Em Lençóis, um dos destinos mais deslumbrantes da Chapada Diamantina, o solo avermelhado e naturalmente pobre em nutrientes passou de obstáculo a oportunidade. Graças a um projeto iniciado em 2014 por pesquisadores da Embrapa Mandioca e Fruticultura, em parceria com a empresa Bioenergia Orgânicos, a terra antes vista como estéril se transformou em ambiente fértil para o cultivo de frutas tropicais, mostrando o potencial da agricultura regenerativa em solos degradados.
A região de Lençóis é marcada por paisagens de serras, vales e cachoeiras, mas seu solo do tipo latossolo distrófico apresenta grandes limitações para a agricultura. Com acidez elevada, baixa fertilidade e altos níveis de alumínio, esse tipo de solo não favorece o desenvolvimento de culturas exigentes, como fruteiras. Para piorar, a degradação causada por atividades humanas vinha comprometendo ainda mais a qualidade da terra.
Foi nesse cenário que a Embrapa, com sede em Cruz das Almas (BA), uniu esforços com a Bioenergia Orgânicos para enfrentar o desafio. O trabalho começou com o diagnóstico físico, químico e biológico do solo. “Mais do que adubar, era preciso entender e recuperar a saúde do solo”, explica Ana Lúcia Borges, pesquisadora da Embrapa e integrante da Comissão de Produção Orgânica da Bahia.

As primeiras ações incluíram a aplicação de calcário e gesso para corrigir a acidez e reduzir a toxidade por alumínio. Em seguida, foram testadas duas formas de preparo do solo: o tradicional arado e a gradagem, que ajudam a revolver e nivelar a terra. Mas o diferencial veio com o uso de plantas de cobertura, fundamentais na regeneração do solo.
Espécies como feijão-de-porco, mucuna-preta, milheto e sorgo foram cultivadas, roçadas e replantadas por várias vezes ao longo de dois anos. O objetivo era enriquecer o solo com matéria orgânica e melhorar sua estrutura. Essa biomassa vegetal, mantida no solo após as roçagens, funcionou como adubo natural de liberação lenta.
O impacto foi surpreendente. Em apenas sete meses, os teores de cálcio e magnésio aumentaram mais de 1.000%, e o potássio subiu 71%. O pH também foi corrigido, aproximando-se do ideal para o cultivo da maioria das culturas. “O solo passou a respirar novamente”, comenta Ana Lúcia.
Com o solo preparado, veio o plantio da banana ‘BRS Princesa’, variedade desenvolvida pela própria Embrapa para cultivo orgânico. A fruta, semelhante à banana-maçã, apresentou excelente adaptação às condições locais, com destaque para a resistência natural a doenças como a sigatoka-negra e a murcha de Fusarium.

O primeiro ciclo de produção superou as expectativas, com plantas vigorosas, cachos pesados e ótima produtividade. No segundo ciclo, os resultados foram ainda mais expressivos. A aplicação de gesso mineral, além da cobertura vegetal, aumentou o número de folhas, a área foliar e o rendimento dos frutos.
Além do impacto direto na produção, a experiência tem gerado conhecimento e inspira outros produtores da região. As práticas adotadas pela empresa estão sendo replicadas em propriedades vizinhas e servem de referência em cursos e palestras sobre manejo sustentável e agricultura orgânica.
Financiado também pela Fapesb, o projeto reforça o papel da pesquisa agroecológica no enfrentamento dos desafios do semiárido baiano. “Essas práticas reduzem os riscos de erosão, poluição e tornam a produção mais resiliente. É um modelo que pode ser replicado em outras regiões com solos semelhantes”, conclui a pesquisadora. Jornal da Chapada com informações do portal Correio.