Alguns físicos questionam o modelo e argumentam que talvez o Big Bang não teria acontecido como se acredita. Este é o caso do físico teórico sul-africano Neil Turok, diretor emérito do Perimeter Institute for Theoretical Physics, no Canadá. A principal teoria científica sobre o surgimento do universo é a de que tudo começou com o famoso Big Bang, uma enorme explosão de toda a matéria há 13,8 bilhões de anos.
Logo, o Big Bang deu início ao espaço e ao tempo e, por força dessa explosão inicial, o universo está em expansão até hoje. Mas o físico teórico, como outros também da área, não acredita nesta teoria, pois suas ideias, além de questionar o trabalho de vários de seus colegas, levantam questões existenciais que vão além da astronomia.
“O Big Bang é o maior enigma da ciência”, diz Turok em conversa com a BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC. “Há evidências suficientes para nos convencer de que houve um Big Bang, mas ele é um mistério… não conhecemos seu mecanismo.”
Na visão de Neil Turok, a teoria do Big Bang que existe hoje “está incompleta”. Turok trabalhou ao lado de Stephen Hawking tentando desvendar mistérios do início do universo, mas diz que os cálculos em que trabalharam juntos “tinham falhas e eram inconsistentes”.
O físico sul-africano reconhece que faz parte de uma minoria, mas propõe uma visão diferente do Big Bang. Ele também vai contra modelos e experimentos que sugerem que vivemos em um universo complexo e que, para explicar como funciona o universo, agregam cada vez mais ideias novas sobre partículas, dimensões extras ou campos invisíveis.
Em contrapartida, sua visão é a de que o universo é “extremamente simples” e que não é necessário sugerir novos modelos ou novas partículas para explicá-lo. “Estamos nos afogando em teorias”, diz ele. “O universo é incrivelmente econômico. Ele tem alguns princípios e os usa continuamente.”
Universo espelho
A teoria mais aceita do Big Bang diz que toda a matéria e energia existentes se concentravam em um ponto e que uma poderosa explosão fez tudo o que existe – o universo – se expandir em bilhões de vezes seu tamanho original. Com isso, surgiram o tempo e o espaço como os conhecemos.
Então, à medida que continuou a se expandir e esfriar, o universo deixou de ser uma sopa densa e fervilhante de partículas, e foram formados os aglomerados de matéria dos quais as estrelas e galáxias são feitas.
Segundo o modelo, a partir disso, o universo continuou a se expandir, e continuará a se expandir até que um dia, daqui a bilhões e bilhões de anos, tudo esteja tão disperso que ele se tornará um espaço frio e inativo.
De acordo com essa explicação, o tempo inevitavelmente avança e sempre vemos mais matéria do que antimatéria.
Desafiando essa visão, Turok diz que o problema, de acordo com a sua teoria, é que essa concepção do universo viola um princípio de simetria da mecânica quântica, que diz que as leis da natureza permanecem invariáveis mesmo sob transformações locais das coordenadas espaço-tempo.
A proposta de Turok é que o Big Bang também deu origem a um “universo espelho”, onde governam nossas mesmas leis da física, mas ao contrário. É um “antiuniverso” onde o tempo corre para trás e a antimatéria é dominante, o que dessa forma, a simetria seria cumprida.
Segundo o físico, embora pareça mais complexo, esse mecanismo é uma explicação mais simples do que aconteceu nos primeiros momentos do universo. Pois, segundo ele, elimina a possibilidade de que existam multiversos ou dimensões extras — que são hipóteses até agora não comprovadas, mas utilizadas para explicar vários fenômenos astronômicos.
O modelo do universo espelho também oferece uma explicação para a matéria escura. A matéria comum, que podemos ver e tocar, constitui apenas cerca de 5% da matéria do universo. O resto corresponde a uma misteriosa matéria escura sobre a qual pouco se sabe e que pode ser feita de uma partícula até hoje desconhecida.
No entanto, ele afirma que não é necessário pensar em novas partículas hipotéticas para explicar a matéria escura. Sua teoria prevê que o Big Bang produziu um grande número de “neutrinos destros”, um tipo de partícula que ainda não foi observada, mas que os físicos acreditam existir.
De acordo com o modelo do universo-espelho, a matéria escura é feita de “neutrinos destros”. “Neste universo duplo gerado pelo Big Bang, você pode calcular quantos desses ‘neutrinos destros’ deveria haver no universo atual, e esse número corresponde ao quanto de matéria escura deve existir”, disse Turok.
“Desta forma, chegamos à explicação mais simples para a matéria escura, que não requer nenhuma nova teoria”, completa.
Simplicidade
“O universo é a coisa mais simples do universo”, disse Turok, em uma palestra apresentando as a teoria. A sua fala é dizendo que não é a favor de adicionar novas partículas, novos campos, novas dimensões no estudo da física e da cosmologia.
“A área em que trabalho já foi responsável por milhares de modelos e conceitos, mas agora a natureza está nos mostrando que é extremamente simples”, diz o físico. “Não há evidências dessas novas adições que pessoas como eu têm feito nos últimos 30 anos.”
Por exemplo, é cético quanto ao que significam as novas descobertas do LHC (Large Hádron Collider, ou grande colisor de hádrons) e do Fermilab, dois aceleradores de partículas. Experimentos recentes feitos nos aceleradores apontam para a existência de novas partículas ou forças que até agora não foram vistas.
“Embora essas descobertas sejam apresentadas como sinais de uma nova física, essa afirmação não pode ser justificada no momento”, diz ele, acrescentando que essas descobertas podem ser explicadas com base em princípios já conhecidos.
O que preocupa o físico é o fato de que cada vez que os pesquisadores de física teórica encontram um mistério, eles adicionam um novo ingrediente para resolver o problema.
“Teoria das cordas, teoria M, membranas, dimensões extras, todos os tipos de complicações”, diz ele. “Assim chegamos à invenção do multiverso. O multiverso é o exemplo perfeito de uma teoria que é um desperdício”, pontua.
Parte desordenada
Para Turok, em vez de adicionar ingredientes, a chave para entender os mistérios do universo é olhar para “a surpreendente simplicidade, beleza, elegância e economia” da natureza.
Para o físico, o universo é simples nas menores e maiores escalas. Contudo, no meio do caminho entre elas, onde os seres humanos estão localizados, há complexidade.
“Somos provavelmente a coisa mais complexa do universo e acho inspirador que as pessoas percebam que estamos rodeados pela simplicidade”, afirma Turok.
“Somos complicados e imprevisíveis, mas somos capazes de descobrir a incrível simplicidade e economia do universo.” “Nós somos o instrumento que o universo tem para conhecer a si mesmo”, finaliza. Jornal da Chapada com informações de BBC News Brasil.