“A filha era o sonho dela. Ela também queria muito crescer comigo na empresa”, conta Erisvaldo Lopes dos Santos, de 47 anos, companheiro de Rafaela de Jesus Silva, de 28 anos, há sete anos. A mulher foi a sétima paciente e a mais jovem que morreu infectada com coronavírus na Bahia, que já contabiliza oito mortes.
Rafaela era professora, estudante de pedagogia e, além do marido, deixou uma filha recém-nascida. Ela morreu na última quarta-feira (1º), em Itapetinga e foi enterrada na quinta-feira (2), no mesmo município.
O marido dela conta que a esposa era batalhadora e que não desistia facilmente dos sonhos. Rafaela não podia engravidar, mas a impossibilidade não a fez desistir de ser mãe, ela recorreu a uma fertilização em 2019 e ficou grávida do primeiro filho.
Com o nascimento da pequena Alice, no dia 25 de março deste ano, ela imaginou que o destino seria ver a filha crescer, assim como a expansão da carreira de professora e dos negócios que tinha com o marido.
“Quando ela descobriu que não podia engravidar, fomos para outro método. Na fertilização, de primeira, ela ficou grávida. Era o sonho dela”, contou Erisvaldo.
Ainda de acordo com ele, Rafaela estava no último ano do curso de pedagogia, ela era professora e passava a semana na cidade de Itaju do Colônia. Aos finais de semana, ela percorria quase 280 km até o distrito de Trancoso, em Porto Seguro, ao encontro do marido para ajudá-lo na empresa de turismo que Erisvaldo possui.
“A gente ainda não morava a maior parte do tempo aqui em Trancoso, ela se planeja para vir para cá. Ela ensinava lá [Itaju do Colônia] nos dias de semana e nos finais de semana vinha para cá [Trancoso]. Eu também ia para lá. Muito batalhadora, mulher forte. Era uma secretária, organizava tudo e de longe me ajudava também, resolvia muita coisa por telefone”, relembra.
Sem a esposa, Erisvaldo agora planeja a educação da filha e manter os planos que eram do casal. Por enquanto, ele conta com apoio da filha de 28 anos, fruto de outro casamento, apara ajudá-lo no cuidado com a recém-nascida.
“Ficou um pouco difícil, mas tenho que seguir pela minha princesinha. Assim que essa epidemia acabar vou ter que levantar a cabeça e pensar no futuro. Temos uma pousada arrendada, onde eu moro e está fechada. A gente ia construir. Nós já temos uma casa, só faltava o acabamento e a gente estava começando a fazer a piscina. Ia ser uma casa para alugar no verão”, releva.
Sobre como Rafaela foi infectada, Erisvaldo não tem informações, nem as Secretarias de Saúde de Itapetinga, nem da Bahia. Entretanto, Erisvaldo tem uma suspeita e opinou.
“Fizemos o transporte de um casamento aqui em Trancoso, no dia 14 de março. Ela [Rafaela], não estava, mas depois do casamento ela teve contato comigo e com todos os motoristas que fizeram o trabalho e também dirigiu meu carro, o que usei para transportar os convidados. Nesse casamento em Trancoso, tinham convidados que eram amigos em comum do outro casamento [o da irmã de Gabriela Pugliesi, em Itacaré, também no sul da Bahia]. Não sei se foi isso, mas ninguém sabe ao certo e quero ter certeza das autoridades que minha esposa morreu de coronavírus”, ressaltou.
Assim como ainda é forte na memória de Erisvaldo a personalidade, o carinho e a persistência da esposa, ele também relembra como a mulher começou a passar mal antes de ser internada e morrer.
Eles estavam em Itapetinga, já que era desejo de Rafaela que o parto ocorresse no local, pois tinha preferência por um obstetra que havia realizado o parto de uma prima dela. Cerca de seis dias após o parto, ela começou a sentir falta de ar.
“Ficamos em quarentena em Itapetinga, pois estávamos chegando de Trancoso. Depois, saímos no dia do parto, no dia 25, umas 8h. Ela passou por cesária e no dia seguinte estávamos em casa. Alguns dias depois ela começou a falar que estava com problema para respirar. Ela tinha bronquite, já tinha feito tratamento e resolveu problema. No dia 31 ela pediu para ir na UPA’, disse Erisvaldo.
Erisvaldo disse que levou Rafaela na UPA, como solicitado pela esposa, junto com uma prima dela. No local, de imediato ela já foi isolada e depois disso ele não viu mais a esposa. Disse ainda que a mulher chegou na unidade de saúde febril, com 37ºC.
“Na UPA, deixei ela na recepção e voltei para fechar o carro. Quando estava voltando só ouvi uma enfermeira gritando: ‘É suspeita de coronavírus. Isola ela’. De imediato ela tomou um susto, ficou internada, ainda ligou para mim do telefone da prima, depois entubaram ela e me disseram que iria vir uma ambulância de Vitória da Conquista [a 100 km de Itapetinga] para pegar ela, mas ela não resistiu”, relembrou. A matéria foi extraída do G1.