A Polícia Federal (PF) identificou que, no mínimo, 1.045 acessos de contas ‘inautênticas’ ligadas à aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido)– derrubadas pelo Facebook há cerca de um ano– foram de órgãos públicos como a Presidência da República, a Câmara dos Deputados, o Senado e o Comando da 1ª Brigada de Artilharia Antiaérea do Exército. Além disso, na análise os investigadores identificaram assinantes de redes privadas das quais partiram 844 acessos, incluindo uma provedora ligada à primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Todos esses dados constam em relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela delegada Denisse Dias Rosas Ribeiro em dezembro. No documento de 154 páginas, a delegada descreve os achados da PF, com base no relatório da Atlantic Council – instituição que realiza análise independente de remoções do Facebook por comportamento inautêntico coordenado – ao tratar de uma das hipóteses criminais sob suspeita no inquérito dos atos antidemocráticos.
A PF identifica o ‘movimento online de pessoas associadas para supostamente promover a difusão de ideias com potencial de causar instabilidade na ordem política e social’, no relatório produzido para o Facebook. Após a plataforma divulgar a derrubada das contas apontadas no documento, os investigadores pediram para acessar os dados.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, deferiu o acesso ao relatório, no qual segundo os investigadores, o Facebook apontou que a derrubada das contas se deu “em consonância com as medidas previstas para a seguinte tipologia estabelecida pela empresa” – “Operações executadas por um governo para atingir seus próprios cidadãos. Isso pode ser particularmente preocupante quando combinam técnicas enganosas com o poder de um Estado”.
Com o documento, a PF buscou “dados externos e independentes’ para checar as informações do relatório e identificou 80.552 acessos das contas apontadas no documento. Os investigadores seguiram a análise e decidiram se debruçar sobre um dos três grupos que atuavam ‘utilizando contas inautênticas e de forma coordenada”, o chamado Grupo Brasília.
“Utilizando o grupo Brasília como referência, limitou-se o escopo da análise a aproximadamente 15.528 vínculos de conta -> endereço IP. Desse universo foram solicitados às operadoras (Claro, Tim, Oi e Vivo) dados cadastrais de 5.120 vínculos de contas com endereço IP, sendo que apenas 844 acessos tiveram seus assinantes identificados (total 31 assinantes), dos quais alguns deles com vínculos com os proprietários das contas inautênticas apontadas pelo Facebook”, descreve o relatório.
A mulher do presidente, Michelle Bolsonaro, é apontada pela PF como assinante da provedora de internet na qual foi acessada a conta ‘Bolsonaro News’ e o perfil de Tercio Arnaud Thomaz, que é assessor do presidente e integra o chamado “gabinete do ódio”, núcleo instalado no terceiro andar do Palácio do Planalto. Também consta na lista um assessor parlamentar lotado no gabinete do senador Flávio Bolsonaro, Fernando Nascimento Pessoa. A partir de sua internet, teriam sido acessadas as contas ‘SnapNaro’, ‘Trump We Trust’, ‘DiDireita’, ‘Tudo é Bolsonaro’, ‘Porque o Bolsonaro?’ e ‘Snapressoras’.
Dentre os 15 mil acessos selecionados para análise, a PF identificou que 1.045 deles partiram de órgãos públicos – o comando da 1ª Brigada de Artilharia Antiaérea, a Presidência da República, a Câmara dos Deputados, o Senado e a Câmara dos Vereadores do Rio. Na internet de todos os órgãos, com exceção da rede do Senado, uma das contas acessadas foi a de Tercio Arnaud Thomaz.
Buscando identificar se mais de uma pessoa utilizava as contas sob suspeita, a PF solicitou dados de usuários à Presidência da República, à Câmara, ao Senado e à Câmara de Vereadores do Rio. Segundo os dados fornecidos pela Câmara, um conta de nome ‘Eduardo Guimarães’ estaria ligada ao usuário de Carlos Eduardo Guimarães, listado como secretário parlamentar do deputado Eduardo Bolsonaro, e também ao usuário do próprio parlamentar.
De acordo com os investigadores, está pendente o envio de dados pelo Senado e pela Presidência com relação aos dados cadastrais dos usuários ligados ao acesso das contas derrubadas pelo Facebook. A Secretaria-Geral da Presidência encaminhou os dados sobre os usuários, mas “devido ao formato do arquivo digital apresentado foi solicitado novo envio”. Já em relação à Câmara Municipal do Rio, a instituição alegou que não possuía arquitetura de registro de logs de acesso à internet e assim não conseguiria fornecer as informações.
Em uma outra fase, a PF ainda analisou o conteúdo de 88 contas identificadas pela Atlantic Council, sendo que a análise preliminar indicou “provável supressão de conteúdo” de diversas páginas. Os investigadores listaram os proprietários das contas e demais dados. A PF indica que apesar da apuração não ter sido concluída, “não há impedimento para o compartilhamento de dados e subsequente avaliação da repercussão desses fatos em outras esferas”. Jornal da Chapada com informações de Folha de São Paulo.