraudes no sistema de contagem de urnas eletrônicas. Porém, nunca apresentou provas.
A medida, no entanto, recebe críticas de especialistas, que afirmam que o atual sistema de votação é seguro. Análises indicam que a substituição das atuais urnas para modelos que imprimem votos podem trazer complicações para o período eleitoral, além de maiores custos aos cofres públicos.
O cientista político Thiago Vidal, da Prospectiva Consultoria, por exemplo, avalia que o voto impresso traria mais insegurança do que benefícios ao processo eleitoral. Além de considerar que não há garantias de que a votação e apuração dos votos possa ocorrer sem irregularidades. “Isso não muda o resultado. O que for impresso será a mesma coisa do resultado arquivado eletronicamente na urna”, diz.
“Se um presidente perde no ano que vem, ou se algum candidato perde alguma eleição, em tese, a quantidade de votos na urna vai ser a mesma quantidade de votos que vai estar no papel.”
Tramitação no Congresso
O regimento interno da Câmara estabelece que a análise de uma PEC em uma Comissão Especial ocorra em até 40 sessões. Na segunda-feira (18 de maio), o relator da Comissão, deputado Filipe Barros (PSL-PR) disse, durante a primeira sessão do colegiado, que deve apresentar o parecer da matéria até o final de julho.
Após essa fase, o projeto deve então seguir para o plenário da Câmara, onde para ser aprovado, precisa de no mínimo 308 votos favoráveis dos deputados federais, em dois turnos.
Após essa fase, a proposta segue para o Senado, onde precisará do crivo de 49 senadores, também em dois turnos. Caso as duas casas aprovem o texto sem modificações, a PEC é promulgada em sessão do Congresso Nacional. Se houver mudanças no texto da proposta — não apenas em sua redação — essa alteração demandará uma nova aprovação na Casa onde não houve a mudança.
Segurança
Na semana passada, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, saiu em defesa do processo eleitoral brasileiro. O ministro afirmou que as urnas eletrônicas são seguras e representam um marco do processo democrático contra fraudes eleitorais. Antes, “quando as urnas não correspondiam ao que os dominantes queriam, os resultados eram adulterados”, disse.
O ministro também destacou três problemas para a mudança para comprovação do voto impresso: o custo, estimado em cerca de R$2 bilhões; a possibilidade de quebra do sigilo do voto, que é garantida pela Constituição Federal; e o retrocesso em benefícios do voto eletrônico, como redução de filas.
“Em 2020, tivemos mais de 400 mil candidatos. Imagina se um percentual pequeno desse vasto universo resolver impugnar o resultado, pedir recontagem, contratar os melhores advogados eleitorais do Brasil para achar alguma inconsistência, solicitando a suspensão das eleições ou a anulação de posse? Esse é um risco que vamos introduzir com o voto impresso”, ponderou.
O que já disse o STF
Em setembro de 2020, por unanimidade, o plenário do STF considerou inconstitucional o trecho da minirreforma eleitoral de 2015 que estabelecia o voto impresso. O relator da ação, ministro Gilmar Mendes, disse no julgamento que “em vez de aumentar a segurança das votações, a impressão do registro será frágil como meio de confirmação do resultado e, pior, poderá servir a fraudes e a violação do sigilo das votações”. Matéria extraída na íntegra do SBT News.