O Ministério Público da Bahia (MP-BA) acionou a Companhia de Eletricidade da Bahia (Coelba) depois que a região da Caatinga registrou a mortandade de pelo menos 50 araras-azuis-de-lear, uma espécie rara e ameaçada de extinção. Um inquérito foi instaurado para apurar denúncias que as mortes foram provocadas por choque elétrico nos fios da rede de energia em municípios como Euclides da Cunha e Jeremoabo.
Na segunda-feira (17), promotores do órgão, representantes da companhia e entidades de proteção ao meio ambiente se reuniram para definir um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
“De dezembro pra cá, propusemos medidas imediatas nas áreas onde ocorrem mais mortes. A Coelba tem 10 dias úteis a partir de hoje [segunda-feira] para fazer uma verificação das medidas que a gente sugeriu”, afirmou a promotora de Justiça Luciana Khoury, que atua na área ambiental,.
O número de mortes contabilizadas pelas entidades de defesa ambiental leva em conta os últimos quatro anos, pois foi nesse período que agricultores passaram a informar, com frequência, que aves foram vistas mortas nas propriedades e estradas da região.
De acordo com o Instituto do Meio Ambiente Recursos Hídricos da Bahia (Inema), somente entre maio e julho de 2021, sete araras-azuis-de-lear foram encontradas mortas apenas na cidade de Euclides da Cunha.
As mortes recentes na cidade chegaram ao conhecimento do Ministério Público em novembro de 2020, junto com informações de óbitos em outros municípios.
A promotora Luciana Khoury disse que as unidades regionais de Paulo Afonso e Euclides da Cunha instauraram inquérito para apurar as ocorrências da mortandade das aves.
“Chegou a informação de mortes em Jeremoabo e em Santa Brígida. Em parceria com a Regional de Euclides da Cunha, instauramos os inquéritos e estamos fazendo as atuações conjuntas. O desafio é entender o porquê ocorre isso e como resolver”, disse.
Nessa região, as araras têm dormitórios, que são nos paredões. E elas voam pra se alimentar. Nesse percurso, quando elas pousam nos fios, é que ocorre essa eletroplessão (morte por descarga elétrica).
A Coelba argumentou que mantém acordos com o Ministério Público para contribuir com a segurança da arara-azul-de-lear nos locais em que existe maior risco de eletrocussão.
A empresa disse que durante todo o processo apresentou alternativas possíveis de modificações na rede elétrica, a exemplo da instalação de um inibidor de pouso das aves na rede, mas não obteve aprovação para implementação.
Sugestões para redução de mortes
Segundo os promotores do MP-BA e as entidades de proteção ambiental, os inibidores de pouso sugeridos pela companhia não são suficientes para evitar o contato das araras com a fiação.
A agrônoma Kilma Manso, professora da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), explica que os inibidores são frágeis para a força do bico da arara e podem ser facilmente quebrados.
Além disso, há um acúmulo de água nas cruzetas (barras horizontais que ficam na parte superior dos postes) em dias de chuva. O que também provoca a descarga elétrica nos animais ao fazerem contato com o objeto molhado.
“Os inibidores de pouso não eliminariam os riscos de eletroplessão em redes trifásicas, pois as araras ficam empoleiradas também nos fios, que são próximos entre si. Assim, caso uma arara esteja em um fio e outra ave no outro, caso elas se toquem, ambas sofrerão uma forte descarga elétrica e morrerão”, diz a pesquisadora.
O MP-BA sugeriu que a empresa amplie a distância entre os fios e faça uma troca de postes por outros com espaçamento maior entre o concreto e a fiação. Desse modo, é possível evitar que as aves façam contato entre dois fios, ou entre o fio e o poste.
Espécie rara e ameaçada de extinção
Paulo Afonso, Santa Brígida, Euclides da Cunha, Monte Santo, Sento Sé e Campo Formoso, nas regiões norte e nordeste da Bahia, são as cidades onde há maior incidência da arara-azul-de-lear. A Caatinga baiana é o único lugar do mundo onde a ave pode ser encontrada. Além disso, são indivíduos monogâmicos – ou seja, com a morte do parceiro, o casal deixa de se reproduzir.
“Essa espécie está em perigo de extinção. Requer muito cuidado porque cada morte é muito séria. É uma questão complexa que envolve atuação de todas as partes, Ministério Público, Coelba, ONGs e sociedade civil. É uma demanda prioritária e que devemos valorizar todos os casos de uma arara que morre”, disse Khoury.
Elas se alimentam basicamente de licuri e os deslocamentos na região podem ter 60 km de distância em busca de alimentos. O que, com poucas árvores na região, propicia o pouso em fiação da rede elétrica. Com informações do g1 Bahia.