Em meio a resistência para votar projetos do governo, a Câmara dos Deputados começa a semana com a pauta trancada por quatro medidas provisórias (MPs) e por dois projetos com urgência constitucional. A votação dos temas enfrenta a resistência do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PDMB-RJ), e de parlamentares da oposição. Desde a aprovação da admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o presidente da Casa tem afirmado que o governo “deixou de existir” para os deputados e que dificilmente a Câmara votará projetos enquanto o Senado não decidir se aceita ou não a denúncia, o que, em caso positivo, provocaria o afastamento de Dilma por até 180 dias.
A primeira MP a trancar a pauta trata da autorização a seguradoras e organismos internacionais para oferecer o Seguro de Crédito à Exportação (SCE), que serve como garantia ao exportador contra o não pagamento dos produtos pelo importador. A intenção é ampliar a quantidade de agentes que podem oferecer esse tipo de seguro à venda de produtos brasileiros no exterior, atualmente concentrado no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Outra medida aguardando posicionamento dos deputados concede à União autorização para uso do superávit financeiro das fontes de recursos decorrentes de vinculação legal existentes no Tesouro Nacional para pagamento de despesas primárias obrigatórias, entre elas o pagamento com pessoal, benefícios previdenciários e assistenciais, Bolsa Família e ações e serviços públicos de saúde no exercício de 2015.
Produtores rurais
De acordo com nota técnica da Consultoria de Orçamento do Senado, o superávit financeiro das receitas vinculadas no fim do exercício de 2014 alcançava aproximadamente R$ 216,5 bilhões. As demais medidas que trancam a pauta dizem respeito à renegociação de dívidas de produtores rurais e de caminhoneiros e repasse de R$ 316,2 milhões ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para o pagamento de parcelas do Benefício Garantia-Safra a agricultores familiares do Nordeste.
Além das MPs, dois projetos de lei com urgência constitucional aguardam a deliberação da Câmara. O primeiro, o (PL 4495/16), do Poder Executivo, trata da criação de fundos para o pagamento de precatórios. O segundo (PL 4625/16) é relativo às atividades relacionadas aos agentes auxiliares do comércio (armazéns gerais, leiloeiros, tradutores públicos e intérpretes comerciais), para desburocratizar a atuação nesses ramos de atividades.
Aumentos
Apesar do cenário de crise, há a possibilidade de os deputados votarem a aprovação de projetos que aumentam os salários do Judiciário, Ministério Público da União e de carreiras do Legislativo. Mesmo com a pauta trancada, os projetos podem ser analisados em sessões extraordinárias. O projeto de Lei (PL 2648/15), do Supremo Tribunal Federal (STF), aumenta os salários dos servidores do Poder Judiciário em até 41,47%, de janeiro de 2016 a julho de 2019. A proposta teve sua urgência aprovada na semana passada.
Além desse, também consta da pauta da Câmara o pedido para aprovação da urgência dos projetos que aumentam os salários de carreiras do Poder Legislativo (Pls 2742/15, 2743/15, 4244/15 e 7926/14), do Ministério Público da União (PL 6697/09) e do PL 2646/15, que reajusta os subsídios pagos os ministros do STF.
Tocha olímpica
Antes da definição sobre votação dos itens que trancam a pauta, os deputados receberão a tocha olímpica, na manhã de terça-feira (3). A tocha chegará ao país por volta de 5h e percorrerá 105 km no Distrito Federal, sendo 45 km nas mãos de 143 condutores. A passagem da tocha pelo Congresso está marcada para as 10h. O trajeto termina às 20h30, com uma celebração na Esplanada dos Ministérios.
Comissões
A semana na Câmara também será marcada pela instalação das comissões técnicas permanentes. Com mais de três meses de atraso, os colegiados serão instalados na terça-feira com a escolha de seus presidentes e relatores e já devem começar os trabalhos no dia seguinte (4).
A formação das comissões deveria ter ocorrido no início do ano, mas dúvidas sobre o rito do processo do impeachment da presidente Dilma Rousseff, definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), acabou esbarrando nas regras de indicação por chapa oficial ou avulsa para composição da comissão especial que analisou a admissibilidade do pedido. Isto levou o presidente da Câmara a questionar o impacto da decisão sobre as comissões permanentes.
Mas o principal motivo para adiamento no funcionamento dos colegiados foi o troca-troca aberto com a janela partidária, encerrado no dia 19 de março. A janela possibilitou que as migrações ocorressem sem que houvesse punição para os parlamentares.
Mulheres
A mudança abriu caminho para aprovação, na semana passada, por 256 votos a favor e 153 contra, de um projeto de decreto legislativo para que a distribuição das comissões fosse feita conforme o novo desenho partidário, modificando a regra anterior, que determinava a distribuição das comissões obedecendo ao tamanho das bancadas do início da legislatura, em 2015.
Em outra votação, o plenário também aprovou a criação de duas novas comissões: a de Defesa dos Direitos da Mulher e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa. A votação foi marcada por polêmicas. Deputadas feministas criticaram as mudanças nas atribuições da Comissão da Mulher, que “perdeu” para a Comissão de Seguridade Social e Família o direito de tratar de temas como o dos “nascituros”. Houve bate-boca e Cunha chegou a ser chamado de golpista pelos parlamentares inconformados com as mudanças.
Processo
Com a alteração nas comissões, também ficou definido que os suplentes nas comissões devem ser do mesmo partido do titular e não do bloco parlamentar, como ocorre hoje. As mesmas regras valerão para o Conselho de Ética. Como este colegiado analisa hoje o processo contra o presidente da Casa, os deputados decidiram que, no caso do conselho, as mudanças só ocorrerão a partir de fevereiro de 2017, evitando qualquer influência sobre a relação de forças na análise do futuro de Eduardo Cunha.
O processo contra Cunha já se arrasta há seis meses no colegiado sem sinal de um desfecho próximo. Na terça (26), em depoimento no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, confirmou o repasse de dinheiro oriundo do esquema de propina na Petrobras a Cunha. Baiano disse ter repassado pessoalmente R$ 4 milhões em espécie, entre 2011 e 2012. Da Agência Brasil.