Os três comandantes das Forças Armadas, do Exército, Marinha e Aeronáutica divulgaram uma carta em conjunto nesta sexta-feira, sobre as manifestações antidemocráticas e golpistas que ocorrem, diante dos quarteis, em várias capitais.
O texto é digno do Sargento Pincel, personagem fictício dos Trapalhões, cujo ator veio a falecer, por infeliz coincidência, dias atrás. Não diz nada. Não quer dizer nada. Não aponta para nada. É uma carta diplomática vazia.
Por outro lado, pensando bem, há nela também um certo grau de astúcia, que é justamente o de, não dizendo nada, cumprir o que talvez seja o seu objetivo: empurrar com a barriga a ridícula “crise”, artificialmente inflada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, com seu silêncio criminoso de mau perdedor, por mais alguns dias ou semanas, até o fim da atual administração e a posse do novo governo.
Há um grau de risco na operação, naturalmente, e tenho minhas dúvidas até que ponto as Forças possam calculá-lo.
O texto alerta para a necessidade de que as “manifestações” se mantenham ordeiras e respeitadoras dos direitos fundamentais, ao condenar “excessos cometidos em manifestações que possam restringir os direitos individuais e coletivos ou colocar em risco a segurança pública”.
Entretanto, não poderia falar o velho apito de cachorro, o que é o tributo para agradar o presidente Jair Bolsonaro e sua matilha de fanáticos e fascistas, ao lembrar que “para o restabelecimento e a manutenção da paz social, cabe às autoridades da República, instituídas pelo Povo, o exercício do poder que “Dele” emana, a imediata atenção a todas as demandas legais e legítimas da população, bem como a estrita observância das atribuições e dos limites de suas competências, nos termos da Constituição Federal e da legislação”.
Não há propriamente erro no texto. Mas nunca vimos as Forças lançar nota similar para defender expressamente manifestações populares em defesa de seus direitos trabalhistas, previdenciários, entre outros. O timing da nota, a deferência para com as manifestações golpistas, esse é o apito.
Por outro lado, a matilha nas ruas já ouviu tanto apito nos últimos meses, ou mesmo anos, que não seria esse que fará a diferença. A essa altura, o ouvido da cachorrada deve ouvir apito mesmo quando ele não existe.
Ademais, à parte esse apito, inserido talvez como uma pequena ferramenta de guerra híbrida para atrair atenção do público-alvo, o documento é muito ruim para os subversivos de terceira idade que acampam e oram diante dos quarteis, porque ele enterra categoricamente qualquer possibilidade das Forças atenderem o que é a sua única demanda: a “intervenção militar”, ou o seu novo apelido esquizofrênico, “intervenção federal”.
A nota pode ser considerada o apito de despedida das Forças aos manifestantes, a maneira mais sofisticada que elas encontraram para explicar o óbvio: elas não irão fazer nada e é hora de todo mundo voltar pra casa.
Próximo aos quarteis, há pessoas morando, e crescem os relatos de irritação com o ruído constante, especialmente com os hinos militares tocando 24 horas por dia, junto com buzinaços, orações em voz alta e gritarias.
Ontem uma forte tempestade varreu e destruiu barracas no acampamento golpista em Brasília. Esperamos que alguns manifestantes tenham, ao menos, interpretado isso como irritação divina contra a violência política que eles vem praticando contra mais de 60 milhões de brasileiros que votaram em Lula.
gravíssimo: dilúvio pic.twitter.com/FBDR4DUDjq
— Jairme (@jairmearrependi) November 10, 2022