Foi na Copa de 94. Foi meu primeiro namorado, primeiro tudo. Teve muitas coisas boas durante o casamento, mas umas coisas que foram muito pesadas. E o Breno foi quem sentiu mais, com certeza. Porque o Breno ficava assim: ‘eu não quero escolher meu pai, eu não quero escolher minha mãe, eu não quero escolher nenhum dos dois, vou falar para o juiz que eu quero os dois’, ele falava isso o tempo todo”, lembra a professora Rosângela Ferreira, mãe do Breno. “A gente curtia jogos da Copa do Mundo juntos, na mesma rua, amigos em comum. Depois, trâmites normais: noivado casamento, tudo certinho. Ela chegou a conclusão que não gostava mais. Não foi fácil no começo. Ou ficava comigo, ou ficava com ela”, lembra o funcionário público Cláuber Ferreira, pai do Breno.
O desejo do Breno pode virar regra. O Senado vai votar um projeto de lei que determina: se um casal se separa, a guarda do filho não é de um nem do outro – ela é sempre compartilhada. Ou seja: o casal divide a responsabilidade por todas as decisões tomadas em relação às crianças. Hoje, essa é a realidade de menos de 5% dos casais separados no Brasil. Os juízes tendem a dar guarda compartilhada em casos de separação amigável. Mas às vezes o processo toma outro rumo. “Hoje eu sou a maior inimiga dele. É muito triste. Eu não queria que tivesse sido assim. Mas tomou um rumo que hoje eu não tenho… É difícil”, diz uma mulher.
Há oito anos eles brigam na Justiça. “Em oito anos, eu nunca tive um pernoite. Um dia, eu tive que ir escondido na escola levar um ovo de Páscoa, era Páscoa. Na época, a minha filha tinha 6 anos de idade, 5 anos de idade, e fazia mais de três, quatro meses que eu não via minha filha. Quando ela entrou no corredor para eu entregar o ovo de Páscoa, eu não consegui ficar em pé. Comecei a tremer, comecei a ficar muito emocionado”, conta o pai. Quantos motivos podem fazer do fim de um casamento um rompimento sem volta, uma impossibilidade de duas pessoas que se amaram continuarem a conviver. “Foi um divórcio, uma separação muito ruim, para destruir mesmo”, conta uma mulher.
Fantástico: E se vocês tivessem que entrar em acordos agora, por exemplo, sobre a educação das crianças?
Mulher: Eu acho que no nosso caso não daria certo.
“Não adianta só imputar guarda compartilhada e está acabado. Porque o compartilhamento das responsabilidades requer que as partes entendam como isso vai acontecer, como deve ser essa convivência”, explica a juíza Maria Cristina de Brito Lima. “Acho muito pouco provável que colocar no texto da lei que agora a guarda será sempre compartilhada não causará conflito entre o casal, isso é uma utopia. Porque as pessoas têm criações diferentes, opiniões diferentes e não necessariamente um pai vai concordar com o mesmo pensamento que a mãe”, avalia o advogado João Paulo Lins e Silva.
“Na verdade, o que se vai partilhar é a convivência dos pais com aquela criança em benefício da criança, ou do adolescente”, diz a juíza. O esquema que os pais do Breno combinaram por conta própria é uma guarda compartilhada. Eles dividem toda a rotina dos filhos. E o Breno e a irmã só precisam cruzar o corredor do prédio. O Cláuber se mudou para um apartamento no andar da Rosângela. “No começo, eu até me preocupei se seria um corre-corre para lá e para cá, só que eu acabei me surpreendendo. Se encaixou muito bem. Até por que a gente fica geralmente na casa que a gente dormiu na noite anterior”, conta Breno Ferreira, de 12 anos.
“O que a gente está vivendo agora, a tranquilidade e a paz que meus filhos sentem não têm preço. O que a gente passou de insegurança no início, o tempo para adequar, vale a pena”, avalia a professora Rosângela Ferreira, mãe do Breno. “A criança acaba se acostumando. Eu nunca ouvi deles assim: ‘na casa da minha mãe, pode’. Não, nunca ouvi, porque eles sabem que lá tem as regras de lá, aqui tem as regras de cá”, diz o funcionário público Cláuber Ferreira, pai do Breno. Um pouco de jogo de cintura também ajuda. “Essa semana ficou mais com o pai, então fim de semana quer dormir: ‘poxa, pai, hoje queria dormir abraçadinho com a minha mãe’. Liga para ela, se ela for ficar em casa, não tem problema”, conta o pai.
Fantástico: Então, tem que ser de um jeito civilizado.
Pai do Breno: Exatamente. Em prol das crianças.
“A guarda compartilhada indica o seguinte: ‘olha, convivam como se estivessem casados, talvez não com a mesma regularidade, mas com a mesma responsabilidade’”, explica o advogado Luiz Fernando Gevaerd. “Eu com o Cláuber, a gente não convive socialmente não. A gente se fala, lógico que em festa das crianças, a gente faz junto, divide as festas. Mas eu frequentar a casa dele e ele frequentar a minha também, não. Aí já é demais! Não cheguei nesse patamar de evolução. Vou chegar ainda”, ela brinca. Extraído do site do Fantástico (Globo.com).