Segundo o Ministério Público da Bahia (MP-BA), cerca de 900 hectares foram desmatados no município de Piatã, região da Chapada Diamantina, para um empreendimento de agronegócio. A licença irregular foi concedida pelo governo da Bahia, por meio do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema).
A promotoria de Justiça do MP-BA informou que já foi solicitado o cancelamento da autorização, mas que ainda não obteve resposta do órgão ambiental. O site G1 entrou em contato com o Inema e com a empresa Hayashi para ter algum posicionamento sobre a questão, e até o momento não teve um retorno.
A denúncia do empreendimento irregular foi feita por moradores e agricultores familiares da região, que fizeram manifestações contra o desmatamento. De acordo com o grupo, a mesma empresa já possui cultivo em outro terreno, nas cidades vizinhas de Mucugê e Cascavel. O medo dos agricultores familiares é que o empreendimento leve a mesma escassez de água e degradação do solo para Piatã.
Um dos integrantes da Agricultura Familiar, que preferiu não se identificar por medo de represálias, contou sobre danos já causados. “O agronegócio produz para exportação, e os prejuízos ambientais ficam para a população local, que sofre com falta de água de qualidade, poluição do solo e doenças causadas pelo uso de agrotóxico”, disse.
O promotor de Justiça Augusto César de Matos, responsável pela atuação do MP-BA no caso, explica que o empreendimento está se instalando em uma área vasta na região das planícies, que é um local importante de agricultura familiar, na Chapada Diamantina.
“Segundo a investigação do Ministério Público, através da Promotoria Regional Ambiental do Alto Paraguaçu, esse primeiro imóvel conseguiu uma licença ilegal. Ela na verdade é uma chancela. É um ato administrativo que o estado da Bahia concede, através do seu órgão ambiental, o Inema, para que o empreendedor possa retirar, suprimir, cortar, toda a cobertura vegetal, ou seja, retirar toda a proteção natural de floresta, para que ele possa ocupar o solo com agricultura”.
O promotor explica ainda que, por essa Autorização para Supressão Vegetal (ASV) ser um ato administrativo, acaba revestida do aspecto de legalidade. No entanto, para que ela seja válida, de fato, ela precisa cumprir requisitos que estão no Código Florestal Brasileiro.
Segundo Augusto César de Matos, a investigação identificou que a ASV se baseou em informações do Cadastro Estadual Florestal de Imóveis Rurais (Cefir) que é auto declaratório, ou seja: em informações passadas pela própria empresa de agronegócio.
“Nós percebemos, ao longo da investigação, a autorização baseou-se em um Cefir irregular. Esse Cefir é um ato auto declaratório, mas ele é chancelado, é confirmado pelo Inema, que é o órgão ambiental do estado, e, na verdade, quando o Ministério Público se debruçou sobre esse documento, percebeu-se inúmeras ilegalidades”.
O Código Florestal Brasileiro define a necessidade de manutenção de 20% de cobertura vegetal em todas as áreas de reserva, o que é chamado de reserva legal. A legislação prevê que esse percentual tem que estar obrigatoriamente preservado, com mata nativa íntegra.
No Cefir apresentado pela empresa, ela descreve um percentual correspondente a 28 hectares de áreas de preservação permanente (APP), de reserva legal, áreas produtivas e as áreas que já foram utilizadas e possíveis de serem utilizadas. No entanto, a extensão total do terreno é muito maior, o que aumenta o percentual de proteção.
“O Cefir considerou uma pequena parcela dos quase 1.300 hectares. Apenas infimamente o percentual de área de APP, quando, na verdade, o terreno apresenta uma larga área. É uma área que vulgarmente se denomina como ‘embrejada’, ou seja, é uma área que retém grande parte da malha hídrica que transpassa a propriedade. Então essa área de preservação permanente corresponderia na propriedade, não só aos 28 hectares dos rios que a cortam, mas necessariamente toda essa área que encontra proteção no código florestal, vulgarmente conhecido como vereda”.
“Então nós pularíamos de 28 hectares a serem preservados para mais de 100 hectares que deveriam estar constando no Cefir, quando não constam, e deveriam estar protegidos. Ou seja, essa área jamais deveria ser tocada. Ela deveria ser preservada, sob o aspecto legal e sob o aspecto ecológico”.
O que chama a atenção para a situação é que o Inema, órgão que tem que conferir os dados da autodeclaração do Cefir antes de emitir a autorização, não fez a checagem e apuração do que foi comunicado, o que torna a concessão irregular.
“A autorização foi pautada em um Cefir absolutamente irregular, totalmente desconectada com a realidade. Inúmeros estudos, através de imagens de satélite, de georreferenciamento, sensoramento remoto, detectou com precisão a extensão dessas áreas de APP, não computadas no Cefir e ilegalmente abatidas, contrariando o Código Florestal. Portanto, a ASV, desde o início, é fulminada de ilegalidades”, explica o promotor.
Além do percentual de reserva legal, o Código Florestal também impossibilita, por meio de lei, o desmatamento de áreas de recarga dos mananciais hídricos da região e com a possibilidade de existência de espécies ameaçadas de extinção, seja de fauna ou de flora.
“Outro aspecto importante é a existência na região de espécies ameaçadas, catalogadas e registradas pelos instrumentos legais de proteção, que necessariamente preveem a necessidade da manutenção do habitat natural dessas espécies na hipótese de pedido de supressão vegetal. A região já diagnosticada e inclusive reconhecida pelo próprio órgão ambiental do estado como abrigadura de cinco espécies nativas, como onça pintada, anta, paca e cachorro do mato”. Jornal da Chapada com informações do G1 Bahia.
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