O administrador José Carvalho, integrante do Grupo Tortura Nunca Mais-BA, depôs nesta segunda-feira (9) na Comissão Estadual da Verdade (CEV-Bahia) sobre o caso da queima, na Base Aérea de Salvador, de prontuários, fichas e relatórios produzidos por órgãos de informação das Forças Armadas durante a ditadura militar. Segundo ele, os papéis – alguns com carimbo do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) – foram queimados em 2004, numa rampa de veículos na Base Aérea, e os que foram recuperados estão com o Grupo Tortura Nunca Mais, que enviou cópias a diversas entidades. “Na época, a Base Aérea de Salvador disse pela imprensa que os papéis não foram queimados lá”. Nos papéis recuperados há nomes de presos políticos, uma entrevista do então abade do Mosteiro de São Bento, Dom Timóteo Amoroso, e notícias sobre o cardeal Dom Avelar Brandão, entre outros documentos. O professor Joviniano Neto, integrante da comissão, ressaltou que “este caso revela um dos poucos lugares do Brasil, onde documentos foram queimados dentro de um espaço público”.
Denúncia na TV
Dois trabalhadores que faziam o desmanche de hangares na Base Aérea de Salvador descobriram os papéis queimados, numa rampa destinada a troca de óleo de veículos, em março de 2004, segundo o depoimento de José Carvalho. Os papéis eram levados numa carrocinha puxada por um trator. Ele contou que alguns papéis não incinerados e fragmentos dos documentos foram recolhidos pelos trabalhadores e levados ao deputado Daniel Almeida, de quem José Carvalho era assessor parlamentar. Ele contou que conseguiu, em companhia de dois trabalhadores, entrar na Base Aérea e, com um celular, tirou fotos da rampa ainda com muita fumaça e conseguiu colocar outros papéis num saco plástico, que foram levados para o Tortura Nunca Mais. Disse ainda que a Rede Globo se interessou pelo assunto e solicitou o envio dos originais. Um repórter veio a Salvador, conseguiu entrar na Base Aérea, filmar a rampa, e a denúncia saiu no programa Fantástico, em dezembro de 2004.
José Carvalho disse que uma comissão de deputados foi até a Base Aérea, onde viram a rampa de veículos toda limpa, mas ainda com cinzas ao lado, e mais adiante uma pilha de papéis com quase um metro de altura para serem queimados. A comissão identificou, na parte de cima, papéis administrativos, como escala de trabalho, mas foram impedidos de examinar o resto da pilha. Segundo ele, a comissão de deputados pediu que os papéis fossem recolhidos pela Polícia Federal e que o caso fosse apurado. “Não se teve mais notícia desses papéis”, contou. Carvalho também citou que os dois trabalhadores, autores da denúncia, foram muito perseguidos e um deles chegou a se mudar da Bahia diante das pressões que vinha sofrendo. Disse ainda que o comandante da Base Aérea na época foi transferido. “Acredito que o trabalho da Comissão Estadual da Verdade vai contribuir para resgatar a verdadeira história”.