Uma comitiva do Coletivo de Entidades Negras (CEN), organização da sociedade civil que atua no Brasil e em nível internacional pela efetivação de direitos da população negra, denunciou nesta segunda-feira (14), em Washington DC, riscos democráticos aos quais o Brasil está submetido durante o Governo Bolsonaro.
O grupo, composto pelos ativistas negros Yuri Silva, Marcos Rezende e Letícia Leobet (todos do Coletivo de Entidades Negras) e pela deputada estadual do Rio de Janeiro Renata Souza (PSOL), denunciou o avanço das milícias sobre a política brasileira, relembrou os 4 anos do assassinato da vereadora Marielle Franco por milicianos no Rio de Janeiro e apontou a violência policial contra a população negra nas periferias e favelas como violação de direitos humanos recorrente no país. Foram denunciadas especialmente as chacinas da Gamboa (na Bahia), do Jacarezinho (Rio) e do Salgueiro (Rio).
A denúncia ocorreu em duas agendas promovidas pelo CEN em Washington. Na primeira, no Comitê de Relações Internacionais do Capitólio, o Congresso Nacional Americano, o grupo relatou para a conselheira principal do comitê, Zakiya Carr Johnson, o avanço das milícias e as políticas bolsonaristas para armamento da população civil. Eles apontaram que esses fatos, relacionados com o crescimento de ameaças contra parlamentares negros e mulheres e contra defensores de direitos humanos, colocam em risco o Estado Democrático de Direito no Brasil e as próprias eleições. Foi solicitado que o Congresso Americano se dedicasse a acompanhar de perto o processo eleitoral de outubro, para garantir que a votação ocorra com legalidade, principalmente em áreas conflagradas pela violência policial racial.
Também foi pontuado, no encontro, os ataques promovidos pelo governo a direitos sociais básicos, declarações antidemocráticas do presidente da República em ataque às instituições brasileiras e o risco à vida da população negra, vítima de violência policial racial cotidianamente.
O relato foi registrado pelo Capitólio e se tornará um relatório a ser enviado para os parlamentares norteamericanos tomarem conhecimento sobre o assunto. Outras agências do país, como o Departamento de Estado, também serão avisadas do que foi denunciado. Os Estados Unidos possuem um acordo de cooperação com o Brasil para redução da violência contra a população negra e promoção de intercâmbios que resulte em desenvolvimento social e econômico para esses brasileiros.
A comitiva de ativistas brasileiros também foi recebida na sede da OEA (Organização dos Estados Americanos), onde foram denunciadas a Chacina da Gamboa na Bahia, que matou três jovens negros nas últimas semanas, e a política de segurança pública genocida do Estado da Bahia. Casos como a Chacina do Cabula (também na Bahia), do Jacarezinho e do Salgueiro (ambas no Rio) também foram lembrados na reunião com a relatora para igualdade racial da Comissão Interamericana Americana de Direitos Humanos, Laura Marcela Morelo Castro.
Um documento foi entregue à representante da OEA, que também registrou as denúncias, e reforçou notificações já enviadas ao Estado brasileiro sobre casos de violência racial policial e de racismo religioso. Morelo Castro destacou que outros elementos, como racismo ambiental, a volta do Brasil ao Mala da Fome, a violência política contra mulheres negras e mulheres transexuais negras, além da violência policial, podem configurar um conceito de genocídio defendido pela sociedade civil. No entanto, esse termo não é admitido oficial pelos organismos internacionais. A OEA trabalha com a terminologia de violência policial racial’ para falar sobre a situação brasileira.
O assunto deverá ser tema de uma audiência pública internacional da OEA ainda no primeiro semestre, a pedido da comitiva brasileira. O grupo também solicitou que o bloco diplomático notifique diretamente o Estado da Bahia e outros governadores responsáveis por políticas genocidas de segurança pública que resultam na morte de pessoas negras. A cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no Brasil, de acordo com levantamentos.
Historicamente, os órgãos diplomáticos de Direitos Humanos se dirigem exclusivamente ao Estado nacional, ou seja, ao Estado brasileiro. Seria uma inovação notificar uma administração sub-nacional, mas muito importante para avançar com a pauta, já que no Brasil a política de segurança é responsabilidade dos governos estaduais. A OEA se comprometeu a verificar se cabia em suas atribuições esse tipo de notificação. Com informações de assessoria.