União da população e atenção dos órgãos estaduais e federais para o combate aos incêndios florestais na Chapada Diamantina. Foi assim que brigadistas voluntários da região descreveram, em síntese, o que precisa para evitar o alastramento das chamas e a perda de hectares de vegetação dentro e fora do Parque Nacional. Dois combatentes que acompanham as ações na região chapadeira, o presidente dos Combatentes de Incêndios Florestais em Andaraí (Cifa), Homero Vieira, e o brigadista Marcos Freitas Dutra, mais conhecido por ‘Cocão Kaya’, de Barra da Estiva exaltam a atuação dos voluntários. Eles também criticam a falta de um plano de combate, e pedem a disponibilidade de uma aeronave na região para atuar nos focos.
“Todos os anos é a mesma coisa. Não podemos tirar vantagem política em cima dos incêndios florestais. Desde de 2015 que o governo faz propaganda sobre o programa ‘Bahia Sem Fogo’, mas o que vemos é a cada ano uma ‘Bahia com mais fogo’. O governo divulgou com direito a fogos de artifícios na imprensa os milhões que estava investindo em aeronaves e EPIs [Equipamentos de Proteções Individuais, saiba mais aqui]. Agora, com certeza, começaram a aparecer. Distribuindo equipamentos e contratando aeronaves. Jogo político asqueroso”, dispara Homero Vieira.
De acordo com Vieira, os envolvidos “ao que parece, esperam a situação ficar crítica para poder aparecer nas fotos como os salvadores da pátria. Atitude maquiavélica. Tire tudo do povo. Depois dê-lhe migalhas e o povo ficará grato. Felizmente não caímos mais nessa. Atuamos como podemos e contemos boa parte dos incêndios, mesmo sem equipamentos ideais para combate. Muito triste tudo isso. Apenas com o apoio da prefeitura e da comunidade conseguimos conter dois focos em pouco tempo. A única resposta que poderemos dar a essa atitude maquiavélica do nosso governo em relação aos incêndios será nas urnas em 2018”, completa Homero.
Também em contato com o Jornal da Chapada, o brigadista Marcos Freitas Dutra (Cocão) fez um histórico dos focos na região e alertou para o fogo que consome a região da Chapadinha, dentro do Parque Nacional da Chapada Diamantina [entre os municípios de Ibicoara, Itaetê e Iramaia], que queima desde o último sábado (21). “Para você ver como é a vida dos brigadistas, está rolando esse fogo na Chapadinha. Já está rolando há mais de três dias, sem suporte aéreo nenhum. Me coloquei à disposição para ajudar o pessoal de Ibicoara, para ir à região do Rumo [Itaetê] ajudar no combate, mas não consegui transporte”, declara Cocão Kaya, que ainda aponta que os brigadistas encontram pouco apoio para o combate imediato e não vêem expectativa de melhora.
“Como a gente vai ter perspectiva se o secretário da Sema em entrevista diz que a gente tem que se conformar com os incêndios florestais como uma coisa natural, que perspectiva a gente vai ter? E a sociedade está entendendo? As brigadas, as secretarias de meio ambiente, e o poder público local têm de dialogar. Só vamos conseguir mudar essa realidade quando o diálogo acontecer. A gente tem quase 70% de toco do cerrado baiano destruído, onde boa porcentagem desse valor é irreparável. Como não estamos vendo isso? Como o povo, a sociedade não está vendo isso? Como os órgãos e o estado não vêem isso? Será que somos nós os brigadistas malucos ou o estado um covarde?”, dispara Cocão. “Acredito na nossa união. A união de todas as brigadas da Chapada Diamantina. Precisamos nos unir. Quanto mais juntos, mais fortes nos tornaremos”.
Histórico e investimentos
De acordo com os brigadistas, o incêndio entre 2015 e 2016 foi catastrófico para a Chapada Diamantina. O combate no Morro Branco, em dezembro de 2015, teve a ação para conter o fogo no Morro Branco, no Vale do Capão, em Palmeiras. E teve todo um trajeto complicado, difícil, por que os brigadistas subiam, e tiveram que fazer as trilhas cansativas. “Nisso a gente gastava uma hora e meia, duas horas para chegar ao morro. Quando chegamos em cima do morro a gente teve que andar mais duas ou três horas para encontrar água. Na maioria dos locais que a gente encontrava água eram buracos que a gente tinha que ficar um por cima do outro, com uma garrafinha de refrigerante para encher as bombas”, salienta Cocão em entrevista.
Segundo o brigadista de Barra da Estiva, quase uma hora se gastava para encher quatro bombas. Para depois andar mais duas horas para chegar até o foco de incêndio para combater. “Então andávamos cinco horas no Morro Branco. Dentro desse período várias vezes a aeronave sobrevoava a gente. A aeronave deixava bombas de água para um grupo que estava a cinco quilômetros da gente. A galera com churrasquinho e cerveja, acampamento montado. E o helicóptero dando suporte a eles, e a gente andando o dia todo para encontrar água para ir para o combate. Não sei se a gente tem alguma perspectiva de mudança em relação a esses incêndios, porque o estado não tem logística nenhuma de combate”.
Os brigadistas também criticam o modo como funcionam os investimentos do governo estadual, via Secretaria de Meio Ambiente. “É simples mandar um Hércules do Exército. Pagar R$ 50 mil, R$100 mil por hora para mandar o Hércules para a Chapada para jogar água acima de 12 mil pés. Sendo que essa água jogada de uma altura dessa não apaga o fogo, porque ela vai se espalhar. O fogo não é combatido. Assim você vê a logística desse governo, a logística do ‘Bahia Sem Fogo’. O governo, o Estado, é o principal culpado, o principal causador desses incêndios é o Estado, porque o Estado não investe. O Estado gosta de maquiar as coisas”.
E não foi só o governo estadual que recebeu a bordoada dos brigadistas. O governo federal também foi criticado. “Esse governo é irresponsável, é negligente, é culpado por esses incêndios florestais na Chapada Diamantina. Não só na Chapada, mas no Brasil em geral. No governo a gente tem uma bancada ruralista do agronegócio, do agrotóxico. Então é essa galera que está comandando. Então a gente não tem perspectiva de melhora enquanto a gente tiver um estado que ao invés de nos defender, defender o povo, fazer pelo povo, faz pela elite, pela minoria, pelo corporativismo, pelo capital”.
Jornal da Chapada