Capturado por militares da Bolívia, com o apoio de agentes do governo dos Estados Unidos, o argentino Ernesto Guevara, o Che, foi executado no dia 9 de outubro de 1967, aos 39 anos, pelo sargento Mario Terán Salazar. O militar morreu na quinta-feira, 10, aos 80 anos, num hospital da Bolívia.
Gary Prado, o militar que liderou a captura de Che Guevara, contou que seu ex-aluno Mario Terán estava enfermo — com problemas pulmonares — e os médicos nada puderam fazer. “Ele estava internado há vários dias no hospital da Corporação Militar de Santa Cruz”, afirma o jornal argentino “Página 12”.
Prado revela que, “acossado” por ter executado Che Guevaga, Mario Terán “sofreu muito”. Porém, assinala o militar, ele acabou por concluir que havia cumprido uma missão determinada pela Presidência da Bolívia. “Ele apenas cumpriu ordens”, postula Prado.
Matar Che Guevara foi “o pior momento de minha vida. Vi Che grande, muito grande, enorme. Seus olhos brilhavam intensamente”, disse Mario Terán.
Félix Rodríguez, cubano que trabalhava para a CIA, avisou a Che Guevara que o comando militar boliviano havia determinado que ele deveria ser morto. No livro “Che Guevara — Uma Biografia” (Objetiva, 920 páginas, tradução de M. H. C. Côrtes), o jornalista Jon Lee Anderson conta que, ao ser alertado, “o rosto de Che ficou momentaneamente pálido, e ele disse: “É melhor assim. […] Eu nunca deveria ter sido capturado vivo”.
Ao ser perguntado por Rodríguez se queria enviar uma mensagem para a família, Che Guevara teria pedido que “dissesse ‘a Fidel que ele logo verá uma revolução triunfante na América. (…) E diga a minha mulher que se case de novo e tente ser feliz’”.
Terminada a conversa, o tenente-coronel Miguel Ayoroa pediu voluntários. O sargento Mario Terán, “com ar de durão”, se prontificou, de imediato, a cumprir a missão. “Rodríguez olhou para ele e viu que seu rosto estava brilhando como se tivesse estado bebendo. Terán participara do tiroteio com o bando de Che na véspera e estava ansioso por vingar a morte de três de seus companheiros, abatidos naquele combate”, relata Lee Anderson.
“Disse a ele que não alvejasse Che no rosto, e sim do pescoço para baixo”, contou Rodríguez, “para que os ferimentos parecessem ter sido feitos em combate. ‘Caminhei para a colina e comecei a fazer anotações’”.
Lee Anderson sublinha que, “segundo a lenda, as últimas palavras de Che Guevara, quando Terán entrou pela porta, foram: ‘Sei que você veio para me matar. Atire, covarde, você só vai matar um homem”.
“Terán hesitou, depois apontou se fuzil semiautomático e puxou o gatilho, atingindo Che nos braços e nas pernas. Então, enquanto Che se contorcia no chão, aparentemente mordendo um dos pulsos numa tentativa de evitar gritar, Terán disparou outra rajada. A bala fatal penetrou no tórax de Che, enchendo seus pulmões de sangue”, registra Lee Anderson.
“O tenente-coronel Andrés Selich e o major Mario Vargas Salinas posaram para fotografias ao lado do corpo. Selich ficou com a carteira de notas de couro de Che e com um dos vários relógios Rolex que ele estava usando. O mesmo fez o capitão Gary Prado. O carrasco, Mario Terán, ficou com seu cachimbo. O coronel Zenteno Anaya guardou a carabina Garand danificada de Che como troféu pessoal, e permitiu que Prado distribuísse o dinheiro encontrado com ele — vários milhares de dólares norte-americanos e uma grande quantidade de pesos bolivianos — entre seus oficiais subalternos e soldados”, informa Lee Anderson.
No livro, publicado no Brasil em 1997 (saiu nos Estados Unidos no mesmo ano), Lee Anderson escreve sobre o homem que matou Che Guevara: “O carrasco, Mario Terán, é uma figura patética, um homem que continua vivendo às escondidas — às vezes usando perucas e outros disfarces — temendo por sua vida, convencido de que há muito tempo foi marcado para ser assassinado por Cuba ou seus aliados. O Exército deu-lhe uma série de empregos subalternos para que pudesse se sustentar, inclusive de barman no clube dos oficiais do quartel-general da Oitava Divisão de Exército, em Santa Cruz de la Sierra. Terán é um homem profundamente amargurado, considerando-se bode expiatório dos seus oficiais superiores, que escreveram livros e ganharam glórias e títulos por sua participação na morte de Che. Ele se dispõe a falar sobre os acontecimentos que aconteceram em La Higuera em 9 de outubro de 1967, mas só se for pago. Atarracado, roupas amarfanhadas, um rosto marcado por uma cicatriz em curva que passa sobre seu lábio superior, Terán explode de ravia quando lhe perguntam se ele se arrepende do que fez. ‘O que você acha?’, diz ele. ‘Pensa que eu simplesmente entrei naquele quarto e puxei o gatilho? Eu estava embaixo na quebrada, no dia anterior, eu estava lá! Eu vi três dos meus amigos morrerem naquele dia’”. Com informações do jornal Opção.