No dia 8 de janeiro de 1988 a Polícia Federal emitiria um laudo que mancharia para sempre a imagem de um capitão do Exército Brasileiro que, àquela altura, já tinha uma reputação bastante avariada. Jair Bolsonaro (PL), hoje presidente da República em seus últimos dias de um mandato caótico, tinha ganhado a atenção da imprensa desde 3 de setembro de 1986, após ter escrito um artigo para a revista Veja no qual fazia críticas violentas à organização militar da qual ele mesmo fazia parte, exigindo aumento salarial aos berros.
Dizendo logo de cara que o “o salário estava baixo” e que “não consegue sonhar com as necessidades mínimas que uma pessoa do meu nível cultural e social poderia almejar”, o insubordinado e indisciplinado capitão, famoso por sua verborragia e descontrole emocional, deixou o Alto-Comando das Forças Armadas furioso.
O artigo, em si, já trouxe uma série de problemas para o capitão Bolsonaro, que por conta dele chegou a ficar preso por 15 dias, ainda em 1986, após uma decisão de uma junta de três coronéis do Exército que consideraram seu ato de indisciplina uma “transgressão grave” e uma atitude que “feriu a ética, gerando clima de inquietação no âmbito da organização militar”.
No ano seguinte, em 1987, a Veja voltou à carga com o capitão e publicou uma reportagem, em 25 de outubro, cujo título era “Pôr bombas nos quartéis, um plano na Esao”, numa referência à Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais, do Exército. O texto dizia que o homem que viria ser presidente da República tinha a intenção de realizar atentados terroristas em unidades militares, junto com um outro oficial, de nome Fábio Passo, com a intenção de pressionar os superiores hierárquicos a atenderem suas demandas salariais. Na matéria, a Veja trazia um relato detalhado, segundo a revista, saído da própria boca de Bolsonaro, de como produzir bombas a partir do uso de TNT. Ele teria, inclusive, mandado um esboço, espécie de croqui, onde o plano era desenhado passo a passo.
A reportagem causou uma revolta generalizada nas Forças Armadas e Bolsonaro e seu parceiro imediatamente entregaram cartas ao Comando do Exército negando tais palavras e tais intenções. Um processo foi aberto e o capitão tresloucado passou a negar veementemente que fosse explodir quartéis.
Por sua vez, a Veja entregou o croqui à perícia da Polícia Federal para que uma análise falasse por si. O resultado? Os peritos grafotécnicos confirmaram que o desenho tinha sido feito pela mão do oficial revoltado com os “baixos” salários. Havia outros pontos ainda na matéria que indignaram os generais da época, como o trecho em que Bolsonaro dizia que “nosso Exército é uma vergonha nacional, e o ministro (do Exército, à época general Leonidas Pires Gonçalves) está se saindo como um segundo Pinochet”.
Por fim, uma nova investigação foi aberta na Justiça Militar, mas Bolsonaro acabou sendo inocentado. Naquele período histórico, durante um frágil início de redemocratização, os principais observadores da caserna afirmavam que tal decisão foi dada para colocar panos quentes num assunto espinhoso e incômodo ao Exército. O que reforçou tal teoria foi o fato do capitão, que à época tinha só 33 anos, ser “excluído do serviço ativo, passando à reserva remunerada”, ou seja, ser aposentado com direito ao salário integral, para que de uma vez por todas deixasse a farde e não trouxesse mais problemas para os militares. Com informações da Revista Fórum.