Morro do Chapéu, município baiano localizado na região da Chapada Diamantina, pode passar a ser referência não apenas pela sua beleza natural. A cidade, que fica a aproximadamente 400 quilômetros de Salvador, é o cenário de pesquisas sobre o cultivo de uvas especiais para a vinificação. Quatorze mil metros é o espaço destinado à plantação da fruta na Unidade de Observação de Viticultura e Frutíferas Temperadas, que nesta semana iniciou a terceira etapa da colheita.
A unidade é resultado de três convênios firmados nos anos de 2010, 2012 e 2013 – nos valores de R$ 128 mil, R$ 180 mil e 162 mil, respectivamente – entre a Associação de Criadores e Produtores de Morro do Chapéu, o Governo da Bahia, por meio da Secretaria da Agricultura (Seagri), e a prefeitura municipal, sendo o projeto executado pela Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), vinculada à Seagri.
O observatório é uma espécie de laboratório a céu aberto, onde o desenvolvimento de dez variedades de uvas francesas (pinotnoir, cabernetsauvignon, petitverdot, tannat, malbec, merlot, syrah, sauvignonblanc, chardonnay e muscatpetitgrain) é acompanhado por técnicos agropecuários.
Conhecimento e tecnologia
Após o período de colheita, os cachos são encaminhados às fábricas para transformação em vinho. Posteriormente o produto é avaliado pela Embrapa Semiárido – empresa de inovação tecnológica focada na geração de conhecimento e tecnologia para a agropecuária – para que depois de alguns experimentos decida se Morro do Chapéu tem condições de plantio e colheita dessa fruta, certificando ou não que a terra é adequada para produção de qualidade.
“Em primeiro lugar, para fazer a colheita, se faz a medição do brix – o coeficiente do açúcar da uva. Caso seja constatado que o mesmo apresenta teor ideal, convocamos equipes de agricultores para colherem a fruta. Em seguida, os cachos [de uva] passam por limpeza e são colocados em recipientes esterilizados. Só depois vão para as vinícolas para a fabricação do vinho”, explica Lejonilson Valois, técnico agropecuário.
Para o presidente da Associação de Criadores e Produtores de Morro do Chapéu, Odilésio Gomes, as condições climáticas do município baiano devem contribuir para o desenvolvimento de nova atividade econômica. “Não temos temperatura nem muito alta nem muito baixa. Isso deve nos beneficiar na produção de vinhos de excelente qualidade. Morro do Chapéu vem caminhando para se tornar um dos polos do enoturismo no Brasil e na Bahia”.
Mesmo que a maior parte da Unidade de Observação seja destinada para as uvas, o local também reserva espaço ao cultivo de outras frutas. São 500 metros quadrados para a plantação de quatro tipos de frutas tropicais. De cada tipo há quatro variedades – ameixa, pêssego, maçã e pêra, que também são avaliadas pela Embrapa.
Agricultura familiar
Os incentivos do governo do Estado, com a facilitação de algumas atividades no semiárido baiano e, consequente valorização das atividades da agricultura, atraíram a atenção de agricultores familiares de outras partes da Bahia. O baiano descendente de japonês, Akimitsu Abe, que tinha experiências com frutas temperadas, trouxe a esposa e os dois filhos para Morro do Chapéu.
Hoje ele mora em um sítio e vive do que produz. Nos seus 15 hectares de terra, onde são plantados ameixa, goiaba, alface e banana, o destaque fica por conta da produção de morangos. Dois hectares são destinados apenas a essa fruta, que representa o maior ganho do agricultor.
“O morango está sendo a principal cultura, pois nos dá faturamento semanal e permite ter recursos para pagar os funcionários, enquanto acontece o desenvolvimento de outras culturas. Hoje a gente está colhendo cerca de 1.200 caixas de morango por semana. Cada caixa com o preço de R$ 3,50, o valor mais barato do ano”, diz Abe.
São ao todo oito trabalhadores sem contar com Akimitsu e a esposa. As tarefas são dividas desde o plantio até o empacotamento das frutas. No fundo do terreno, as caixas ficam organizadas para serem entregues aos compradores. Apesar do pouco tempo de atividades no local, já é possível mensurar resultados.
“Passei um tempo desempregada, mas hoje posso ajudar meu marido nas despesas, comprar coisas melhores e cuidar do meu filho. Estou muito feliz em ter um emprego certo”, conta Nilma Barbosa, agricultora que trabalha na equipe de Abe.
Solo fértil para empresas privadas
A oportunidade de expandir os negócios no setor da agricultura foi o que trouxe o empresário Cid Baylão de Carvalho à região. Com ele, veio a Baylão Agronegócio (BAN), empresa goiana que, em pouco mais de um ano realizando atividades na Bahia, já garantiu quase 100 empregos.
“A gente veio para plantar tomate e aproveitar a demanda de mercado, e não imaginava que teria toda essa responsabilidade social. Estamos gerando muitos empregos na região e fazendo a diferença na vida de muita gente aqui”, afirma Carvalho. Ele recorda que ao chegar em Morro do Chapéu percebeu que tinham muitas pessoas precisando trabalhar. “Em pouco tempo a situação melhorou. Hoje a empresa não é mais nossa, é de toda a comunidade”.
As 200 toneladas de tomate produzidas por mês são levadas para a sede da empresa, em Goiás, num caminhão refrigerado. De lá é distribuído para o Centro Sul do país – Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e até o Rio Grande do Sul. No Nordeste, as operações comerciais estão sendo iniciadas na Bahia, Pernambuco e Alagoas. A expectativa é que, até meados do próximo ano, passe a atender toda a região.
Para que a BAN tenha condições de se expandir em território baiano e garantir mais empregos, o Governo do Estado promoveu a facilitação de acesso à empresa e a extensão do serviço de energia elétrica até o local. Pela instalação completa, a Baylon já investiu mais de R$ 2 milhões, entre construção do espaço e compra das máquinas, das quais duas já estão em funcionamento – a classificadora, responsável pela limpeza e separação dos tomates por tamanho, e eticadora, que como o nome sugere coloca as etiquetas no produto.
Comunidades quilombolas
A maioria dos funcionários é de comunidades quilombolas que já vivem outra realidade, com carteira de trabalho assinada e renda familiar fixa. “Minha vida mudou completamente. Antes eu e minha família passávamos por necessidades básicas. Chegamos até a pensar em ir embora, mas ao saber da vinda da empresa para a região, fiz uma última tentativa, que deu certo”, conta Val Divino, agricultor e funcionário da empresa.
Ele diz que está trabalhando com carteira assinada e conseguiu empregar a esposa. “Estamos conseguindo realizar alguns sonhos como o da casa própria. Já, no mês que vem, devemos deixar o aluguel e passar a morar na casa em que construí com o dinheiro do meu trabalho”.