O Ministério da Economia confirmou na terça-feira (13) que governo liberou um novo repasse de R$ 3,5 bilhões do Orçamento para as emendas parlamentares de relator, chamadas de orçamento secreto. O valor consta também da base de dados da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof) da Câmara. A informação foi publicada inicialmente pelo jornal “Folha de S. Paulo”. O desbloqueio desse montante só foi possível graças a duas medidas provisórias assinadas pelo presidente Jair Bolsonaro em agosto e a um decreto editado por ele na semana passada (entenda mais abaixo).
A liberação ocorre a menos de 20 dias das eleições. Com o desbloqueio, o governo pode empenhar os recursos, ou seja, garantir que os valores sejam pagos. O orçamento secreto ganhou esse nome por ter critérios de distribuição menos definidos e execução menos transparente que as demais emendas parlamentares. As emendas, previstas em lei, são parcelas do Orçamento da União que os parlamentares repassam para obras e projetos em estados e municípios. No caso do orçamento secreto, negociações dentro do Congresso definem os deputados e senadores que serão beneficiados.
Medidas provisórias e decretos de Bolsonaro
Em agosto, Bolsonaro editou duas medidas provisórias para facilitar a liberação de repasses do orçamento secreto. A primeira adiou o pagamento de benefícios ao setor cultural, definidos pelas leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2. A segunda limitou gastos com ciência e tecnologia ligados ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). As duas MPs garantiram dinheiro em caixa.
Mesmo assim, pelas regras orçamentárias, o governo só poderia realizar desbloqueio no fim de setembro, quando há a divulgação do próximo relatório bimestral de receitas e despesas — um levantamento detalhado que considera toda a arrecadação e gastos já realizados, e os projeta para o resto do ano. Contudo, o decreto editado por Bolsonaro na semana passada alterou regras de programação orçamentária e permitiu o desbloqueio de verbas a qualquer momento.
Na ocasião, o Ministério da Economia afirmou que a totalidade do valor a ser desbloqueado – cerca de R$ 5,6 bilhões – seria direcionada às emendas parlamentares. Nesta terça-feira, a pasta confirmou que R$ 3,5 bilhões foram desbloqueados na forma de emendas de relator e outros R$ 2,1 bilhões como emendas de bancada. Daniel Couri, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão atrelado ao Senado Federal, avalia que as medidas provisórias e o decreto não ferem a legislação orçamentária, mas alerta para a redução da transparência em relação ao gasto público.
“O ideal é que o governo tivesse sido mais transparente. Nós só teremos o detalhamento das operações que foram feitas no próximo relatório bimestral de receitas e despesas”, diz Couri. A Secretaria-geral da Presidência da República afirmou, à época da edição das MPs, que o adiamento dos recursos para a Cultura tinha o objetivo de “compatibilizar o apoio financeiro da União (a Estados e municípios) com o arcabouço fiscal vigente” e que era necessário respeitar “a disponibilidade orçamentária e financeira da União”.
Oposição aciona STF
As duas manobras são questionadas por partidos da oposição no Supremo Tribunal Federal (STF). Rede, PC do B, PT e PV entraram na última sexta-feira (9) com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) para suspender a medida provisória que limita os recursos do FNDCT. Já o PSOL pediu ao STF que suspenda o decreto que viabilizou a liberação de recursos do orçamento secreto às vésperas das eleições. O partido também pede que a Corte impeça o repasse de verbas nessa modalidade de emenda até o fim das eleições deste ano.
Proximidade das eleições
O especialista em gastos públicos e economista da associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, afirmou que a liberação dos recursos às vésperas das eleições pode favorecer candidatos governistas. “Estamos vendo essa possibilidade de uma enxurrada de recursos serem empenhados e pagos faltando cerca de 15 dias para as eleições. É de fato uma quantidade enorme de vantagens que os candidatos governistas terão, inclusive o próprio presidente da República”, afirmou.
Praticamente metade desses recursos, R$ 1,7 bilhão, será destinada ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) – para, por exemplo, obras em áreas urbanas e projetos de saneamento e abastecimento de água. “O MDR é o paraíso dos políticos, pois o ministério trabalha com uma série de ações, como obras de asfaltamento, compra de equipamentos, tratores, equipamentos agrícolas. São ações que geram votos e os políticos têm um rápido retorno, já que são ações que podem ser executados em um prazo curto”, continuou Castello Branco.
Luciano Caparroz Santos, advogado especializado em direito eleitoral e diretor do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE), vê um precedente perigoso. “Não há dúvidas de que a paridade de armas [entre os candidatos] está se perdendo. A reeleição já gera um desequilíbrio. Só que, nesse ano, essa disparidade está ainda mais elevada por conta das emendas de relator”, afirma. Com informações do g1.