Na última terça-feira (17), a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou que documentos copiados do “setor de operações estruturadas” da Odebrecht não foram adulterados. Os arquivos foram utilizados para sustentar que a construtora doou R$12 milhões ao ex-presidente Lula como forma de suborno. A quantia seria utilizada para compra do terreno do Instituto Lula.
A manifestação da PGR contraria declarações feitas pelos próprios peritos da Polícia Federal que analisaram o material. A admissão de que os dados podem ter sido adulterados consta de uma conversa, gravada no dia 30 de setembro de 2019, entre os peritos da Policia Federal (PF) e Cláudio Wagner, indicado pela defesa de Lula para apresentar um laudo complementar sobre os arquivos.
Para o perito criminal, Roberto Brunori Junior, da PF, ao contrário do que o Ministério Público sempre afirmou, os dados foram colhidos com a Odebrecht, e não extraídos diretamente dos servidores da construtora na Suíça. “Agora só um parêntese aqui, já que está gravando, um parêntese, de cabeça, lembrando, não é certeza, a Odebrecht recebeu [os documentos] da autoridade suíça e ela abriu isso, e mexeu nisso, durante muito tempo ficou com isso lá”, afirma.
Ainda de acordo com o perito de PF, ficou comprovada a existência de arquivos “gerados pela Odebrecht” que possuem “datas posteriores às apreensões” do material. Outro perito da PF. Aldemar Maia Neto, afirma não se importar com a origem dos arquivos. “Pra gente isso é indiferente. Pra gente o que interessa é o que a gente recebeu. O que a gente recebeu tá constando no laudo. O que foi colocado ali.”
Os dois peritos da PF assinaram um primeiro parecer referente aos documentos. Outro que também ratificou o laudo, foi Rodrigo Lange, que atualmente trabalha no Ministério da Justiça e Segurança Pública, pasta chefiada por Sergio Moro. Já o perito indicado pela defesa de Lula, no parecer complementar, apontou irregularidades nos arquivos da Odebrecht.
Cláudio Wagner, na ocasião, constatou que o código hash do material não foi indexado. O código é considerado uma espécie de impressão digital eletrônica do dado coletado e é utilizado para comprovar se determinado arquivo bate com a versão original. Para a defesa, como não há comprovação de que os documentos recebidos vieram diretamente dos servidores na Suíça, não é possível utilizá-los como evidência, uma vez que estaria caracterizada a quebra da cadeia de custódia, ou seja, da documentação que assegura a lisura das provas apresentadas.
Acordo de leniência
A perícia indicada pela defesa de Lula ocorreu após os advogados tentarem sucessivamente, desde 2017, acessar aos autos do acordo de leniência assinado entre Odebrecht e Ministério Público. A solicitação foi negada três vezes pelo então juiz Sergio Moro sob o argumento de que a entrega poderia prejudicar outras investigações em andamento. “Não há necessidade de acesso aos próprios autos do processo de leniência”, disse.
O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Luiz Edson Fachin também indeferiu o pedido por considerar que não houve “ilegalidade flagrante” nas decisões de Sérgio Moro. Ele autorizou, no entanto, que o laudo complementar fosse feito.
Sem base científica
O advogado de Lula, Cristiano Zanin, disse que a manifestação da PGR “não tem qualquer base científica e não contribui para o esclarecimento da verdade”. Ainda segundo Zanin, “a defesa do ex-presidente reafirma, com base em análises técnicas sólidas, que houve quebra da cadeia de custódia nos arquivos entregues pela Odebrecht ao Ministério Público Federal (MPF) e que, diante disso, esse material não tem qualquer valor forense”.