A Fundação Nacional do Índio (Funai) proibiu que uma equipe da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) entrasse na Terra Yanomami para prestar assistência de saúde aos indígenas que sofrem com o surto de malária, desnutrição, falta de medicamentos e abandono do governo. Em entrevista ao Fantástico deste domingo (21) o vice-presidente da Hutukara, principal associação que presenta o povo Yanomami, Dário Kopenawa, criticou a posição da Funai. No último domingo, o programa mostrou, com exclusividade, cenas do colapso na saúde dentro a reserva.
“Por que a Funai não proíbe a entrada dos garimpeiros? Por que está proibindo os médicos na Terra Yanomami para fazer exame? Então, isso é muito revoltante, é muito absurdo”, disse Kopenawa. A equipe, formada por profissionais de diversas áreas, também faria um estudo sobre o impacto do garimpo na reserva, que é maior do país e, nos últimos anos, enfrenta o avanço da mineração ilegal do ouro. A ideia era tender ao menos 1.200 yanomami.
“É, no mínimo, uma tremenda falta de sensibilidade e uma contradição a Funai negar acesso a uma equipe multidisciplinar de saúde formada por oito médicos com diferentes especialidades, enfermeiros, psicólogos, biólogos, geógrafos”, avalia o pesquisador da Fiocruz, Paulo Basta, que integraria o grupo. Basta é médico e especialista em saúde indígena e foi um dos responsáveis pela pesquisa que apontou que oito em cada dez crianças menores de 5 anos têm desnutrição crônica na Terra Yanomami.
A pesquisa, divulgada no ano passado, foi feita nas regiões de Auaris e Maturacá e teve o apoio do Unicef (braço da Organização das Nações Unidas para a infância). A Funai justificou que “pesquisas e ingressos em terras indígenas estão provisoriamente suspensos, devido ao surto da Covid-19”. “O povo Yanomami vive uma crise sanitária, uma crise ambiental, de invasão de seu território, sem precedentes”, resume o pesquisador.
Durante esta semana, após a reportagem do Fantástico, o Ministério Público Federal (MPF) cobrou da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Mistério da Saúde, um plano de reestruturação da assistência básica que possa reverter o atual cenário da saúde Yanomami e auditoria na contas do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y) e da própria Sesai para identificar como o dinheiro está sendo usado.
Esse plano deve prever reforço no quadro de funcionários que atuam dentro da reserva, além de logística aérea adequada para atender as comunidades. Com mais de 370 aldeias e quase 10 milhões de hectares que se estendem por Roraima, fronteira com a Venezuela, e o Amazonas, a Terra Yanomami é a maior do país em extensão territorial. Ao todo, são 28 mil indígenas que vivem isolados geograficamente em comunidades de difícil acesso. Estima-se que há 20 mil garimpeiros ilegais explorando a reserva.
Saúde em colapso
Esta semana a morte de duas crianças que estavam com sintomas de malária evidenciaram ainda mais o colapso na saúde Yanomami. Elas morreram com três dias de diferença e viviam em Xaruna, comunidade onde a equipe do Fantástico encontrou um dos piores cenários, com dezenas de crianças desnutridas (assista no vídeo acima).
Além disso, nesse sábado (20), mesmo dia em que a segunda criança de Xaruna morreu, o Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuanna (Condisi-YY) relatou que havia uma outra menina, de 2 anos, em estado grave aguardando por atendimento em Macuxi Yano. Ela foi uma das crianças que apareceu na reportagem do Fantástico no último domingo (14).
Após a denúncia do Condisi-YY, a menina foi resgatada para o posto de Parima, onde está em observação. O presidente do Conselho, Júnior Hekurari Yanomami, acusa o Dsei-Y de ser negligente no atendimento ao povo Yanomami porque, nesses três últimos casos, faltou combustível para a equipe de saúde ir até a comunidade.
“Isso é muito grave. Meu povo está morrendo, as crianças estão morrendo”, frisa Hekurari.
O Ministério da Saúde, por sua vez, rebateu as declarações e, em nota, disse as “informações de negligência são consideradas infundadas” e que tem adotado todas as mediadas necessárias para atender os indígenas.
Além disso, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na última quarta-feira (17) que o governo federal preste esclarecimentos sobre a situação do povo yanomami. Foi estipulado um prazo de cinco dias para a resposta sobre: situação nutricional, acesso a água potável e serviços de saúde e medicamentos. Com informações do g1.